O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria em duas ações apresentadas pela Aliança Nacional Lgbti+ e outros coletivos associados questionando a validade de leis municipais que proíbem a discussão sobre temas relacionados à linguagem neutra nos sistemas de ensino, bem como a vedação de sua adoção em atos oficiais da administração. Os dois processos contam com oito votos favoráveis à suspensão da eficácia das respectivas leis.
A advogada da Aliança Nacional Lgbti+, Amanda Souto Baliza, conta que os dois processos são parte de um pacote mais amplo de ações levantadas em maio pela instituição, que considera tais leis inconstitucionais não apenas por considerá-las uma violação da liberdade de expressão e de cátedra dos servidores atingidos, mas também por haver um vício de iniciativa, tendo em vista que apenas a União é autorizada a legislar sobre matriz curricular e diretrizes educacionais.
A jurista relata que quase todas as leis municipais aprovadas pelo tema possuem redações parecidas. Em alguns municípios, porém, a abordagem dos legisladores foi especialmente agressiva. “Algumas delas adotam como consequência, por exemplo, a exoneração de servidores que utilizarem a linguagem neutra, bem como proibições às escolas particulares de contratação junto ao poder público”, apontou.
Os processos tramitam sob relatoria de Flávio Dino. Em seu voto nas duas ações com maioria consolidada, o ministro ainda chamou atenção para o fato de a língua ser “viva, sempre aberta a novas possibilidades, em diversos espaços e tempos”, não sendo cabível regulação nem no sentido de imposição e nem no sentido de punição sobre mudanças temporais. “Trata-se de um processo cultural e difuso, decorrente de mudanças sociais que, posteriormente, podem ser incorporadas ao sistema jurídico, observados os procedimentos pertinentes”, observou.
Amanda Baliza esclarece que não há o interesse de impor a adoção de linguagem neutra em qualquer instituição, mas sim de garantir com que a discussão não seja alvo de censura, seja no meio escolar, seja na administração pública. “Se, por exemplo, algum aluno aparecer adotando a linguagem neutra, o professor não pode ser proibido de abordar o tema e explicar aquela questão enquanto fenômeno cultural, gramatical ou social”.
A advogada avalia que as propostas legislativas que tentam proibir discussões sobre a linguagem neutra são fruto direto do interesse pessoal de seus autores. “Isso é muito comum em leis anti-LGBTQIA+. O pânico moral atrai votos, e muitas vezes é utilizado como ferramenta para eleger um inimigo para que alguns políticos consigam construir suas campanhas. O alvo da vez é a população trans”.
PublicidadeAs ações com maioria formada tratam da suspensão de lei nos municípios de Navegantes (SC) e Rondonópolis (MT). Nos dois casos, já existem oito votos favoráveis à suspensão das leis anti-linguagem neutra, restando ainda a posição dos ministros Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Kassio Nunes.
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