Seis dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) se posicionaram, nesta sexta-feira (18), em favor da proibição das revistas íntimas em visitantes de unidades prisionais. O processo, iniciado em 2021, é relatado pelo ministro Edson Fachin, que inclusive definiu como inválidas as provas colhidas a partir desse tipo de inspeção. Apesar da maioria consolidada, o julgamento, que tramita no plenário virtual, será concluído em audiência presencial após um destaque do ministro Alexandre de Moraes.
A Defensoria Pública do Rio Grande do Sul apresentou a ação para questionar se provas obtidas na revista íntima possuem ou não validade jurídica, tendo em vista o caráter de submissão do indivíduo a tratamento vexatório e degradante, o que viola a norma constitucional. Nesse tipo de vistoria física, visitantes são obrigados a ficar total ou parcialmente nus, sejam homens ou mulheres, enquanto são inspecionados por agentes. Os responsáveis pela revista podem adotar técnicas invasivas, caso assim decidam, ou mesmo dar ordens para que pulos e agachamentos sejam executados pelos revistados, por exemplo.
O relator reconheceu que práticas vexatórias como as adotadas na revista íntima violam o direito à intimidade. No caso do sistema prisional, argumentou Fachin, essa violação se agrava ao virar uma condição de acesso a outros direitos. “O desnudamento de visitantes e inspeção de suas cavidades corporais, ainda que alegadamente indispensáveis à manutenção da estabilidade no interior dos presídios, subjugam todos aqueles que buscam estabelecer contato com pessoas presas, negando-lhes o respeito a direitos essenciais de forma aleatória”, apontou o ministro.
Em seu voto, Fachin defende a proibição definitiva da revista íntima, mesmo nos casos em que a unidade prisional não disponha de mecanismos ou instrumentos de detecção. Além disso, o ministro condiciona a realização de buscas pessoais, quando são verificados bolsos e mochilas, à utilização prévia de aparelhos como detectores de metal e scanners corporais, devendo haver indício concreto de porte de objeto ilícito.
A posição de Fachin foi acompanhada por Rosa Weber, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes, que proferiu um voto vogal, propondo o estabelecimento de um prazo de 24 meses, após a conclusão do julgamento, para que unidades prisionais se adequem à proibição da revista íntima. Já o ministro Cristiano Zanin acompanhou o relatório com ressalvas, defendendo a autorização da revista busca pessoal nas penitenciárias até que consigam instalar aparelhos de detecção.
Já Alexandre de Moraes abriu divergência.
PublicidadeDe um lado, Moraes avalia que “não há como discordar dos diversos absurdos praticados, os excessos, os abusos em revistas íntimas que acabam tornando, várias, várias e repetidas vezes essa prática uma prática vexatória, uma prática humilhante”. Por outro, considera que inspeções íntimas “não podem ser sempre e automaticamente definidas como vexatórias e degradantes”, até porque a prática é verificada, em maior ou menor grau, em outros países com políticas de defesa de direitos humanos mais ou igualmente intensas em relação às praticadas no Brasil.
O ministro também disse considerar que a decisão do julgamento deve tratar apenas de inspeções íntimas em pessoas em visitação no sistema prisional. Para Moraes, tais revistas não devem se aplicar, por exemplo, àquelas feitas pela Polícia Federal em aeroportos ou em presos após rebeliões, quando se verifica tentativas de esconder objetos cortantes ou celulares.
Por entender que nem toda revista íntima é automaticamente vexatória, Moraes conclui que não é possível tratar toda prova criada nessas inspeções como ilícita. Ele acrescenta que, em alguns casos, scanners corporais e detectores de metal não são suficientes para garantir a segurança das unidades prisionais. Ele relembra episódios em que o PCC utilizou papéis inseridos em absorventes íntimos femininos e mensagens escritas dentro das roupas de visitantes para trocar mensagens entre presos de diferentes unidades.
O voto divergente de Moraes buscou estabelecer a revista íntima como protocolo final da inspeção para visitantes no sistema prisional, realizada apenas se a equipe de segurança considerar necessária após todos os métodos possíveis de averiguação. Mesmo nesse caso, deverá ser feita na presença de um médico, e mesmo assim visitantes poderiam decidir se preferem seguir com a inspeção ou abrir mão daquela visita.
Nunes Marques, André Mendonça e Dias Tóffoli acompanharam o voto de Moraes. Com o pedido de destaque, a discussão deverá ser retomada presencialmente, no plenário do STF, com eventuais mudanças de voto por parte dos ministros. A continuidade do julgamento terá data definida pelo presidente da Corte, Luís Roberto Barroso.
Impasse prisional
O professor de graduação e pós-graduação da Universidade de São Paulo Rubens Beçak, mestre e doutor em Direito Constitucional, ressalta que não é uma decisão fácil para o STF decidir a respeito da manutenção ou proibição da revista íntima. “É importante destacar que a intimidade tem que ser preservada e, muitas vezes, nessas situações de revista em presídios as pessoas passam por algo vexatório. (…) Por outro lado, a segurança fica comprometida se entenderem pelo fim da revista íntima”, explicou. Ele ressalta que a entrada de drogas e celulares por meio de visitantes é uma realidade antiga no sistema prisional brasileiro.
Além disso, equipamentos eletrônicos para inspeção corporal são caros, e teria de haver uma adequação orçamentária para que sejam implementados em todas as unidades prisionais. Tendo em vista o desafio, o jurista avalia que o caminho mais apropriado ao STF caso mantenha a posição pela proibição é, de fato, fazer de forma progressiva, dando tempo ao sistema penal para adquirir a tecnologia necessária para substituir a revista íntima.
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