O Ministério Público Federal (MPF) em Brasília denunciou o jornalista Glenn Greenwald e mais seis pessoas pelo crime de invasão de celulares de autoridades brasileiras. Entre os demais denunciados estão os hackers que são investigados pela Operação Spoofing por terem cedido ao The Intercept os diálogos realizados entre o ex-juiz Sergio Moro e membros da Operação Lava Jato que deram origem ao escândalo chamado de Vaza Jato.
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A denúncia, que foi assinada nessa segunda-feira (20) pelo procurador da República Wellington Divino de Oliveira, aponta a prática de organização criminosa, lavagem de dinheiro e interceptações telefônicas. E explica que Glenn Greenwald, o fundador do site The Intercept, foi denunciado, mesmo sem ter sido indiciado anteriormente pela Polícia Federal no âmbito da Operação Spoofing, porque teria auxiliado, incentivado e orientado o grupo de hackers durante o período de invasão ao celular de Moro e de outras autoridades brasileiras.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio, saíram em defesa de Glenn Greenwald e do jornalismo. Maia publicou em sua conta do Twitter que a denúncia do MPF contra o jornalista Glenn Greenwald, é um “ataque à liberdade de imprensa”. O ministro, por sua vez, concedeu uma entrevista para a Folha de S. Paulo e disse que a denúncia foi um ato problemático e perigoso por se tratar de situação pode cercear a liberdade de expressão.
Veja como o Ministério Público Federal disse que Glenn Greenwald se envolveu, de forma ilegal, no caso:
Publicidade“Durante a análise de um MacBook apreendido – com autorização da Justiça – na casa de Walter Delgatti, foi encontrado um áudio de um diálogo entre Luiz Molição e Glenn. A conversa foi realizada logo após a divulgação, pela imprensa, da invasão sofrida pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Nesse momento, Molição deixa claro que as invasões e o monitoramento das comunicações telefônicas ainda eram realizadas e pede orientações ao jornalista sobre a possibilidade de ‘baixar’ o conteúdo de contas do Telegram de outras pessoas antes da publicação das matérias pelo site The Intercept. Greenwald, então, indica que o grupo criminoso deve apagar as mensagens que já foram repassadas para o jornalista de forma a não ligá-los ao material ilícito, ‘caracterizando clara conduta de participação auxiliar no delito, buscando subverter a ideia de proteção a fonte jornalística em uma imunidade para orientação de criminosos’.”
Em nota divulgada nesta terça-feira (21), o MPF ainda afirma que não haveria um problema em o jornalista Glenn Greenwald publicar as mensagens obtidas pelos hackers. O problema neste caso, segundo o MPF, foi Glenn ter tentado ajudar os hackers para tentar dificultar as investigações sobre a invasão dos celulares. Veja o que o MPF diz sobre essa questão da liberdade de imprensa:
“Quando um jornalista recebe informações que são produtos de uma atividade ilícita e age para torná-las públicas, sem que tenha participado na obtenção do conteúdo ilegal, cumpre seu dever jornalístico. No entanto, os diálogos demonstraram que Glenn Greenwald foi além ao indicar ações para dificultar as investigações e reduzir a possibilidade de responsabilização penal.”
O documento do MPF também revela o esquema de atuação dos seis hackers que foram denunciados junto com Glenn, de acordo com a apuração do Ministério Público Federal. Entenda o esquema desenhado pelo MPF:
“Walter Delgatti Netto e Thiago Eliezer Martins Santos atuavam como mentores e líderes do grupo. Danilo Cristiano Marques era “testa-de-ferro” de Walter, proporcionando meios materiais para que o líder executasse os crimes. Gustavo Henrique Elias Santos era programador, desenvolveu técnicas que permitiram a invasão do Telegram e perpetrava fraudes bancárias. Suelen Oliveira, esposa de Gustavo, agia como laranja e “recrutava” nomes para participarem das falcatruas. E, por fim, Luiz Molição invadia terminais informáticos, aconselhava Walter sobre condutas que deveriam ser adotadas e foi porta-voz do grupo nas conversas com Greenwald”.
Resposta
O jornalista Glenn Greenwald, fundador do The Intercept, por sua vez, classificou essa denúncia como “uma tentativa óbvia de atacar a imprensa livre em retaliação pelas revelações que relatamos sobre o ministro Moro e o governo Bolsonaro”. Ele enviou uma nota sobre o assunto para a colunista Mônica Bérgamo, da Folha de S.Paulo. Veja a íntegra:
“O governo Bolsonaro e o movimento que o apoia deixaram repetidamente claro que não acreditam em liberdades de imprensa —as ameaças de Bolsonaro à Folha, os ataques aos jornalistas incitando violência, as insinuações de Sergio Moro desde o início da nossas reportagens para nos classificar como ‘aliados dos hackers’ por revelar sua corrupção em vez de ‘jornalistas’.
Há menos de dois meses, a Polícia Federal, examinando todas as mesmas evidências citadas pelo Ministério Público, declarou explicitamente que não apenas nunca cometi nenhum crime, mas também exerci extrema cautela como jornalista, nem cheguei de qualquer participação. Até a Polícia Federal, sob o comando do ministro Moro, disse o que está claro para qualquer pessoa: eu não fiz nada além do meu trabalho como jornalista —eticamente e dentro da lei.
Essa denúncia —levada pelo mesmo procurador que tentou (mas fracassou) processar criminalmente Felipe Santa Cruz por criticar ministro Moro— é uma tentativa óbvia de atacar a imprensa livre em retaliação pelas revelações que relatamos sobre o ministro Moro e o governo Bolsonaro. É também um ataque direito ao STF, que determinou que temos o direito de ter nossa liberdade de imprensa protegida em resposta a outros ataques do ministro Moro, e até mesmo às conclusões da Polícia Federal.
Não seremos intimidados por essas tentativas tirânicas de silenciar jornalistas. Estou trabalhando agora com novos relatórios e continuarei a fazer meu trabalho jornalístico. Muitos brasileiros corajosos sacrificaram sua liberdade e até a sua vida pela democracia brasileira, e sinto a obrigação de continuar esse nobre trabalho.”
Veja a conversa na íntegra
GLENN GREENWALD: Tudo bom?
LUIZ MOLIÇÃO: Então, é… a gente… eu tava discutindo com o grupo, eu queria falar com você um assunto.
GLENN GREENWALD (Gleen): Hã?
MOLIÇÃO: É… como tá agora, tá saindo muita notícia sobre isso, a gente Chegou… nós chegamos à conclusão que eles tão fazendo um jogo pra tentar desmoralizar o que tá acontecendo.
GLENN GREENWALD: Uhum.
MOLIÇÃO: Igual, o que aconteceu com o Danilo Gentilli, é… o MBL, o Holiday, a gente pegou outubro do ano passado. Eles tão começando a falar disso agora.
GLENN GREENWALD: Pegou o quê?
MOLIÇÃO: A gente puxou o Telegram deles ano passado. Eles tão falando disso agora.
GLENN GREENWALD: Ah, sim sim.
MOLIÇÃO: Então, tudo o que eles, que já aconteceu…
GLENN GREENWALD: Ah sim.
MOLIÇÃO: Eles tão puxando pra agora.
GLENN GREENWALD: Eu vi isso que alguém publicou alguma coisa falando que o Holiday e MBL “foi hackeado”.
MOLIÇÃO: Isso. Eles tão usando isso agora. Então, a gente crê que é um jogo que eles tão fazendo.
GLENN GREENWALD: Mas com com… qual motivo?
MOLIÇÃO: Porque é… como agora tá vindo também notícia do…dos ata… dos ataques ao Moro, ao MPF, já, já tão pre… prevendo que vai acontecer alguma coisa.
GLENN GREENWALD: Com certeza, mas eu, isso depende… a a dificuldade é entender o motivo com que eles tão tentando… porque… que que estamos pensando é que quando publicamos, bviamente, todo mundo “vou” utomaticamente pensar que “essa material” é enganação como por exemplo tudo o que aconteceu “no semana” passada com Moro.
MOLIÇÃO: Sim.
GLENN GREENWALD: E nós vamos deixar muito claro que nós recebemos tudo muito antes disso, e não tem nada a ver com isso, entendeu?
MOLIÇÃO: Uhum. Mas o que acontece? O que eles tão falando também é que o celular, ele foi hackeado. Não! O que a gente faz é pegar o Cloud do Telegram. A gente não pegou nada do celular.
GLENN GREENWALD: Entendi. Então, eu sei, eu sei. Mas, é possível que tenha um “outro pessoa” fazendo isso?
MOLIÇÃO: É provável.
GLENN GREENWALD: Isso é uma coin… é é… é uma coin… é uma coincidência que…no tempo que estamos prontos para publicar que isso está acontecendo eram outras pessoas.
MOLIÇÃO: Sim, mas igual a gente falou, nosso perfil não é de é… fazer… chamar atenção.
GLENN GREENWALD: Eu sei, eu sei , eu sei disso. Então, tem duas opções obviamente são: um, tem “outro pessoas” tentando hackear ou hackeando eles, ou o outro é que elas tão mentindo. Mas eu não posso entender o motivo para mentir.
MOLIÇÃO: Uhum.
GLENN GREENWALD: Porque, por exemplo, se eles soubessem que… alguém está preparando de publicar ou que, ou pior ainda, que nós “estamos pronto” para publicar, “eles ia” pra Tribunal, pegam um ordem do Judiciário proibindo qualquer publicação ou reportagens com esse material, mas
ainda ninguém fez isso. Então, isso está me deixando a impressão que eles não sabem quem tem “essa material”.
MOLIÇÃO: Não, saber eles sabem.
GLENN GREENWALD: Porque… oi?
MOLIÇÃO: O Deltan, ele sabe que pegaram. Tanto que ele…
GLENN GREENWALD: Ele sabe que alguém pegou, mas ele não sabe quem tem.
MOLIÇÃO: Sim, isso é certo, eles não sabem quem pegou.
GLENN GREENWALD: Então, então, para mim que não estou entendendo é o motivo, o motivo desse jogo. Para fingir com essa é… ou por que por que eles tão plantando “essas artigos” sobre como Moro e “Dalton” e MBL está sendo hackeado? Eu não entendo o motivo. Entendeu?
MOLIÇÃO: Sim.
GLENN GREENWALD: Mas é uma coincidência grande. Eu… isso é, tem “um chance” muito grande que tem uma conexão com tudo, tudo disso, mas… nós estamos trabalhando muito o mais rápido possível para publicar, ah… três artigos no mesmo tempo que vai ser muito explosivo, e… isso vai acontecer muito logo.
MOLIÇÃO: Sim. A gente também queria saber a sua opinião a respeito de algo. Como, assim que você publicar os artigos, todo mundo vai excluir as conversas, todo mudo vai excluir o Telegram, a gente queria saber se você, o que você recomenda fazer. A gente tem alguns nomes separados, a gente pegar esse final de semana já puxar a conversa de todo mundo ou deixar quieto por um tempo. Porque as… tem tem pessoas que tem um número antigo, ou seja, nem tem mais o número, que dá pra
puxar as conversas que tem.
GLENN GREENWALD: Sim. Olha, nós vamos, por que que vai acontecer? É que com certeza eles vão tentar acusar a gente que nós participamos na, na no hack. Eles vão tentar acusar que “nós formam” parte dessa ah… tentativa de hackear. Eles vão com certeza acusar. Então para mim, mantendo as conversas, são as provas que você só falou com a gente depois você tinha tudo. Isso é muito importante para nós como jornalistas para mostrar que nossa fonte só falou com a gente depois que ele já tinha tudo.
MOLIÇÃO: Sim
GLENN GREENWALD: Mas nós não vamos oferecer disso, nós não vamos baixar isso para esse encontro, mas nós precisamos manter isso. Mas você está perguntando se você deve fazer?
MOLIÇÃO: Não, é que a gente não quer chegar a prejudicá-lo de alguma forma. Mas a gente pede a sua opinião.
GLENN GREENWALD: Sobre mais exatamente o quê?
MOLIÇÃO: Sobre puxar todas essas pessoas nesse final de semana, pra já manter as conversas salvas que a gente tiver, ou… esperar. Porque há chances de assim que você liberar a notícia, todo mundo, todos eles que tem as conversas antigas que possam ter alguma coisa, eles vão apagar.
GLENN GREENWALD: Entendi. Então, nós temo… é… vou explicar, como jornalistas, e obviamente eu preciso tomar cuidado como com tudo o que estou falando sobre “essa assunto”, como jornalistas, nós temos uma obrigação ética para “co-dizer” nossa fonte.
MOLIÇÃO: Sim.
GLENN GREENWALD: Isso é nossa obrigação. Então, nós não podemos fazer nada que pode criar um risco que eles podem descobrir “o identidade” de nossa fonte. Então, para gente, nós vamos… como eu disse não podemos apagar todas as conversas porque precisamos manter, mas vamos ter uma cópia num lugar muito seguro… se precisarmos. Pra vocês, nós já salvamos todos, nós já recebemos todos. Eu acho que não tem nenhum propósito, nenhum motivo para vocês manter nada, entendeu?
MOLIÇÃO: Sim.
GLENN GREENWALD: Nenhum… Mas isso é sua, sua escolha, mas estou falando e, isso não vai prejudicar nada que estamos fazendo, se você apaga.
MOLIÇÃO: Sim. Não, era mais, era mais uma opinião que a gente queria mesmo, pra gente fazer mais pra… mais pra frente te dar conselho, mas eu eu eu eu tenho a obrigação para proteger meu fonte e essa obrigação é uma obrigação pra mim que é muito séria, muito grave, e nós vamos fazer tudo para fazer isso, entendeu?
MOLIÇÃO: Sim. É que conforme o… é… se a gente puxar essas conversas, corre o risco de acabar saindo mais notícia. Então isso pode de alguma forma é… prejudicar, então isso que é a nossa preocupação.
GLENN GREENWALD: Entendi, entendi. Ah… sim, sim. A nossa nossa, quando publicamos, única coisa que nós vamos falar é que nossa parte disse que ele está dando esses documentos porque ele descobriu “muito corrupção”, “muitos mentiras”, “muitos coisas” que ele acreditou, o público tem direito para saber, que ele disse que ele não tem a… ele não está apoiando uma ideologia, nem um partido, que qualquer corrupção, esses documentos mostram que ele quer que “nós reportar”, reportarmos, e que nós vamos reportar. E é só para fortalecer a democracia e limpar a corrupção né? É só isso que estamos falando. E também nós vamos falar que nós recebemos todos os documentos muito antes “dessas artigos” da outra semana sobre Moro, sobre outra coisa sobre hackeados.
MOLIÇÃO: Sim. Não, perfeito.
GLENN GREENWALD: Só isso.
MOLIÇÃO: Perfeito.
GLENN GREENWALD: É só isso que vamos falar.
MOLIÇÃO: Certinho, perfeito
GLENN GREENWALD: Tá bom?
MOLIÇÃO: Sim, era só isso que a gente tinha pra discutir.
GLENN GREENWALD: Oi?
MOLIÇÃO: Era só isso que a gente tinha pra discutir com você.
GLENN GREENWALD: Ah, tá bom, tá bom.
MOLIÇÃO: Certo? Obrigado.
GLENN GREENWALD: Tá bom, obrigado você. Qualquer, qualquer dúvidas me liga tá?
MOLIÇÃO: Sim.
GLENN GREENWALD: Tá bom, tchau, tchau.
MOLIÇÃO: Tchau
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