O Paraguai recebeu grau de investimento da agência de classificação de risco Moody’s. Ganhou um atestado de bom pagador. Em 2008, a Standard & Poors deu esse selo ao Brasil, mas retirou-o em 2015, na crise econômica do governo Dilma. O Brasil não vive uma crise como aquela, mas no setor financeiro persistem dúvidas sobre a capacidade do país de equilibrar as contas e conter o crescimento da dívida pública. Essa incerteza levou o Banco Central a manter, por unanimidade, a taxa Selic em 10,5% ao ano.
Analistas agora se dividem em relação à possibilidade de um aumento em breve, diante do tom desconfiado das manifestações da autoridade monetária. Vai depender do cenário externo e, principalmente, do comportamento das finanças do setor público. Às vésperas da decisão sobre os juros, o governo anunciou um bloqueio de R$ 11,2 bilhões e o contingenciamento de R$ 3,8 bilhões no Orçamento deste ano, para cumprir as regras fiscais. Vinte ministérios foram afetados, sobretudo a Saúde. Tudo indica que será preciso mais para mudar o rumo da taxa básica de juros.
“O BC reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”, diz o texto do Comitê de Política Monetária do BC (Copom).
No domingo, o presidente Lula, em pronunciamento na TV, afirmou que não abrirá mão da responsabilidade fiscal. Tem feito o mesmo discurso desde a campanha eleitoral, mas, vez ou outra, o entremeia com declarações no sentido contrário, condenando medidas de austeridade e corte de gastos. Esse vaivém, que o obriga de tempos em tempos a reafirmar o óbvio, deixa o mercado desconfiado — e o BC também.
O governo tem boas notícias, como a taxa de desemprego, que caiu a 6,9% no trimestre encerrado em junho. É o menor índice em dez anos. Para o BC, porém, pode ser sinal de alta no consumo.
O ministro Fernando Haddad atribui o desequilíbrio que levou aos cortes a dois projetos do Congresso: a desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia e para pequenos municípios, e o Perse, o programa de incentivos ao setor de eventos. O Supremo deu novo prazo para governo e Congresso chegarem a um acordo sobre como compensar o gasto tributário com a desoneração. Dessa solução, que está em análise no Senado e entre técnicos da Fazenda, depende toda a proposta orçamentária para 2025, que precisa chegar ao Congresso até 31 de agosto.
PublicidadeO Orçamento de 2025 tem um condimento político peculiar para o governo. O ano é pré-eleitoral, quando projetos e programas precisam ganhar impulso para que possam ser apresentados como trunfos nos palanques. Cortar gastos é colocar em risco as promessas de 2026.
A Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado, vê dificuldades para o governo cumprir a meta fiscal deste ano. Alcançar o déficit zero custaria, segundo a IFI, “um enorme esforço de ajuste nas contas públicas federais”, calculado pela instituição em 1,3 ponto percentual do PIB. Com a exceção de 2022, o governo tem registrado déficits primários desde 2014.
Esse esforço esbarra na realidade. Segundo a IFI, as despesas primárias cresceram 10,9% no primeiro semestre, enquanto as receitas subiram apenas 6% (descontados ganhos de eventos não recorrentes). O problema é que não é fácil cortar despesas no Brasil: 96% do Orçamento é consumido em gastos obrigatórios. Do que sobra, as despesas discricionárias, mais de um terço está sob controle direto do Congresso. É preciso garantir um mínimo que impeça a paralisia da máquina pública.
Isso significa que não basta cortar. Especialistas de diferentes correntes têm dito que é preciso mudar a estrutura do gasto público, revendo os gastos obrigatórios, inclusive aqueles relacionados à saúde e à educação. Os efeitos do reajuste do salário mínimo sobre a Previdência também são questionados.
Alterar esse modelo exigiria decisão política e apoio parlamentar que hoje não estão em discussão. Esses temas são tratados como tabus pelos partidos de esquerda, mas as pressões para levá-los à mesa de negociação é crescente — inclusive em setores do governo. As alternativas são inúmeras, mas manter tudo como está pode deixar a conta da eleição de 2026 muito alta para Lula. O ministro Fernando Haddad sabe disso. Falta convencer o chefe.
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