O presidente Lula (PT) viajaria neste domingo (26) para a China pela primeira vez em seu terceiro mandato. Inicialmente prevista para ocorrer entre os dias 26 e 30 de janeiro, a viagem precisou ser cancelada por ordens médicas e segue sem data definida. A ida já havia sido adiada após o presidente contrair uma pneumonia leve, e agora os médicos aguardam o fim do ciclo de transmissão viral para autorizar o presidente a viajar. Não há, contudo, prazo para a viagem ocorrer.
Enquanto Lula se recupera, a China precisa aguardar para uma agenda cheia de encontros e compromissos. Na mesa de negociações dos encontros agora adiados estão a busca para retomar as relações com o gigante asiático, abaladas durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), e a construção de acordos com o parceiro econômico mais importante do Brasil.
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O petista já foi ao país asiático em duas ocasiões durante seu primeiro governo, em 2004 e 2010. Lula também será o primeiro chefe de Estado a visitar a China após o presidente Xi Jinping ser reeleito para seu terceiro mandato, no dia 10 de março.
Lula se encontraria com o presidente chinês na terça-feira (28), na cidade de Pequim. Também estavam previstos encontros com o Primeiro-Ministro da China, Li Qiang, e com o Presidente da Assembleia Popular Nacional, Zhao Leji. Segundo o Palácio do Planalto, as reuniões tratariam de comércio, investimentos, reindustrialização, transição energética, mudanças climáticas, acordos de cooperação e paz. No dia 29, a comitiva participaria de um evento empresarial promovido pela Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível e pelo Ministério de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, com a participação de mais de 240 empresários brasileiros.
Em uma das primeiras sinalizações para a relação entre os dois países, a China anunciou na quarta-feira (23) que reabriu o seu mercado para a carne bovina brasileira. O país asiático havia suspendido as transações após a ocorrência de um caso isolado da forma atípica de Encefalopatia Espongiforme Bovina (EEB) — popularmente conhecido como Doença da Vaca Louca — no Brasil. Investigações apontaram que a ocorrência foi natural e que não representava risco à saúde pública.
A China é um dos principais parceiros do agronegócio brasileiro. Segundo o Ministério da Agricultura, em 2022, o Brasil exportou mais de 1,1 milhão de toneladas de carne bovina para o país asiático, somando cerca de US$ 7,5 bilhões. A importância do setor se mostra na comitiva que acompanhará o presidente: mais de 100 empresários do agronegócio estarão na comitiva de Lula.
PublicidadeNo ano passado, a China importou mais de US$ 89,7 bilhões em produtos brasileiros, especialmente soja e minérios, e exportou quase US$ 60,7 bilhões para o mercado nacional. Desde 2009 o gigante asiático é o principal parceiro comercial do Brasil.
No entanto, a importância comercial da China não impediu o ex-presidente Bolsonaro, seus filhos e seus ministros de governo de causarem ruídos nas relações entre os dois países, especialmente após a pandemia da covid-19.
Em março de 2020, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do presidente, publicou no Twitter uma analogia entre a disseminação do coronavírus e o vazamento da usina nuclear soviética de Chernobyl nos anos 80. O deputado afirmou que o governo chinês preferiu “esconder algo grave” a se expor “tendo um desgaste que salvaria inúmeras vidas”.
A fala provocou reações duras da Embaixada da China no Brasil e do embaixador Yang Wanming. Os presidente da Câmara dos deputados, Rodrigo Maia, e do Senado Federal, Davi Alcolumbre (União-AP), pediram desculpas ao presidente da China em nome do Brasil pelas falas do filho do presidente.
Enquanto os representantes do Legislativo tentaram apagar o incêndio, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, tratou de jogar lenha na fogueira. Segundo Ernesto, a China que deveria pedir desculpas ao Brasil pelo embaixador chinês ter feito uma “postagem ofensiva ao Chefe de Estado do Brasil e aos seus eleitores”.
O tom foi seguido por Jair Bolsonaro. Questionado por uma repórter se iria pedir desculpas ao governo chinês pelas falas do próprio filho, o ex-presidente ironizou a situação. “Eu cometi algum crime? fiz alguma acusação? Me responda se eu fiz uma acusação. Por que você não pede desculpa, então?”, declarou.
Além de reparar os estragos institucionais promovidos por seu antecessor, Lula deverá conduzir o país para assumir um papel mais relevante no Brics, grupo que também engloba Rússia, Índia e África do Sul. Nessa sexta-feira (24), a ex-presidente Dilma Rousseff foi oficializada como presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), instituição financeira do bloco.
Dilma assumirá o cargo que pertencia a Marcos Troyjo, indicado por Bolsonaro. Com mandato até 2025, a indicação da ex-presidente ao banco é uma sinalização da importância do Brics para os planos brasileiros. Na agenda de Lula, estava previsto que o presidente faria uma visita à sede do banco, localizada em Xangai, no dia 30.
Segundo o Palácio do Planalto, ao menos 20 acordos bilaterais deverão ser assinados durante a viagem. Um dos termos previstos é para a construção do CBERS-6, o sexto de uma linha de satélites construídos em parceria entre Brasil e China. O equipamento permitirá o monitoramento de biomas como a Floresta Amazônica e será utilizado no combate ao desmatamento.
Lula também desembarca na China com possíveis anúncios sobre a instalação da gigante chinesa BYD na antiga fábrica da Ford em Camaçari (BA). Como mostrado pelo Congresso em Foco, a fabricante de veículos híbridos e elétricos planeja utilizar a estrutura disponível para investir no território nacional e negocia até incentivos fiscais nos bastidores da reforma tributária.
Com tanta coisa em jogo, o presidente fez questão de comunicar às autoridades chinesas que a viagem ainda está de pé. Segundo a assessoria de Lula, o adiamento foi informado com a “reiteração do desejo de marcar a visita em nova data”.