Renata Camargo e Fábio Góis
Levantamento exclusivo feito pelo Congresso em Foco revela que os deputados estão faltando mais às votações em sessões deliberativas sem dar qualquer explicação para os eleitores.
Somente no primeiro semestre deste ano, os deputados faltaram 1.216 vezes sem registrar qualquer justificativa. Um simples ofício basta para assegurar a prerrogativa definida no regimento interno da Câmara. O número – além de ser superior às ausências sem justificativas de todos os semestres anteriores da legislatura – é maior do que o total de ausências não justificadas ocorridas em todo o ano de 2009, quando os parlamentares deixaram de explicar a razão de 1.066 faltas.
Uma vez comparado às faltas do ano passado, o total de ausências sem justificativa também mais que dobrou em relação ao número de sessões deliberativas realizadas no primeiro semestre. Ainda assim, os deputados não têm demonstrado muita preocupação em dizer a razão de suas ausências em votações, no plenário da Câmara.
O Regimento Interno da Câmara, bem como a própria Constituição federal, permite que deputados faltem às sessões deliberativas, desde que não excedam o limite máximo de um terço de ausências em plenário. No entanto, os parlamentares precisam ao menos justificar suas ausências para manter o recebimento de subsídios e verbas de gabinete.
Ainda assim, quase dois terços dos deputados – 309 parlamentares – ignoraram o expediente das justificativas. Mesmo podendo usufruir da prerrogativa regimental, eles não apresentaram qualquer ofício explicando por que não compareceram às votações.
“Quando o parlamentar não justifica, a regra geral é levar falta”, assegurou à reportagem o secretário-geral da Câmara, Mozart Viana, lembrando que, nos casos de falta injustificada, a Casa opera cortes de subsídio calculados sobre cada dia útil de ausência.
Campeões
No rol dos faltosos que nem se preocuparam em dar explicações à opinião pública, o campeão é o deputado Marcelo Almeida (PMDB-PR), candidato à reeleição. Almeida faltou a 26 das 59 sessões realizadas no semestre e somente justificou duas de suas faltas. O deputado Roberto Rocha (PSDB-MA), que pleiteia uma vaga no Senado, é o segundo em ausências não justificadas. Foram 22 faltas sem dar explicações e 16 ausências justificadas.
Também fazem parte do ranking dos mais faltosos sem justificativa o segundo deputado mais rico do Congresso, Odílio Balbinotti (PMDB-PR) – que disputa a reeleição –, e Zé Vieira (PR-MA), que figura entre os dez mais faltosos no ranking geral da assiduidade. Zé Vieira também é candidato à reeleição.
A reportagem entrou em contato com os deputados mais faltosos, tanto por meio do telefone celular funcional quanto diretamente junto aos gabinetes. Nenhum dos dez parlamentares – entre os que deixaram de justificar – foi localizado para falar sobre o assunto.
O Congresso em Foco reitera que o espaço para respostas ficará à disposição dos parlamentares, que poderão enviá-las a qualquer tempo. O site assegura que toda e qualquer resposta – encaminhada à redação ou publicada em quaisquer dos canais de interação – será respeitada em seu teor original.
Justificativas
O direito de licença é assegurado pelos artigos 55 e 56 da Constituição Federal. Segundo o inciso II do artigo 56, o parlamentar não perderá o mandato se estiver “licenciado por motivo de doença, ou para tratar, sem remuneração, de interesse particular, desde que, neste caso, o afastamento não ultrapasse centro e vinte (120) dias por sessão legislativa”. No caso, a sessão legislativa em questão é cada ano de uma legislatura – que são quatro para deputados e oito para senadores.
Como mostrou o site, em reportagem publicada nesta segunda-feira (2), no primeiro semestre deste ano os deputados bateram o recorde da legislatura em relação ao total de faltas em sessões deliberativas (sessões com votações).
O Ato nº 66/2010 da Mesa Diretora, assinado pelo presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), executa algumas alterações no “registro de comparecimento” dos deputados. O parágrafo 5 do artigo 2º dispõe sobre uma das hipóteses em que a ausência é considerada justificada: “no atendimento de obrigação político-partidária, conforme o artigo 226, inciso VI, do Regimento Interno”. A justificativa pode ser apresentada a qualquer tempo, desde que esteja configurada a incompatibilidade de agenda entre os compromissos parlamentar e partidário.
“É um ajuste entre a Mesa e os líderes partidários”, explica Mozart, acrescentando que o artigo não restringe o benefício da “licença por interesse particular” ao período de campanha eleitoral. “A regra vale para o mandato inteiro, e também pode ser aplicado à campanha.” O ato ainda não foi publicado na página eletrônica da Casa, mas já está em vigência (foi publicado no Diário Oficial da Câmara).
“Casos omissos”
O rol de hipóteses de ausência justificável é maior do que prevêem as próprias normas da Câmara. No mesmo Ato 66 assinado por Temer, o artigo 5º estabelece que “os casos omissos serão resolvidos pela Mesa”. Isso quer dizer que tais ocorrências, que não estão detalhadas no texto do documento, ficam à mercê da interpretação da Mesa.
“É quando o parlamentar, por algum motivo, não pode comparecer [às sessões deliberativas]. Nesse caso, a Mesa vai avaliar os casos que não estão descritos no regimento interno da Câmara”, esclareceu o secretário-geral, dando como exemplo a “falta de teto” em aeroportos (ausência de condições de pouso e decolagem), o que impossibilita o deslocamento de deputados de seu estado de origem para Brasília.
Na prática, o artigo pressupõe que podem ser suficientes para justificar o não comparecimento problemas como aeroportos interditados, extravios de bagagem, demandas no estado de origem e demais ocorrências particulares que impeçam a presença do parlamentar.
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