Quando Jesse Owens conquistou quatro medalhas de ouro nas Olimpíadas de 1936 em Berlim, demoliu ali nos poucos minutos das suas conquistas o mito da superioridade racial que Adolf Hitler queria conceber com seu nazismo.
Cada vez que tocava na bola, Pelé também demolia esse mito. Absolutamente perfeito em todos os aspectos do jogo. Soberano. Tão soberano que a racista sociedade brasileira curvou-se a ele para chamá-lo de “Rei”. Pelé, aquele negro majestoso, tornou-se sinônimo de perfeição. Quem quer que a almeje no seu ofício será nesse ofício um “Pelé”. Agora, inclusive no dicionário.
Com seus sete títulos de campeão mundial, Lewis Hamilton torna também soberana sua pele negra sobre a pele branca dos outros 19 pilotos no grid. Tão soberano que sua Mercedes-Benz abandonou sua tradicional cor prateada para se tornar preta. Tão soberano que retirou a Fórmula Um de seu egoísmo para se posicionar sobre a diversidade. Graças a Hamilton, aqueles esportistas individualistas agora correm “como um” (“Race as One”). E Hamilton ainda carrega nos seu capacete o arco-íris LGBT a mostrar que a luta pelos direitos das minorias é uma só. Race as One. Hamilton é o Pelé das pistas.
Não é por acaso que Hamilton tenha sido agredido por Nelson Piquet e sua eterna cara azeda, de quem chupou maracujá. Hamilton é tudo o que Piquet jamais conseguirá ser. Piquet odeia seu país porque, apesar de suas conquistas esportivas, prevaleceu sua atitude. Não pode ser amado quem prefere semear o ódio.
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A cada vez que Vinicius Jr. toca a bola nos gramados espanhóis, é novamente o mesmo processo de derrubada do ridículo mito da superioridade racial que é demolido. E novamente contra ele eclode o mesmo ódio. Sem dizer uma palavra, a cada jogada sua Vinicius Jr. subverte uma tentativa de lógica que, por tão absurda, só se sustenta pela força. Só se sustenta pelo ódio. Vini Jr. demole essa lógica. Como antes a demoliram Owens, Pelé, Hamilton. Ou Zumbi dos Palmares. Ou João Cândido. Ou Gilberto Gil. Ou Silvio Almeida.
No fundo, boa parte da nossa história ocidental é forjada pela força. Pela submissão. Pelo subjugo. Pelo ódio. A tentativa da civilização ocidental de parecer ser superior, de parecer mais refinada, mais elegante, mais intelectualizada, é tão ridícula, tão fora de sentido, que somente pela continuação da força é que ela pode acontecer. Quando Vini Jr. demole tudo isso com um drible, é somente o ódio contra ele o que aflora.
PublicidadeCada vez mais craque, cada vez melhor, muito próximo de ser consagrado como o melhor jogador de futebol do mundo, Vini Jr. expõe a mentira ridícula que os espanhóis tentam impor ao resto do mundo. Se a cultura ocidental é em grande parte forjada pela submissão, pelo subjugo, talvez isso não seja tão verdade em outros países quanto na Espanha.
Sua unidade é de tal modo uma farsa que o hino da Espanha não tem letra. Porque nunca se conseguiram palavras que definam uma unidade espanhola. Um país formado por diversos povos que, não fosse pela força, preferiam não ser espanhóis: bascos, catalães…
Um povo que é muito mais árabe do que europeu. Mais de 500 anos de domínio árabe. Algo óbvio na pele mais escura de boa parte da sua população.
Cada vez que as arquibancadas agridem Vini Jr. talvez ecoem ali as vozes de Isabel de Castela e Fernando de Aragão. Impondo à Espanha uma unidade que talvez de fato a Espanha nunca tenha desejado.
Impondo pela força uma superioridade que na verdade é uma farsa. Impondo pela força uma Espanha unida e branca que no fundo não existe. Que nunca existiu. Impondo pela força a farsa de uma cultura ocidental pura e limpa que é uma mentira evidente.
Vini Jr. é Jesse Owens. Vini Jr. é Pelé. É Lewis Hamilton. É Zumbi. João Cândido. Gilberto Gil. Silvio Almeida. É lindamente subversivo. E sua subversão é preciosa.
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