As eleições municipais de 2024 no Brasil marcaram um novo capítulo na utilização de novas tecnologias, com a inteligência artificial (IA) desempenhando um papel significativo nas campanhas eleitorais. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estabeleceu regras específicas para o uso de IA visando garantir a transparência e a integridade do processo eleitoral.
Em fevereiro de 2024, o TSE publicou uma resolução que define diretrizes claras sobre o uso de IA nas campanhas eleitorais. Entre as principais regras estão: a obrigatoriedade de avisar explicitamente quando o conteúdo de propaganda eleitoral é gerado por IA; a proibição de deepfakes, que são conteúdos manipulados digitalmente para alterar a imagem ou voz de uma pessoa; restrições ao uso de robôs para intermediar o contato com eleitores, não podendo simular diálogo com o candidato ou qualquer outra pessoa real; responsabilização de provedores de internet e plataformas digitais, que devem retirar imediatamente conteúdos que contenham desinformação, discurso de ódio, ideologia nazista e fascista, além de conteúdos antidemocráticos, racistas e homofóbicos; combate à desinformação, proibindo a utilização de conteúdo fabricado ou manipulado para difundir fatos inverídicos ou descontextualizados que possam causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral; e o uso de chatbots e avatares, que devem seguir as mesmas regras de transparência e não podem simular interlocução com uma pessoa real.
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Um levantamento realizado pelo Aos Fatos identificou que 85 candidatos a vereador declararam gastos com três empresas que fornecem conteúdos gerados por IA. Desses, ao menos 38 publicaram conteúdos sintéticos sem informar ao eleitor sobre o uso da tecnologia. A IA foi amplamente utilizada para a produção de jingles, anúncios e outros conteúdos de campanha. Empresas especializadas forneceram pacotes de produção de artes para materiais gráficos, redes sociais e figurinhas de WhatsApp, além de jingles por IA. No entanto, muitos candidatos não cumpriram a exigência de informar explicitamente que o conteúdo foi produzido com IA.
Além disso, a IA foi utilizada para otimizar a comunicação com eleitores através de chatbots, que responderam a perguntas nas redes sociais e plataformas de mensagens, garantindo disponibilidade 24 horas por dia. Ferramentas de IA também foram empregadas para monitorar menções nas redes sociais, analisar o sentimento do público e detectar fake news, permitindo ajustes em tempo real na estratégia da campanha e ajudando a combater a desinformação. A prática de utilizar microinfluenciadores políticos, observada nas eleições presidenciais dos EUA em 2024, também foi adotada no Brasil, com influenciadores locais transmitindo mensagens políticas de forma mais autêntica e direcionada.
A crescente utilização de IA nas campanhas eleitorais levanta importantes questões sobre a regulação dessa tecnologia no Brasil. A resolução do TSE é um passo significativo para garantir a transparência e a integridade do processo eleitoral, mas a falta de conformidade por parte de muitos candidatos destaca a necessidade de uma fiscalização mais rigorosa e de uma maior conscientização sobre as regras. Além disso, a discussão sobre a regulação de IA no legislativo brasileiro deve considerar o seu impacto em toda a sociedade, abordando temas como a disseminação de desinformação e a proteção de dados pessoais.
Em 2024, o legislativo brasileiro está intensamente envolvido na discussão e tramitação de diversos projetos de lei que visam regulamentar o uso da Inteligência Artificial no país. Entre os principais projetos em tramitação estão o PL 21/2020, que cria o marco legal do desenvolvimento e uso de IA no Brasil, e o PL 2.338/2023, que estabelece normas gerais para o desenvolvimento, implementação e uso responsável de sistemas de IA, inspirado no AI Act da União Europeia. Outros projetos, como o PL 4.025/2023 e o PL 3.592/2023, tratam da utilização de imagens pessoais e direitos autorais decorrentes do uso de IA.
Os debates no Legislativo brasileiro estão focados em definir princípios éticos para o uso de IA, criar uma Política Nacional de Inteligência Artificial, e estabelecer mecanismos de governança e responsabilização. Além disso, há uma preocupação crescente com os riscos da IA, incluindo a criação de deepfakes e a manipulação de conteúdo audiovisual, que podem impactar a sustentabilidade dos regimes democráticos e a proteção de direitos fundamentais. Propostas de certificação para garantir o uso ético e transparente de sistemas de IA, bem como incentivos para fomentar a inovação e o desenvolvimento tecnológico no Brasil, também estão em discussão.
O Legislativo brasileiro está em um momento crucial de definição do marco regulatório para a IA, buscando equilibrar a proteção de direitos e garantias com o fomento à inovação e ao desenvolvimento tecnológico, com inspiração em modelos internacionais e adaptações às necessidades locais. A criação de um marco regulatório abrangente para a IA é essencial para garantir que essa tecnologia seja utilizada de maneira ética e responsável, promovendo a confiança pública e a integridade dos processos democráticos.
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