A Transparência Brasil, a Transparência Internacional – Brasil e a Associação Contas Abertas divulgaram uma nota conjunta, nesta segunda-feira (4), sobre o projeto de lei do deputado Rubens Pereira Jr. (PT-MA), que sugere um acordo entre os Poderes a respeito das emendas parlamentares. De acordo com as três instituições, o projeto não atende às exigências do Supremo Tribunal Federal (STF), “especialmente no que se refere à transparência e à rastreabilidade das emendas, nem impõe as medidas necessárias para a redução dos graves riscos de corrupção no manejo das emendas parlamentares, cuja ocorrência é evidenciada por múltiplos escândalos recentes”. A matéria está prevista na pauta desta segunda do plenário da Câmara.
Segundo as entidades, o PLP 175/2024 teria “falhas e omissões graves”. “É absolutamente essencial que, ao contrário do que se anuncia com a votação açodada de um requerimento de urgência nesta segunda (4 nov. 2024), este projeto seja submetido a um processo legislativo adequado, com a participação da sociedade civil”, alerta o comunicado.
De acordo com o projeto, as emendas de comissão – apontadas como uma espécie de substituto das emendas de relator, o orçamento secreto, pois não possuem um autor designado já que o indicador do montante é um colegiado – deverão identificar de forma precisa o seu objeto, sendo vedada a designação genérica de programação que contemple ações orçamentárias distintas.
Já as emendas de bancadas serão limitadas a oito por estados com até cinco milhões de habitantes; seis para estados que têm de cinco a dez milhões de habitantes; e quatro para estados com mais de dez milhões de habitantes. Os valores deverão ser destinados a projetos e ações estruturantes, com registro em ata e encaminhamento aos órgãos executores.
“A falta de transparência na formulação das emendas parlamentares seguirá, no caso das emendas coletivas, pela ausência de um rol mínimo e padronizado de informações que devem constar nas atas das reuniões de bancada e de comissão que definem as emendas a serem apresentadas. Inclusive, estas atas deveriam ser publicadas em formato estruturado, de modo a possibilitar o rastreio de todo o processo de execução nos sistemas do governo federal, como Transferegov e Portal da Transparência”, aponta a análise das organizações.
No caso das chamadas “emendas PIX”, de transferência direta, o texto do vice-líder do governo determina que o Executivo do ente beneficiado deverá comunicar em 30 dias o valor recebido, o plano de trabalho e o cronograma ao Tribunal de Contas da União (TCU) ao Legislativo. Esta medida pretende dar maior transparência ao uso do recurso.
PublicidadeA nota observa que nesta modalidade de emendas, “persistem muitos dos mesmos problemas” e a obrigatoriedade de informar o objeto da emenda, tal qual estabelece o PLP, “não impede que tal informação seja genérica”
“Um problema recorrente se mantém com a possibilidade de que as emendas Pix sejam desmembradas após a aprovação da Lei Orçamentária Anual (LOA), já na fase de execução, como ocorre hoje, dificultando conhecer com antecedência o destino da verba pública. Não há obrigação para que o ente beneficiado pela emenda Pix aplique o recurso recebido no objeto indicado pelo parlamentar ao apresentar a emenda, ou seja, mantém-se a lógica de extrema liberdade no uso do dinheiro público, o que é incompatível com a Constituição Federal”, avaliam as entidades.
Congresso “com pouca ou nenhuma responsabilidade”
O comunicado relembra que a formulação e execução das emendas parlamentares depende de “três grupos de atores: parlamentares, Poder Executivo federal e entes beneficiários, aos quais deveriam ser atribuídas responsabilidades e deveres correspondentes”.
Segundo as entidades, deputados e senadores seguem sendo “meros indicadores de despesa, com pouca ou nenhuma responsabilidade”. “Não se estabelecem, por exemplo, iniciativas de fiscalização, pelas comissões, da execução das emendas em suas áreas. Tampouco são instituídos procedimentos mínimos de participação social na definição das emendas.”
“Na contramão dos riscos de corrupção e conflito de interesse, evidenciados por notícias recentes, não são previstos quaisquer mecanismos de mitigação destes riscos. A indicação dos beneficiários das emendas coletivas (bancada e comissão) segue podendo ocorrer após a aprovação da Lei Orçamentária, o que também é inconstitucional, já que tais indicações devem se dar durante o processo legislativo”, dizem as organizações.
A nota critica também o governo federal na “promoção de ferramentas de transparência e rastreabilidade com amplo potencial de redução dos riscos de corrupção, como o Portal Nacional de Compras Públicas”.
“Adicionalmente, falta uma lógica de avaliação técnica sobre a eficiência dos investimentos realizados por meio de emendas que possibilite um direcionamento a programas e políticas públicas onde e como esses recursos possam produzir melhores resultados para a sociedade”, avalia.
O texto da Transparência Internacional e do Contas Abertas critica a falta de “objetividade” nos critérios para a proposição, aprovação e execução de emendas, ao citar a priorização por obras inacabadas, estabelecida pelo PLP, que “em um cenário de mais de 8,6 mil obras pendentes de conclusão, é extremamente problemático”.
“Apesar destes elementos problemáticos, merecem destaque alguns avanços importantes em consonância com o que as organizações signatárias desta nota têm defendido, como a sujeição do processo de execução das emendas parlamentares, especialmente as Pix, à fiscalização pelo Tribunal de Contas da União e a proibição expressa de individualização das emendas de bancada, o que, inexplicavelmente, no entanto, não alcança as emendas de comissão”, ponderam as organizações.
Relembre
Em agosto, o ministro do STF Flávio Dino suspendeu o pagamento das emendas parlamentares, exigindo maior transparência e rastreabilidade do recurso. As emendas são montantes que deputados e senadores destinam às suas bases para a execução de obras, projetos e programas locais. Neste ano, cerca de R$ 52 bilhões foi reservado do Orçamento para esta finalidade.
Com o impasse em torno do tema, representantes dos Três Poderes se reuniram para buscar um consenso. Até o relator do projeto de lei orçamentária anual (PLOA), o senador Angelo Coronel (PSD-BA), apresentou um projeto para tentar solucionar a questão. Ele chegou a se reunir com Dino para alinhavar ajustes, mas o deputado Rubens Pereira Jr., vice líder do governo na Câmara, apresentou um possível acordo. O petista é próximo de Dino e tem bom diálogo com o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).
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