O governo eleito definiu apenas seis ministros, faltando menos de um mês para a posse. Em meio à discussão de nomes para pastas e secretarias, alguns liberais foram sendo circulados na imprensa: Persio Arida, Henrique Meirelles, Bernard Appy, Ana Carla Abrão, para citar alguns exemplos. Entretanto, a mera ventilação desses nomes técnicos, enquanto causa alívio em uns, causa estranheza em muitos outros. Afinal, os liberais deveriam contribuir com governos de esquerda?
Esse questionamento é prevalente em pessoas que passaram a acompanhar a política brasileira com mais atenção, a partir do impeachment de Dilma Rousseff.
De lá para cá, surgiu uma narrativa de que apenas com a supervisão de Paulo Guedes, durante o governo Bolsonaro, houve algum espaço para liberais conseguirem contribuir com políticas públicas. Contudo, essa narrativa não se sustenta quando confrontada com a realidade.
A verdade é que liberais participaram de todos os governos brasileiros, desde a redemocratização, ainda que com diferentes graus de influência. Se listasse todos os nomes aqui, acabaria ocupando todo o espaço do artigo. Como ilustração, farei apenas algumas menções de nomes que já compuseram o primeiro escalão de governos. Marco Maciel e Joaquim Francisco integraram o governo Sarney; o governo Collor contou com João Mellão, Marcílio Marques Moreira e Celso Lafer; no governo Itamar, quando começou a ser implementado o Plano Real, Pedro Malan, Rubens Ricupero e Edmar Bacha estavam presentes; nos governos FHC, houve continuidade de reformas com Persio Arida, Gustavo Franco e Armínio Fraga; já nos mandatos de Lula, houve participação de Henrique Meirelles, Luiz Fernando Furlan e Ricardo Paes de Barros; mesmo o governo Dilma, ainda que em proporção menor, houve a participação de liberais como Joaquim Levy e Guilherme Afif. Por fim, Henrique Meirelles, Mansueto Almeida, Ilan Goldfajn e Marcelo Calero integraram o governo de Temer.
Ou seja, dada a elevada capacidade técnica de diversos liberais brasileiros, não deveria surpreender que sejam considerados ou mesmo convidados para integrar cargos no futuro governo Lula – como em qualquer outro governo que vier a assumir no futuro. Quanto às chances de terem mais ou menos espaço para influenciar a tomada de decisão nas pastas que integrarem, essa acaba sendo uma complexa avaliação de cenário político, a ser feita por eles próprios.
Falta aos liberais brasileiros consciência do próprio tamanho. Infelizmente, não somos maioria como tendência de pensamento em nenhuma grande democracia. Ao mesmo tempo, porém, mesmo na condição de minoria política, partidos e técnicos liberais conseguem compor governos, em diversos países. E, muitas vezes, as ideias liberais podem ser implementadas mesmo sem contar com o apoio engajado da maioria da sociedade. Felizmente, o Brasil também tem produzido alguns exemplos desse fenômeno. Não há dúvidas, contudo, que o grau de impacto que pode ser causado pelos técnicos depende sobretudo do grau de apoio dos políticos às suas propostas.
Por isso, para crescer em influência e capacidade de avançar com reformas estruturais, o que liberais precisam é fortalecer os próprios grupos políticos e candidaturas. Quem sabe possamos, um dia, ter um governo não apenas com contribuições liberais minoritárias em composição com outros campos políticos, mas que seja efetiva e majoritariamente liderado por princípios e políticos liberais.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
Deixe um comentário