São robustas as evidências a respeito dos malefícios do uso exagerado de telefones celulares e do engajamento excessivo nas mídias sociais por parte de adolescentes e, inclusive, de crianças. Os malefícios são incomparavelmente superiores aos benefícios. Isso vale para o uso em casa e o uso na escola.
Os malefícios se estendem a diversos domínios críticos para o desenvolvimento e aprendizagem. O uso excessivo altera a atenção e a disponibilidade para aprender. Isso faz com que os alunos tenham dificuldade cada vez maior para se concentrar em um tópico – o que prejudica a aprendizagem tanto no curto prazo quanto a longo prazo, pois diminui a capacidade de aprender.
O uso desses equipamentos e dispositivos também impacta a interação social entre os alunos, dentro e fora da sala de aula, dentro e fora da escola. Ao mesmo tempo, contribui para aumentar os comportamentos negativos como o bullying e o isolamento social.
Celulares e participação intensiva em redes sociais também afetam a saúde mental dos alunos. O uso frequente de celulares, especialmente para redes sociais e mensagens, está comprovadamente associado a níveis mais altos de ansiedade e depressão entre os alunos.
Além disso, o uso de telefones celulares fora da escola vem afetando especialmente os padrões de sono dos alunos, afetando a aprendizagem e desempenho dos alunos no curto prazo e seu desempenho acadêmico, no longo prazo.
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Tudo isso é devidamente documentado em inúmeros estudos realizados em diversos países do mundo. O efeito acumulado do uso excessivo desses dispositivos vem contribuindo para afetar a própria capacidade mental dos alunos – com fortes indícios de redução do QI (coeficiente de inteligência) de populações nos países desenvolvidos em que o tema foi estudado, conforme fartamente documentado nos estudos de Michel Desmurget – autor do livro “A fábrica dos cretinos digitais”. O uso descontrolado de smartphones e outras tecnologias digitais nas escolas prejudica seriamente o desenvolvimento cognitivo e o desempenho acadêmico dos alunos.
PublicidadeDito isso resta perguntar: existe razão para legislar sobre o tema?
A pergunta é relevante, e sugere pelo menos duas linhas de reflexão. A primeira é de natureza puramente jurídica. Dada a autonomia de estados e municípios para cuidar da educação, que necessidade haveria para criar mais legislação?
A segunda linha de reflexão se refere à possível eficácia de uma legislação. Os defensores arguem que uma legislação bem elaborada poderia reduzir os riscos de ações judiciais contra decisões de escolas e redes de ensino, que, dessa forma, estariam mais amparadas e a salvo de investidas jurídicas de toda ordem. Será? A dúvida sobre a eficácia da legislação tem fundamento. O temor sobre contestações pelo Ministério Público também.
Independentemente da legislação que porventura vier a surgir, o país teria muito a ganhar de duas linhas de debates. A primeira é discutir o tema em profundidade, trazendo para o Congresso Nacional estudos e especialistas para informar a sociedade brasileira, famílias e educadores sobre a gravidade da questão. Debates profundos – não na forma de audiências públicas, mas de seminários bem organizados – poderiam trazer enormes esclarecimentos e contribuições sobre as diversas facetas do problema. Também poderiam lançar luzes a respeito de formas eficazes ao alcance das escolas, professores e famílias. Este não é o papel do Congresso. Mas, para legislar de maneira adequada, o Congresso precisa conhecer o problema a fundo.
A segunda contribuição surgiria de um debate igualmente profundo a respeito dos requisitos para que uma legislação venha a ser eficaz. Um estudo da forma e eficácia das legislações de outros países – especialmente a França – e debates bem fundamentados sobre legislação a respeito de temas correlatos, no Brasil, poderiam sugerir cuidados na elaboração de uma eventual lei, de forma que aumentasse suas chances de ter alguma eficácia.
Um bom debate sobre esses dois temas constituiria uma enorme contribuição do Congresso Nacional.
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