No pronunciamento que fez na sexta-feira (24) para anunciar sua saída do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro afirmou ter feito uma única exigência a Jair Bolsonaro para embarcar no governo: o pagamento de uma pensão a sua família caso ele morresse em decorrência do trabalho de combate ao crime organizado.
Moro não deu detalhes do acordo nem apresentou argumentos que justificassem a exigência. Entretanto, desconsiderando o mérito da contrapartida, só há um caminho legal viável para a concessão da pensão especial: a aprovação de um projeto de lei específico no Congresso Nacional, por iniciativa do Executivo ou de parlamentares. Sem uma lei mais abrangente que discipline o pagamento dessas pensões, os casos têm sido resolvidos individualmente pelo Legislativo.
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Esse cenário tem feito com que a concessão desse benefício seja autorizada ou indeferida em razão de fatores que geralmente influenciam no processo legislativo, como habilidade política de quem propõe o projeto e o nível e direção do engajamento da opinião pública.
Concedidas de modo fragmentado e sem regulamentação específica que dê uniformidade aos critérios, essas pensões oneram a Seguridade Social de modo pouco previsível. O valor também não está estabelecido em nenhuma legislação, mas um referencial comum é o teto do INSS, atualmente em pouco mais de R$ 6 mil.
PublicidadeEm um estudo publicado em 2006 (leia a íntegra aqui), a consultoria legislativa da Câmara dos Deputados alertou para a necessidade de haver critérios gerais para o benefício para prevenir abusos e favoritismos.
Na visão da consultora legislativa Verônica Rocha, autora do estudo, as pensões deveriam ter critério indenizatório e sua motivação deveria se ater aos casos de substituição do rendimento do cidadão vítima de morte ou danos que afetam sua capacidade laboral decorrentes de situações que tenham acontecido em dependências da União ou que tenham sido causados por atentado político ou agentes públicos.
Casos recentes
Propostas de concessão de pensões especiais não são algo incomum no Congresso. Na semana passada, por exemplo, a líder do Psol, Fernanda Melchionna, propôs o pagamento de um auxílio especial de um salário mínimo mensal para os dependentes econômicos dos trabalhadores que venham a falecer em decorrência da exposição ao coronavírus no exercício de suas funções profissionais.
Em 2017, o senador Romário (Podemos-RJ) propôs o benefício a familiares de jogadores da Chapecoense mortos no acidente aéreo em que morreu a maior parte do time, além de outros profissionais que estavam na mesma aeronave. A proposta está sob relatoria de Tasso Jereissati (PSDB-CE) na Comissão de Constituição e Justiça.
Em 2014, quem recebeu direito à pensão vitalícia foi a ex-ginasta Laís Souza, que ficou tetraplégica em um acidente de esqui enquanto se preparava para representar o Brasil nas Olimpíadas de Inverno. O valor estipulado na época foi R$ R$ 4,3 mil mensais.
Chico Xavier e descendentes de Tirantes
Nos anos 1990, as pensões especiais foram concedidas a algumas personalidades e seus dependentes. Em 1992, Chico Xavier passou a receber o benefício, por iniciativa do senador Humberto Lucena. Entre os argumentos, o fato de Chico Xavier ser “consagrado em nosso País como um cidadão de excepcional bondade e de altos méritos pelas obras humanas e sociais que implantou e continua implantando por todo o território nacional”.
Em 1996 a Câmara aprovou um projeto encaminhado em 1993 pelo então presidente Itamar Franco, que concedia pensão especial a Lúcia de Oliveira Menezes, tetraneta de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Lúcia foi a última descendente de Tiradentes a receber o benefício, fixado em duas vezes o salário mínimo, mas não foi a primeira. Segundo reportagem de Bernardo Mello Franco publicada na Folha de S. Paulo em 2011, desde 1969, sete descendentes do herói nacional receberam o benefício.
Além dos nomes famosos, há outros beneficiários das pensões especiais cujas justificativas para o pagamento estão mais alinhadas ao que indica a consultoria legislativa da Câmara. Nesse rol estão descendentes de pessoas mortas em dependências da União, em acidentes causados por agentes públicos ou em atentados políticos durante a ditadura militar.
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