A COP26 vem mostrando que o esforço na agenda de combate dos efeitos negativos das mudanças climáticas deve ser conjunto e envolver governos, organizações não governamentais, população e também as empresas, especialmente quando inseridas em indústrias conhecidas também pelos impactos ambientais. É com bons olhos que vemos na COP26 empresários brasileiros presentes, acompanhando painéis.
O ESG (sigla em inglês para Governança Corporativa Ambiental e Social) entrou na trilha empresarial para valer e a presença da indústria na COP26 é uma demonstração dessa importância. Entretanto, Guilherme Weege, CEO do Grupo Malwee, lá presente, fez um alerta em uma entrevista recente: “Não adianta ser o mais sustentável sozinho. Ir para a Conferência significa melhorar as práticas comerciais com a intenção de compartilhá-las e também ‘fazer um convite para a mudança’.”
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É aí que entra a necessidade do engajamento governamental ainda maior na condução do problema, pois, visto assim isoladamente, a cooperação com e no setor privado para alcançar mudanças ambientais positivas pode entrar em conflito com as leis de defesa da concorrência, o que acontece em ambientes que analisam problemas de forma isoladamente, como é, infelizmente, o caso brasileiro, cujo governo é capaz de emperrar a criação do mercado de carbono.
Recentemente, os Estados Unidos abriram ( e já encerraram) investigações sobre fabricantes de automóveis americanos em relação à adoção voluntária dos padrões ambientais mais rígidos da Califórnia, em um embate direto com a administração Trump.
Acusadas de violações antitruste Ford Motor Company, Volkswagen da América, Honda e BMW organizaram-se para estender a toda sua produção americana os padrões de poluição veicular mais rígidos exigidos pelo estado da Califórnia, que tem sido liderança no combate às mudanças climáticas desde o governo de Arnold Schwarzeneggger. A administração Trump havia determinado a reversão dos padrões nacionais de economia de combustível.
PublicidadeO Departamento de Justiça americano então abriu uma investigação para saber se as quatro montadoras violaram as leis antitruste federais ao trabalharem juntas para chegar a um acordo com a Califórnia, sob o argumento de que o acordo poderia limitar a escolha do consumidor. Isto seria um fato na hipótese de consumidores já preferirem carros que atendessem ao padrão mais elevado… o que não é a realidade (ainda!).
Embora o caso tenha sido finalmente arquivado com a conclusão de que as empresas não violaram nenhuma lei – até porque, em princípio, o acordo acaba por impor custos mais altos aos participantes do que aos fabricantes não participantes, não permitindo que as montadoras participantes cobrem preços de monopólio. O caso nos levanta uma questão importante no papel regulamentador do Estado e o clássico embate entre liberdades individuais, saúde e vida, que, em todas as perspectivas filosóficas, mesmo entre as liberais clássicas, não se sustenta como liberdade de causar danos às demais pessoas e suas próprias liberdades individuais.
Sou profunda defensora de mercados livres e abertos para as mais diversas escolhas e a concorrência é motor de melhoras de produtividade. Entretanto, a política concorrencial deve sempre se pautar por um ambiente que leve em consideração trabalhadores e a consciência coletiva de uma empresa – e de seus consumidores! – em relação aos fatores sociais e ambientais daquilo que produzem e geram – e do que compram. A política antitruste é também, em última instância, uma política de transparência e responsabilidade das empresas para com tudo o que as envolve. Ademais, os casos de acordos com efeitos anticompetitivos costumam ser justamente aqueles feitos para impedir as mudanças e desenvolvimento.
O Brasil ainda não enfrentou questões como essa. Até porque, quando firmados, acordos de cooperação podem – e tem sido – apresentados para aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), como foram os atos de concentração apresentados na época da aprovação da Lei de Resíduos sólidos. Mas a tendência é que faça mais confusão na área do que tem feito. Aqui no país populismo, incompreensão real das liberdades e limites, crise filosófica de um país sem projeto próprio e uma educação cidadã pífia nos faz confundir diuturnamente papel mobilizador do estado como intervenção, empresa como vilã, e imposto como espólio. Neste cenário, nunca conseguimos fazer efetivamente uma política pública que seja transversal e leve em consideração múltiplos aspectos da vida social.
Esperamos que os empresários brasileiros presentes na COP26 possam aprender e ser agentes da mudança climática, mas também sejam conscientes em relação a todos os fatores sociais e dos seus negócios e efetivamente pareiem com o governo brasileiro na busca (e na exigência, pois esse governo precisa de mais cobrança do que de parceria) de um ambiente de negócios efetivamente responsável.
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