O Movimento Voto Consciente nasceu em 1987 e desde 2015 tem como um de seus principais projetos o Legis-Ativo, coletivo de 20 cientistas políticos, com paridade absoluta de gênero, que até outubro de 2023 publicou textos semanais de análise política com ênfase nas mais diversas questões que envolvem os parlamentos e, mais adiante, também passou a produzir podcasts sob a mesma temática em parceria com a Fundação Konrad Adenauer e a Associação Brasileira de Escolas do Legislativo (ABEL). Os envolvidos em todas essas iniciativas se espalham pelas cinco regiões do país e são professores universitários, analistas políticos, pesquisadores ou consultores. Ao longo de oito anos, foram produzidos quase mil textos, postados no portal de um tradicional jornal paulista e no site do Voto Consciente.
A introdução desse texto não destoa do título à toa. Se você está nos lendo aqui, a boa notícia é: a partir de janeiro o coletivo Legis-Ativo desembarca com seus conteúdos no Congresso em Foco, o que nos deixa repletos de orgulho e nos traz grandes expectativas.
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E para que entremos 2024 embalados, estreamos com uma percepção sobre o que foi este ano que termina olhando para o Poder Legislativo. 2023 foi marcado, principalmente, por conflitos que começaram em janeiro, a partir da tresloucada tentativa de golpe de Estado do dia 8 de janeiro que resultou na depredação de partes do Congresso Nacional, dentre outros edifícios da Praça dos Três Poderes, e culminou na abertura de uma CPI cujas assinaturas foram coletadas no final da legislatura passada e os trabalhos ocorreram sob o atual perfil congressual. Assim, a aparente paz pregada por Lula em seus discursos de eleito, sinalizando ao caráter estratégico e essencial do bom relacionamento com o Legislativo, logo esbarrou em diversos desafios.
O primeiro deles veio ainda em 2022, simbolizado pela eleição de um Congresso Nacional muito mais à direita, em termos de intensidade e composição partidária, do que aqueles verificados nos dois primeiros mandatos do PT no Planalto. Isso, por si só, sinalizou ao país que teríamos uma agenda de centro, nunca de esquerda, nas relações de governabilidade entre tais poderes. Para se ter uma ideia, o PL elegeu a maior bancada na Câmara dos Deputados com 99 cadeiras, ficando à frente do PT (68), do União Brasil (59), do PP (47) e do MDB (42).
Mesmo buscando atrair legendas como PSD, MDB e União Brasil para postos de poder, a velha fórmula de construir apoio se mostrou pouco produtiva. Lula colheu, assim, derrotas importantes, destacando-se de forma mais positiva na agenda econômica que não parece espelhar o pensamento de partes da esquerda que busca representar. Resultado: passamos meses ouvindo falar em reformas ministeriais para acomodar setores do Centrão, assistimos à chegada de partes do Republicanos e do Progressistas à Esplanada, mas os resultados melhoraram de forma discreta, com pautas atrasadas e negociadas a preços altos à luz das ferramentas de governabilidade. Concomitantemente, não foi incomum o PT, de dentro do Legislativo, atacar agendas e criticar ministros, inclusive, do próprio partido.
Internamente o Legislativo também passou por turbulências. Em dezembro de 2022, o STF proibiu a prática de distribuição das “emendas do relator”, que caracterizou ao sabor de escândalo de corrupção a relação com o governo de Bolsonaro. A criatividade ao longo de 2023 manteve a possibilidade de recursos extraordinários serem distribuídos, e a ausência inicial das “emendas secretas” não impediu que Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG) fossem reconduzidos às presidências da Câmara e do Senado, respectivamente, em fevereiro. Ambos com o apoio do Executivo, que não cometeu os erros de Dilma Rousseff em 2015 que culminaram na eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) entre os deputados federais.
PublicidadeMas a permanência da dupla no controle das casas congressuais logo desvendaria um conflito que prejudicou a agenda do Executivo. Lira e Pacheco se mostraram distantes, e para além dos novos caminhos para a distribuição do orçamento, tiveram que lidar com a forma como tramitam as medidas provisórias entre Senado e Câmara. Se a pandemia emprestou mais poderes a Lira, coube a Pacheco, estimulado por pares, buscar um reequilíbrio de forças que custou caro à agenda de Lula – que até agora não conseguiu ter o sucesso de seus primeiros mandatos na aceitação às suas demandas. O ano termina, inclusive, com a aprovação de peças orçamentárias que buscam dar muita força econômica aos legisladores, reforçando um debate sobre quem governa o país que vem nos desafiando, nos últimos anos, de diferentes formas, e hoje é caracterizado por autonomia no controle de recursos e distanciamentos ideológicos.
Sobre tal realidade, duas questões finais merecem atenção por marcarem o ano do Congresso Nacional. Na Câmara, Lira seguiu seu ímpeto centralizador e criou uma série de instrumentos e mudanças regimentais que o fortaleceram na negociação com o Planalto. Se por um lado, a chegada de seu colega André Fufuca ao Ministério dos Esportes foi simbolizada por declarações de que ao término de seu mandato de presidente, em fevereiro de 2025, Lira daria um ótimo ministro, por outro há quem sugira tentativa de ele consolidar o que Rodrigo Maia, seu antecessor, não conseguiu: empilhar mais dois anos no poder, contrariando ou modificando a Constituição Federal. Paralelamente, faz meses que se fala extemporaneamente da eleição para a sucessão dos comandos do Congresso, que certamente ficarão nas mãos do dito Centrão.
Por fim, no Senado os conflitos rumam em outra direção. Na esteira do conservadorismo que democraticamente emergiu das urnas e ocupou espaços no Legislativo, assistimos a embates com o Supremo Tribunal Federal em torno de agenda progressista e do ativismo que se deu a partir de casos emblemáticos como a demarcação de terras indígenas, a tentativa de liberação do aborto e a flexibilização ao porte de drogas. Indignados com tais debates, os senadores partiram para o conflito buscando legislar em mão contrária à agenda do Judiciário e em tom de ameaças institucionais falam em utilizar ferramentas como: convocação de ministros, abertura de processos de impeachment contra eles e uma reforma da Constituição para restringir o poder do STF. O Judiciário não recebeu bem o embate e o cenário não parece pacificado.
Para além de tais aspectos, é fato que a agenda legislativa de 2023 trouxe ao país a maior reforma tributária desde o governo Vargas, bem como uma série de outras decisões que indicam o quão essencial é olharmos para o parlamento, o que nos comprometemos a fazer aqui a partir de janeiro enquanto coletivo prestes a completar dez anos em 2025 e 1.000 textos escritos ainda nas primeiras semanas de 2024. Se o Congresso em Foco completará 20 anos em 2024, a nossa chegada traz consigo um simbolismo do tamanho de nosso orgulho e das pretensões dessa parceria. Fica 2023, entra 2024 e o nosso desejo de pensarmos e produzirmos juntos.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
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