Na última quinta-feira (22), com a aprovação do plano orçamentário de 2023, o Congresso Nacional encerrou as atividades da 56ª legislatura. Marcada pelo enfraquecimento dos partidos de centro e por uma guinada conservadora de proporção inédita para a Nova República, esta composição se encerra com um saldo negativo na entrega de projetos de proteção ao meio ambiente, na avaliação de articuladores da área.
Ao longo de toda a sua gestão, o presidente Jair Bolsonaro (PL) fomentou e propôs projetos de lei voltados para o enfraquecimento da política ambiental no Brasil. O deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), ex-coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, e o coordenador do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), André Lima, contam que a frente parlamentar precisou adotar, durante toda a legislatura, uma postura de enfrentamento ao governo.
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Duas etapas
André Lima conta que esse enfrentamento passou por duas etapas na Câmara dos Deputados: primeiro, sob a presidência de Rodrigo Maia (PSDB-SP), que adotou uma postura colaborativa com a bancada ambientalista e buscou segurar a tramitação de projetos considerados prejudiciais ao meio ambiente. A partir de 2021, já assumiu Arthur Lira (PP-AL), defensor das pautas abraçadas pelo governo.
Além de fazer parte da bancada ruralista, Arthur Lira contou com uma ferramenta que deu fôlego renovado à tramitação das chamadas “pautas-bomba” para o meio ambiente. “O orçamento secreto empoderou o Lira, que não segurou nenhuma das pautas do governo. Colocou tudo para votar, e entregou dois projetos caríssimos em favor do governo: o novo licenciamento ambiental e o pacote do veneno”, apontou André Lima.
Concentrados em tentar deter os avanços desses dois projetos, bem como o projeto que busca legalizar a mineração em terras indígenas, a bancada ambientalista encontrou pouco espaço para avançar em suas próprias propostas. “Tivemos que monitorar a tramitação de mais de mil projetos ao longo desses quatro anos. No ponto de vista de leis novas, conseguimos avançar na lei de pagamento por serviços ambientais, na aprovação dos termos do protocolo de Nagoia. Mas foram anos muito difíceis, em que não tivemos sossego”, conta Rodrigo Agostinho.
O protocolo de Nagoia, visto por Agostinho como uma vitória nessa legislatura, foi aprovado em 2020 e consiste em um acordo de 128 países para estabelecer regras de acesso a recursos genéticos extraídos da natureza, protegendo os interesses econômicos de países de maior biodiversidade. Outro projeto de interesse da bancada, mas ainda com a tramitação emperrada, é a criação do mercado regulado de carbono, que cria condições para a indústria sustentável conseguir competir com setores menos comprometidos com o meio ambiente.
O esforço constante, porém, impediu o efeito de muitas das “pautas-bomba”: o chamado “pacote do veneno”, que flexibiliza o mercado de agrotóxicos, avança lentamente no Senado. O projeto de lei que legaliza a caça, pautado no início de 2022 na Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, foi retirado de pauta em todas as tentativas de votação. Mesmo com a urgência aprovada, o projeto que legaliza a mineração em terras indígenas segue emperrado na Câmara, e o mesmo ocorre no Senado com o novo código de licenciamento ambiental, que retira do Estado grande parte de sua capacidade de fiscalização.
Uma delas, porém, já deixa marcas: a medida provisória que altera as normas de regularização fundiária nos estados da Amazônia. Com ela, se facilitou a grilagem realizada em áreas de proteção ambiental da União, bem como em terras indígenas e comunidades tradicionais, dois tipos de terrenos de importância estratégica para a preservação da floresta.
Alternativas à Câmara
Se na Câmara dos Deputados o ambiente, a partir de 2021, foi de hostilidade à defesa do meio ambiente; o Senado já foi o lugar de refúgio. “O Senado foi o adulto na sala. Foi quem deu uma certa equilibrada, muito em função tanto da mobilização da sociedade civil quanto de artistas, ex-ministros do meio ambiente, empresários e investidores. Houve uma grande mobilização em torno dessa pauta, além de uma bancada ambiental muito aguerrida”, ponderou André Lima.
Rodrigo Agostinho ainda aponta para um segundo eixo de ação da bancada ambientalista: o Supremo Tribunal Federal (STF). “Diversos parlamentares da frente tiveram que ir muitas vezes ao judiciário para defender pontos importantes, como a participação da sociedade no Conselho Nacional do Meio Ambiente, a utilização de recursos do Fundo Amazônia e o desmonte de políticas públicas”, relembrou.
A organização não-governamental WWF, especializada em defesa do meio ambiente, acompanha as questões no Supremo ligadas à pauta ambiental. Rafael Giovanelli, especialista em políticas públicas da instituição, chama a atenção para a decisão de seu ex-presidente Luiz Fux de realizar no primeiro semestre de 2022 o julgamento da “pauta verde”, quando levou a plenário sete ações, grande parte delas movidas por parlamentares, para exigir que o governo desse condições de pleno funcionamento às políticas de proteção ambiental.
“A Corte deu uma resposta importante para os graves problemas sofridos pela gestão ambiental brasileira nos últimos anos. Reforçou a institucionalidade democrática, garantindo a participação direta da sociedade civil na política ambiental”, declarou o especialista.
A expectativa tanto de André Lima quanto de Rodrigo Agostinho já é de melhora a partir de 2023. Apesar da previsão de encolhimento da bancada ambientalista na próxima legislatura, o governo passa a ser assumido por uma gestão de viés progressista, com promessas de fortalecer as políticas públicas de proteção ao meio ambiente.
“Mesmo com uma ampla bancada conservadora no Congresso, no fim é o Executivo o principal motor da pauta no Congresso. Nossa esperança é que, com o novo governo, projetos voltados para a sustentabilidade voltem a avançar na Câmara”, ressaltou o deputado.
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