Enquanto equipe econômica e parlamentares não chegam a um acordo sobre as fontes de financiamento para o Renda Cidadã, programa que deve substituir o Bolsa Família, a Câmara guarda na gaveta há dois anos uma proposta que pode gerar uma economia de pelo menos R$ 2,5 bilhões aos cofres públicos, segundo estimativas do relator, caso seja aprovada. É o projeto de lei que proíbe os chamados supersalários, vencimentos do funcionalismo público que ultrapassam o teto dos servidores, que é a remuneração de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), R$ 39.293,32 atualmente.
>Malafaia entregou lista de evangélicos para Bolsonaro indicar ao STF. Veja os nomes
As principais informações deste texto foram enviadas antes para os assinantes dos serviços premium do Congresso em Foco. Cadastre-se e faça um test drive.
A possibilidade usar os recursos economizados com o cumprimento do teto tem sido defendida por congressistas, mesmo reconhecendo que o valor não é suficiente para bancar o novo programa. O assunto não está contemplado na reforma administrativa enviada pelo governo ao Congresso, que atinge os servidores em geral, exceto magistrados, membros do Ministério Público, militares e outras carreiras típicas de Estado.
Leia também
Na avaliação de deputados ouvidos pelo Congresso em Foco Premium, impedir o pagamento dos supersalários é também uma forma de responder à sociedade que o Congresso está contra abusos e privilégios no serviço público de maneira indistinta.
Falta convencer o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que desistiu de pautar, em agosto, o pedido para que o projeto fosse votado em regime de urgência. O requerimento foi assinado pelos líderes partidários e contou com o aval de Maia. O texto está pronto para votação desde junho de 2018. Após sucessivos adiamentos, o texto acabou não sendo votado pela comissão especial.
Publicidade“O presidente alegou primeiro, com certa razão, que havia mudança na Procuradoria-Geral da República. Depois, que tinha mudança na presidência do Supremo. Vencido isso, não tem mais por que não votar. Os líderes já assinaram o requerimento de urgência. Tem maioria absoluta para aprovar”, disse o deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR), relator da proposta, ao Congresso em Foco Premium.
Presidente da Frente Parlamentar em Defesa do Serviço Público, o deputado Professor Israel (PV-DF) defende a votação do projeto relatado por Rubens Bueno. Segundo ele, a aprovação do fim dos supersalários diminuiria a pressão pela reforma administrativa. “Para a frente, se esse assunto tivesse sido debatido, teríamos menos pressão para aprovar a reforma. É um momento difícil porque os deputados estão muito envolvidos com eleições. Por isso, fica um pouco difícil para essas articulações mais densas. Acredito que depois das eleições, o assunto voltará à tona”, afirma o deputado.
Vice-líder do governo na Câmara, o deputado Giovani Cherini (PL-RS) entende que o problema dos salários acima do teto constitucional só se agrava com a demora na votação da proposta. Ressaltando que não externava a posição do governo, mas a própria opinião, Cherini diz que é contraditório votar uma reforma administrativa e a criação de imposto, como se cogita, sem combater os supersalários.
“Não sei qual a posição do governo em relação a isso. Sei que tem muitas tranqueiras dentro da Câmara para não votar esse projeto, que está há muito tempo dormindo em berço esplendido. Não sei se é medo ou compromisso. Não consigo identificar o motivo de não ser votado. Enquanto isso, os penduricalhos aumentam cada vez mais, os valores são astronômicos. Isso é muito maior que um bolsa coronavírus”, afirmou o parlamentar gaúcho ao Congresso em Foco Premium.
O projeto de lei regulamenta o teto salarial no serviço público e acaba com os penduricalhos – auxílios atrelados ao exercício da função, que turbinam o contracheque de servidores.
A proposta enfrenta resistência, sobretudo, de magistrados e de integrantes do Ministério Público, categorias que estão entre as que mais recebem acima do teto salarial do funcionalismo, com a incorporação dos chamados penduricalhos, e que não terão direitos reduzidos com a reforma administrativa.
“Existe muito comprometimento. Tem os amigos, os amigos dos amigos. Uma coisa é o que é ilegal, outra é o que é imoral. São legais os penduricalhos? Eles foram criados à revelia da lei. As categorias formam corporações que foram criando essas mordomias. O raio-x tem de bater. Se não bater, vai vir CPMF, imposto disso e daquilo. Precisamos enfrentar a despesa para poder tratar da receita”, diz o vice-líder do governo.
O uso de recursos economizados com o fim dos supersalários foi uma das alternativas levantadas por parlamentares durante jantar com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o ministro da Economia, Paulo Guedes, na residência do ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União (TCU) na segunda-feira (5).
O relator da proposta que cria o novo programa, batizado até o momento de Renda Cidadã, senador Márcio Bittar (MDB-AC), adiou desta quarta-feira (6) para a próxima semana a apresentação de seu texto. O adiamento se deve à dificuldade de encontrar receitas que financiem o sucessor do Bolsa Família. A utilização de precatórios e de dinheiro do fundo da educação básica (Fundeb), anunciada inicialmente como fontes de recurso, encontra resistência no Congresso.
Para Rubens Bueno, o lobby do Judiciário e do Ministério Público junto aos parlamentares é o principal motivo para o engavetamento da proposta. “Há um lobby muito grande. Há uma enormidade de associações de promoters e magistrados. Uma vez, quando discutíamos o projeto, nunca vi tanto promotor e juiz em Brasília”, diz o relator da proposta. Entidades representativas das duas categorias alegam que seus salários estão defasados, que os auxílios não são salários e que, portanto, não estão sujeitos ao teto.
O deputado considera o momento ideal para o Congresso acabar com os supersalários. “Vivemos grande dificuldade para votar medidas urgentes por causa da pandemia. Se pegar auxílio emergencial, ajuda para empresas, tivemos votações importantes nesse período.
Rubens diz que o governo deveria ser o primeiro a defender a proposta, devido ao desajuste fiscal gigantesco. “Eliminar abusos e privilégios é o primeiro passo. O segundo é trazer condições para diminuir gastos que ainda existem na legislação brasileira que são criados pelos próprios poderes, em arrepio à Constituição”, defende o ex-líder do Cidadania.
O Congresso em Foco procurou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), mas ele não se manifestou sobre o futuro do projeto. Maia tem defendido que a proposta se limite ao Executivo e ao Legislativo, deixando que o Judiciário faça seu próprio projeto.
“É só colocar para votação que veremos de onde vêm os supersalários. Isso é que nem vespa, mexer na onça na vara curta. Eles virão para cima da gente”, diz Cherini. “Os supersalários estão mascarados dentro do sistema de transparência. Penduricalhos de juízes, promotores e procuradores também é salário. Eles recebem na folha de pagamento”, acrescenta o vice-líder do governo.
>Mentor de processo contra governador de SC é alvo de pedido de impeachment
Deixe um comentário