Não bastasse a crise sanitária imposta pela pandemia de covid-19 e a resistência do presidente Jair Bolsonaro em reconhecê-la, as pessoas em posição de mando em Brasília foram surpreendidas nesta terça-feira (17) por outra bomba: a agitação das redes bolsonaristas na internet em favor de uma nova manifestação, desta vez no dia 31 de março, data oficial de aniversário do movimento militar de 1964 (deflagrado na verdade em 1º de abril).
Incentivado novamente por Jair Bolsonaro, o ato está sendo visto por muitos parlamentares como uma tentativa do presidente, ora em nítido processo de enfraquecimento, de acumular forças para dar um golpe institucional. Conforme o Congresso em Foco apurou, porém, a iniciativa não tem o apoio das Forças Armadas.
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Coordenador das candidaturas de membros das Forças Armadas a cargos políticos em 2018, ano em que também se elegeu deputado federal em São Paulo pelo PSL, o General Peternelli foi claro ao ser entrevistado sobre o assunto pelo Congresso em Foco. “O momento agora não é para isso”, disse, invocando tanto razões políticas quanto sanitárias.
“Temos de acreditar é no governo, e o governo está representado nesse caso pelo ministro da Saúde. Não li sobre essa manifestação, mas acredito que não está de acordo com o que o Ministério da Saúde orienta, afirmou. Inconformado com a elogiada condução da crise pelo ministro da Saúde, Bolsonaro tem procurado esvaziar as atribuições de Luiz Henrique Mandetta.
Segundo o deputado, a hora é de união e de se discutir a pauta que realmente interessa aos brasileiros. “Quando se tem determinado cartaz desse tipo [pelo fechamento do Congresso], tem de ter respaldo legal e o mínimo de contexto lógico. Isso não ocorre. Já me manifestei contra esse tipo de manifestação ‘fora Maia’, ‘fora Alcolumbre’ e até ‘fora Bolsonaro’. Nosso foco agora tem de ser no combate ao coronavírus, na reforma tributária, na reforma administrativa, nas reformas estruturantes de que o país precisa”, reforçou o general da reserva.
PublicidadePara ele, o movimento de 1964 se justificou à época pelas circunstâncias políticas: “O importante é olharmos para frente. Pensar na reforma tributária, pensar, nas hipóteses para contribuir com a reforma administrativa. Pensar principalmente em contribuir com medidas econômicas e sanitárias que estão sendo preconizadas em função do coronavírus”.
Peternelli foi um dos militares que tiveram sua imagem usada nas mídias sociais em uma montagem que viralizou, reunindo o vice-presidente Hamilton Mourão e os também generais Augusto Heleno e Mario Araújo. Chamando para os protestos de 15 de março contra o Congresso e o STF, o card dizia: “Os generais aguardam as ordens do povo”. O deputado general se manifestou, na ocasião, ressaltando que a foto foi usada sem a sua autorização.
Os atos que Bolsonaro quer ver acontecer em 31 de março também não encontram guarida no Clube Militar do Exército do Rio de Janeiro, que todos os anos comemora o aniversário do que chama de revolução. A entidade cancelou todos os atos públicos previstos por causa do coronavírus e informou que não apoiará qualquer manifestação dessa natureza em 2020.
Mesmo contraindicando qualquer manifestação pública que possibilite aumentar os contatos interpessoais e portanto os riscos de propagação do covid-19, o General Peternelli evita fazer críticas a Bolsonaro por ter interagido com o público no último domingo (15), descumprindo a ordem de isolamento por suspeita de infecção pelo coronavírus.
Chefe de comunicação do Clube Militar do Exército do Rio, o coronel Ivan Cosme afirmou ao Congresso em Foco que a instituição não tem qualquer ligação com os chamados feitos por bolsonaristas nesta terça. “O clube não tem nada a ver com isso. O clube faz, é tradicional, este ano não vai fazer e desconhecemos qualquer tipo de iniciativa a esse respeito”.
Na semana passada o Clube Militar se manifestou a favor das manifestações de 15 de março em favor de Bolsonaro e contra o Congresso e o STF. Segundo o coronel, os militares não apoiam o fechamento do Parlamento. “O clube atua sempre pela legalidade da coisa, para que ela flua. O clube não tem participação nisso [em manifestações pelo fechamento do Congresso]. Isso não tem nada de legal e nós não apoiamos esse tipo de coisa”, declarou.
>Coronavírus: os principais fatos sobre a pandemia nesta terça-feira (17)
A medida foi interpretada por analistas políticos ouvidos pelo Congresso em Foco como uma maneira de Bolsonaro centralizar o controle das ações sobre o caso e isolar o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. O presidente demorou a agir na criação do Gabinete de Crise e deixou um vácuo no governo federal no enfrentamento desse problema. A condução do grupo será feita pelo ministro da Casa Civil, o general Braga Neto. Até então o vácuo era preenchido por Mandetta.
O ministro da Saúde e Bolsonaro deram declarações desencontradas sobre o comportamento em relação a doença nos últimos dias. Bolsonaro foi a lugares públicos, apertou mão de apoiadores, minimizou o risco de aglomeração e chegou a dizer nesta terça que vai convidar várias pessoas para a sua festa de aniversário no próximo sábado (22).