O vice-presidente Hamilton Mourão e outros militares do Exército estão no centro de uma investigação do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a lisura de um contrato de compra, em outubro de 2010, de um sistema de simulação de artilharia. Mourão era gerente do contrato. A área técnica do tribunal pretende concluir a instrução da auditoria já em setembro. As informações são do Valor Econômico.
De acordo com a reportagem, a conclusão das apurações depende do envio de informações complementares pelo Exército, que já pediu cinco prorrogações de prazo para mandar a documentação restante. As punições previstas vão de multa à inelegibilidade para o exercício de cargos públicos. A análise técnica dos auditores serve para instrução dos ministros, que podem ou não acolher as indicações em seus relatórios.
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Conforme a apuração do repórter Murillo Camarotto, uma denúncia feita de forma anônima em 2017 aponta para uma licitação direcionada à empresa espanhola Tecnobit. Batizado de Simaf (Sistema de Simulação de Apoio de Fogo), o sistema custou 13,98 milhões de euros ao Exército. Com atraso, os simuladores contratados foram instalados em 2016 em Resende (RJ) e Santa Maria (RS).
O nome de Mourão aparece pela primeira vez em documentos que pedem a prorrogação do prazo do contrato, cuja execução estava atrasada. O atual vice-presidente assina um documento que solicita a prorrogação em agosto de 2013, quando ele era vice-chefe do Departamento de Educação e Cultura do Exército, informa o Valor. Procurado pela reportagem, Mourão não se manifestou sobre o assunto.
Segundo o TCU, naquele ano Mourão viajou a Madri para realizar inspeção do projeto. Em outro documento, ele justifica a necessidade de prorrogação ao mencionar a “complexidade e grandiosidade” do objeto contratado, que demanda ajustes em relação ao que foi apresentado inicialmente.
Depois de analisar a documentação entregue pelo Exército, o TCU identificou uma série de lacunas que reforçam os indícios de irregularidades no contrato. Em maio deste ano, o tribunal encaminhou um novo lote de questionamentos à instituição.
Publicidade“Verificou-se, ao analisar a documentação, que não constam entre os documentos recebidos por esta Corte de Contas, estudos que tenham sido realizados com o intuito de avaliar simuladores de artilharia produzidos por outras empresas, que não a Tecnobit, ou utilizados por outras Forças Armadas, que não as espanholas”, aponta o tribunal.
O TCU questiona as contrapartidas exigidas da empresa contratada. Uma planilha apresentada pelo Exército fala em compensações da ordem de R$ 10,97 milhões de euros, mas o tribunal quer saber quem acompanhou a execução do acordo e como essa checagem foi feita.
O Exército informou que a empresa espanhola compensou 3,9 milhões de euros com a constituição de uma filial no Brasil; 2,3 milhões de euros com um laboratório de simulação; e 4,3 milhões de euros com aquisições de materiais e serviços no Brasil. O restante das compensações registradas deve-se à oferta de cursos na Espanha e no Brasil.
Para os auditores do TCU, a execução do contrato não foi devidamente documentada em processo administrativo específico, “tendo as informações solicitadas sido enviadas sem qualquer numeração de páginas ou referência que demonstre a forma como foram arquivados os documentos”.
O tribunal sustenta que há jurisprudência interna sobre a necessidade de adoção de critérios mínimos de formalização. O acompanhamento e controle dos contratos administrativos devem se dar por meio de processos organizados, inclusive com o rol de documentos necessários à verificação prévia aos pagamentos, bem como devem ser segregados os papéis e responsabilidades dos envolvidos.
Segundo o Valor, os auditores questionam ainda a ausência de uma série de documentos citados como “básicos para a elaboração de um projeto”, como estudos de viabilidade, cronograma de atividades, plano de gerenciamento de riscos e planos orçamentários.
A documentação reunida pelo TCU indica que, em 2016, a Academia Militar das Agulhas Negras, onde um dos simuladores foi instalado, determinou a realização de uma sindicância para apurar um débito de aproximadamente R$ 1,27 milhão em desfavor do Exército. Uma perícia, prevista para ser concluída em junho do ano passado, foi iniciada para levantar eventuais danos ao erário, mas os resultados do trabalho também não foram encaminhados ao tribunal de contas.
De acordo com o Valor, a assessoria de imprensa do Exército alegou não haver tempo hábil para responder aos questionamentos da reportagem.
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