Em live realizada pelo Congresso em Foco na segunda-feira (26) sobre o julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pode tornar o ex-presidente Bolsonaro inelegível até 2030, o ex-juiz Márlon Reis afirmou que a inclusão da minuta golpista no processo “é absolutamente irrelevante para o julgamento”. Segundo ele, Bolsonaro cometeu abuso de poder político e abuso dos meios de comunicação — e isso independe do fato de a minuta ser considerada como prova ou não.
A declaração do advogado contraria um dos argumentos da defesa do ex-presidente, que questiona a inclusão da minuta no processo. Para Márlon, isso é secundário; o resultado seria o mesmo sem ela. Assista à live abaixo, na íntegra.
O julgamento desta semana é histórico. É a primeira vez que um candidato derrotado em uma eleição presidencial pode ser declarado inelegível por oito anos.
Leia também
A sessão do TSE será retomada com o voto do relator Benedito Gonçalves nesta terça-feira (27), às 19h, em uma descrição que pode ser bastante extensa. Na opinião de Reis, o julgamento não deve ser concluído já na terça. O advogado aposta que o relator deve votar e depois a sessão será suspensa para que, na quinta-feira (29), os outros ministros anunciem seus votos.
Márlon ainda opina sobre o possível resultado: “Acredito que o tribunal irá declarar a inelegibilidade, com voto contra de [ministro do TSE] Cássio Nunes Marques”. O prognóstico é “por achar que ele [Nunes Marques], nesse tema, por ter votado contra a Lei da Ficha Limpa no passado, fique do lado do ex-presidente”, opinou.
A questão da minuta
Tarcísio Vieira, ex-ministro do TSE e advogado de defesa de Bolsonaro, tem como uma das principais estratégias para manter Bolsonaro elegível a inserção posterior ao prazo de apresentação de provas da minuta do golpe pela acusação, feita pelo advogado eleitoralista Walber Agra. A minuta golpista foi encontrada em um cofre da residência do ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal (DF) Anderson Torres e no celular do ex-ajudante direto de Bolsonaro, Mauro Cid.
“É possível, sim, a juntada de outros elementos após a petição inicial, porque a Justiça Eleitoral tem características específicas. Ainda assim, são elementos que não dizem nada ao centro do debate e o TSE pode ignorá-los”, argumentou Reis.
Segundo Reis, o caso de Bolsonaro é uma “aula de inelegibilidade”. De acordo com o advogado:
- há abuso de poder político. Quando Bolsonaro encontrou-se com embaixadores e colocou o sistema eleitoral em dúvida, “houve um uso de uma reunião que deveria ter um propósito republicano para o interesse pessoal de uma pessoa que postula uma vaga à recondução à presidência da república”. Diz ainda que Bolsonaro sabia que estava em ambiente que atrairia interesse da mídia.
- há abuso dos meios de comunicação porque a reunião foi transmitida pela mídia, inclusive pela TV Brasil, que é do governo federal.
Ficha Limpa
Reis ressalta o fato de que a lei da Ficha Limpa dá o embasamento necessário para inelegibilidade do ex-presidente Bolsonaro, uma vez que, antes da lei, o TSE entendia que só poderia condenar um candidato se houvesse prova de que a irregularidade cometida tivesse alterado os resultados da eleição. Com isso, chapas que não fossem vitoriosas estavam fora do radar da corte eleitoral.
O jurista ainda diz que há uma ironia na situação atual: segundo ele, a Lei da Ficha Limpa chegou a receber apoio de segmentos retrógrados, com os quais ele “nunca dialogaria”. Agora, estes grupos veem a lei ser aplicada ao candidato que apoiaram.
Perfil
Márlon Reis foi juiz auxiliar da Presidência do TSE. Como coordenador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), foi um dos idealizadores e redatores da chamada Lei da Ficha. É doutor em Sociologia Jurídica e Instituições Políticas pela Universidad de Zaragoza, na Espanha. Depois de ter renunciado ao cargo de juiz, atua hoje como advogado.