Mário de Magalhães Papaterra Limongi *
Durante a campanha para o governo do estado de São Paulo, um tema que gerou controvérsia foi a instalação das câmeras nas fardas dos policiais militares.
Seguindo o discurso do que se convencionou chamar de “bolsonarismo raiz”, o então candidato Tarcísio de Freitas prometeu rever a medida com o argumento de que o uso das câmeras inibe o policial.
Durante a campanha, confrontado por seu adversário, o então candidato deu sinais de recuo afirmando que ouviria os interessados para melhor avaliar o programa, que, diga-se, tinha e tem amplo apoio do comando da Polícia Militar. Na ocasião, a mera possibilidade de novo estudo da questão provocou forte reação do setor duro da campanha.
Com a vitória eleitoral e já como governador eleito, Tarcísio de Freitas, ao indicar para o cargo de secretário de Segurança Pública um deputado federal com notórias ligações ao grupo mais próximo de Jair Bolsonaro dá a entender que cumprirá sua promessa inicial de campanha e suprimirá as câmeras das fardas.
Se isto ocorrer será um erro.
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Em primeiro lugar porque o programa é bem-sucedido, como reconhecido por pesquisa encomendada pelo maior interessado: a Polícia Militar.
Matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo em 5 de dezembro de 2022, com o sugestivo título “Câmeras nas fardas de PM de SP fortalecem combate ao crime e desafiam promessa de Tarcísio de rever o programa”, mostra que, ao contrário do alegado, a instalação de câmeras em nada prejudica o cumprimento do dever da polícia militar. Ao contrário. De acordo com a matéria, estudo da Fundação Getúlio Vargas encomendado pela cúpula da polícia mostra uma maior prevenção e repressão aos crimes, em especial, agressões contra mulheres, além de aumento significativo na apreensão de drogas e armas, em unidades que já utilizam o equipamento.
Desnecessário comentar a seriedade e credibilidade da Fundação de Getúlio Vargas, pelo que se pode afirmar que a revisão do programa importa em abandonar medida exitosa.
De outro lado, além de maior eficiência à polícia, a instalação de câmeras atingiu o que parece ser seu principal objetivo pois, de acordo com todas as estatísticas, gerou expressiva diminuição na letalidade policial e, principalmente, na morte de policiais.
Ora, não parece lógico que, para satisfazer um discurso irresponsável, um programa que se revelou correto e atingiu seus objetivos principais- aumento de eficiência com a diminuição de mortes dos próprios policiais- seja simplesmente abandonado, até porque houve investimento de dinheiro público na aquisição das câmeras.
A toda evidência, os que repudiam o uso das câmeras com a alegação que a polícia fica intimidada com o equipamento, acaba por admitir que excessos devem ser mais que tolerados, devem ser incentivados.
Não há como negar que a retirada das câmeras nas fardas, que implicou na diminuição da letalidade, terá uma única leitura: licença para a violência ou, em outras palavras, licença para matar.
Não é difícil supor também que as vítimas potenciais da licença serão os suspeitos de sempre, habitantes das nossas pobres periferias.
Não bastasse a sinalização de tolerância com abordagens arbitrárias e sem o respeito mínimo aos direitos dos cidadãos, a possível medida não traz qualquer benefício na apuração e repressão ao crime.
Em verdade, a medida só trará prejuízo para a atividade policial.
Os nossos tribunais superiores têm sido rigorosos na avaliação da legalidade das diligências policiais e, mais que isso, no valor probante do depoimento de policiais, pelo que proliferam absolvições e/ou anulações de decisões que se baseiam exclusivamente em relatos daqueles que participaram de diligências policiais. Frequentemente os relatos dos policiais não são considerados suficientes para fazer frente às negativas dos acusados.
Não cabe aqui uma análise do acerto ou não de tais decisões, mas o fato é que também aqui a utilização das câmeras impediria a reiterada alegação de flagrante forjado ou perseguição policial.
Uma atuação legítima da polícia, facilmente comprovável com as imagens, jamais poderá ser posta em dúvida, pelo que o incremento do programa e não seu término terá efeito positivo na sempre almejada valorização do trabalho policial.
Por todos os ângulos que a questão é analisada, a medida adotada com sucesso em São Paulo deveria ser vista como paradigma e não criticada por questões ideológicas absolutamente em descompasso com o interesse público.
* Procurador de Justiça e diretor do Movimento do Ministério Público Democrático.
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