A definição mais genérica da palavra “política” é a capacidade de criar diretrizes com o objetivo de organizar o modo de vida dos cidadãos. Fazer política, ao fim e ao cabo, é buscar o bem público e cuidar dele – tanto o patrimônio como a qualidade de vida dos integrantes de uma comunidade. Uma outra definição possível da palavra “política” é a arte da negociação. Pois é através dela que se alcança o consenso, ou seja, o acordo entre os membros de um grupo ou entre grupos, com todos os lados cedendo um pouco para que se alcance um acordo.
Difere substancialmente do resultado obtido por maioria, porque o consenso não implica na aceitação por uma minoria que discorda. Embora as duas formas de decisão façam parte da atividade política, o consenso é a mais nobre forma de decisão. É o ápice da humanização das relações humanas.
Daí porque chega a ser acintosa, para não dizer indecente e até pornográfica, a condição proposta pelo presidente do PL, Valdemar Costa Neto, de seu partido dar apoio a candidatos à presidência da Câmara e do Senado em troca do compromisso deles de defenderem o projeto de lei da anistia que pretende livrar a cara dos golpistas do 8 de janeiro. E, de quebra, reverter a inelegibilidade de Bolsonaro, abrindo caminho para sua candidatura à presidência em 2026.
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Até outro dia seria inimaginável que alguém tivesse o desplante de apresentar uma proposta dessas. Mas, como a qualidade da atividade política no Brasil desceu ladeira abaixo, não se viu até agora quem pelo menos se ruborizasse com a proposta cretina de Valdemar. Porque, na essência, o que ele está propondo é simplesmente a troca do valor mais alto da convivência humana civilizada – a democracia – por um cargo. Simples assim. Não se nega que se trata de uma proposta para negociação. Mas é uma proposta indecorosa na origem, pelos resultados que o proponente pretende atingir.
Em primeiro lugar, passar um pano no mais agressivo ato golpista dos novos tempos – a invasão das sedes dos três Poderes da República com a vandalização dos espaços e das peças históricas do mobiliário que abrigam, ato que teve apoio de Bolsonaro, frise-se. Depois, abrir a porta para que o próprio Bolsonaro volte à cena política. Valdemar, cinicamente, compara Bolsonaro a Lula, argumentando que o atual presidente também enfrentou restrições legais antes de concorrer à Presidência. E que Bolsonaro apenas “conversou com embaixadores e disse que era contra as urnas”.
Mentira. Em primeiro lugar, Bolsonaro foi condenado à inelegibilidade por oito anos por abuso do poder político e econômico. E por ter chamado embaixadores ao Palácio do Planalto para que coonestassem um plano golpista que seria a anulação da eleição que elegeu Lula sob o argumento fajuto de que teria havido fraude nas urnas eletrônicas, sem apresentar qualquer prova. A propósito, curiosa e oportunisticamente, nem Valdemar nem Bolsonaro disseram até uma palavra contra as urnas usadas nesta última eleição. Pudera. Os candidatos da direita bolsonarista obtiveram a maioria das prefeituras e disputam com muitas chances de vitória em várias delas onde vai ter segundo turno. Logo, as urnas, milagrosamente, de uma hora para outra tornaram-se… legítimas.
Valdemar é uma figura, no mínimo, ridícula, não se tratasse de um oportunista político da pior espécie. É bom lembrar que ele está proibido por decisão judicial de se encontrar com Bolsonaro, porque tanto ele quanto o ex-presidente foram alvo da operação Tempus Veritatis, que investiga a organização criminosa que teria atuado no ato golpista do 8 de janeiro de 2023.
Isto posto, vale lembrar: se os postulantes à presidência da Câmara e do Senado se dispuserem a, pelo menos, discutir a proposta de Valdemar, estarão se rebaixando a ela. E simplesmente, repita-se, trocando o valor mais alto de uma nação civilizada – a democracia – por um cargo. Simples assim.
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