A indicação do líder do PP, deputado Arthur Lira (AL), para o comando do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), dividiu a bancada no Congresso. O recém-nomeado presidente do órgão, Fernando Marcondes de Araújo Leão, foi apontado como uma escolha do partido.
Deputados do PP ouvidos pelo Congresso em Foco reclamam, no entanto, que desconhecem o indicado, que não foram consultados e que só veem interesse no Dnocs para parlamentares do Nordeste, como Lira e o presidente da sigla, o senador Ciro Nogueira (PI).
As principais informações deste texto foram enviadas antes para os assinantes dos serviços premium do Congresso em Foco. Cadastre-se e faça um test drive.
Procurado pelo site, Lira não quis comentar a indicação e negou que haja atrito dentro do partido. “É mentira essa informação. Não há qualquer divergência”.
O descontentamento com as negociações com o governo não se restringe ao PP. Integrantes de outras legendas do chamado Centrão (grupo suprapartidário de centro e direita) também estão insatisfeitos com a distribuição dos cargos. Alegam que as vagas oferecidas são de segundo, terceiro e quarto escalões e que seus apadrinhados serão tutelados por militares, categoria cada vez mais presente em postos-chave no governo.
>Governo entrega parte de ministério ao PP; Centrão espera novos cargos
PublicidadeColegas do líder do PP acreditam que ele quer agradar a outras bancadas de olho em apoio à sucessão da presidência da Câmara em fevereiro de 2021. De acordo com eles, Lira cedeu a indicação ao deputado Sebastião Oliveira (PL-PE), que deve se filiar ao Avante.
“Acho que essa arrumação de ontem atrapalhou tudo, qualquer outra indicação, o clima ficou muito ruim. A bancada ficou insatisfeita com o Arthur Lira, com isso. E acho que a repercussão ficou muito ruim para o governo também”, disse um deputado do PP que pediu para não ter o nome revelado.
Na avaliação dele, o atrito interno deve atrasar as outras nomeações articuladas pelo PP. O partido tenta também emplacar no governo a presidência do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão do Ministério da Educação que movimenta mais dinheiro que muitos ministérios. Em 2019 o orçamento do FNDE foi de R$ 55 bilhões. Até dezembro, o órgão era chefiado por Rodrigo Dias, afilhado político do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). A demissão foi encarada como uma retaliação do governo a Maia.
Pelo combinado inicialmente entre os partidos do Centrão, o PP vai indicar o comando do fundo e as diretorias vinculadas ao órgão serão distribuídas entre o Republicanos (antigo PRB), o MDB, o DEM e o PL.
O PSD tenta emplacar um nome no comando da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), vinculada ao Ministério da Saúde. Integrantes do PSD ouvidos pelo Congresso em Foco confirmaram que há negociação para ocupar o cargo, mas demonstraram ceticismo sobre a nomeação.
“Acho que não vai sair nada agora. Tem essa conversa da Funasa, que era da Frente Parlamentar Evangélica, que está conversando com o PSD. Mas não foi passado para a gente da bancada que estava firme, que seria isso. Estava ainda em processo de gestação”, disse a fonte ouvida pela reportagem.
O presidente tem recorrido a líderes partidários do PP, Republicanos, PSD, PL e PSC para ter uma base legislativa na Câmara e não ficar vulnerável a articulação do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), seu desafeto.
Um deputado do Centrão com larga experiência em cargos de liderança ressaltou que, nos governos anteriores, as bancadas se reuniam e indicavam, em comum acordo, seus nomes. “Hoje os caciques indicam e os outros batem palma”, critica. Para ele, a oferta de cargos não vai render votos para Bolsonaro. “Acho de uma inutilidade tremenda. O Congresso já mostrou que manda e manda muito quando quer. Manda no orçamento e na distribuição de verbas”, disse. “Essas nomeações só vão trazer desgaste para o Centrão. Para o Bolsonaro, não. Se der problema, ele manda o cara para fora”, completou.
> Centrão, que determinará futuro de Bolsonaro, festeja saída de Moro
Em paralelo a isso, deputados do grupo suprapartidário tentam ampliar seu eleitorado para as eleições da Mesa Diretora no ano que vem. Além de Lira, também têm interesse na vaga de Rodrigo Maia nomes como Marcos Pereira (Republicanos-SP), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Elmar Nascimento (DEM-BA).
Quando assumiu a Presidência da República, Bolsonaro avisou ao Congresso que não negociaria com os partidos, mas com bancadas temáticas, como as poderosas frentes parlamentares do agronegócio, dos evangélicos e da segurança pública. Embora tenha aprovado no ano passado a reforma da Previdência, o presidente tem acumulado derrotas no Parlamento e perdido o protagonismo para a Câmara e o Senado. Os embates com Rodrigo Maia se tornaram frequentes a ponto de Bolsonaro pedir publicamente respeito ao presidente da Câmara e acusá-lo de “quase conspirar” contra o seu governo.
A conclusão de líderes próximos ao presidente é de que ele está fazendo algo que deveria ter feito desde o começo de seu governo, negociar diretamente com os partidos, a exemplo de seus antecessores. Eleito com o discurso antissistema, embora tenha exercido o mandato de 28 anos de deputado federal, Bolsonaro afirmou que havia acabado o “toma lá, dá cá”.
> Centrão, que determinará futuro de Bolsonaro, festeja saída de Moro