Nesta segunda-feira (20), a Organização das Nações Unidas (ONU) lançou o sexto relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que monitora desde a década de 1990 a evolução do desequilíbrio climático mundial e seus impactos sobre a humanidade. O relatório registra um desempenho desastroso da comunidade internacional no enfrentamento ao aquecimento global ao longo da última década, e recomenda uma série de medidas emergenciais para mitigar seus efeitos. Para o coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista na Câmara dos Deputados, Nilto Tatto (PT-SP), a tendência é que o Legislativo tenda a cooperar na adesão a medidas de combate à crise climática.
A última versão do relatório foi publicada em 2014, momento em que o IPCC já alertava sobre a importância de cortes drásticos por parte da comunidade internacional em suas emissões de gases ligados ao efeito estufa. O estudo já identificava efeitos do aquecimento global sobre os ciclos climáticos, e apontava para os riscos de intensificação de desastres ambientais caso não fossem adotadas políticas radicais de redução nas emissões de dióxido de carbono (CO²) ao redor do mundo.
Nove anos depois, o novo relatório já demonstra que a humanidade falhou em implementar as medidas recomendadas anteriormente pelo IPCC. “A emissão de gases estufa continuou aumentando, com contribuintes históricos e contínuos crescendo de forma desigual a partir do uso insustentável de energia, das terras, de estilos de vida, de padrões de consumo e de produção entre regiões, países e indivíduos”, relatam os pesquisadores.
O resultado do avanço do aquecimento global já começou a ficar visível, conforme consta no relatório. “A mudança climática antrópica já afeta diversos fenômenos meteorológicos extremos em todas as regiões ao redor do globo. Isso leva a impactos adversos generalizados, com perdas e danos à natureza e às populações”, ressaltam. O Brasil não escapa desses fenômenos: em entrevista ao Congresso em Foco, o cientista Carlos Nobre, que participou de pesquisas anteriores do IPCC, contou que o aumento no número de enchentes no litoral brasileiro é decorrente da crise climática.
Muitos desses danos climáticos provocados pelo aquecimento global já se tornaram irreversíveis, e a tendência é que fenômenos extremos como enchentes e secas se tornem mais frequentes ao longo dos próximos anos, exigindo que países se adaptem para lidar com essas situações. Por outro lado, o IPCC esclarece que esses efeitos podem ser limitados por uma “profunda, rápida, e sustentada redução global de gases de efeito estufa” realizada até o fim da década.
Essa redução, de acordo com o órgão ligado à ONU, requer mudanças multissetoriais intensas em todos os países do mundo, com reformas em seus sistemas de produção energética, construção de políticas de combate à desigualdade social, intensificação de regulações ambientais, investimentos massivos em tecnologia, entre outras.
PublicidadeCongresso menos hostil
Para que o Brasil consiga implementar as políticas de enfrentamento à crise climática recomendadas pelo IPCC, será necessária a aprovação de uma série de reformas ambientais no Poder Legislativo. Este, porém, conta com um histórico recente de hostilidade à pauta ambiental: conforme foi constatado por especialistas ao final da última legislatura, os últimos quatro anos foram marcados por retrocessos no Congresso Nacional na defesa do meio ambiente.
Por outro lado, o coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, Nilto Tatto, considera que o momento de aversão à pauta já está encerrado. “Mesmo tendo um Congresso muito parecido com a legislatura anterior, a maioria dos parlamentares já tomou consciência dos desafios que estão colocados para o Brasil fazer a sua parte no enfrentamento da crise climática”, afirmou.
O deputado também chama atenção para os gestos adotados pelo Poder Executivo ao tratar da gestão ambiental, restabelecendo o orçamento de órgãos de proteção ambiental e implementando grupos dentro dos ministérios para tratar da defesa ambiental. “Isso faz com que o Congresso também venha a discutir de forma positiva o enfrentamento desses desafios”, avalia.
Outro fator que leva Tatto a considerar que a próxima legislatura deva se dispor a abrir espaço para projetos ambientais é a pressão internacional sobre essa pauta. “Há uma pressão da comunidade internacional para que o Brasil volte a adotar políticas de controle das emissões de gases de efeito estufa, colocando em risco inclusive a própria comercialização de produtos brasileiros”, relatou.
Na parte do governo, o deputado aponta que duas medidas deverão ser priorizadas nos próximos meses para lidar com a crise climática: a atualização dos dados referentes às emissões de CO² por parte do Brasil no acordo de Paris e a atualização dos compromissos internacionais brasileiros de controle da poluição.
Resposta a desastres
O relatório deixa claro que desastres ambientais frequentes já são parte da realidade mundial, inclusive do Brasil, cujo litoral se tornou alvo constante de enchentes. Para lidar com esse novo contexto, já existem projetos na Câmara para destinação de recursos para amparar a população de áreas atingidas por desastres ambientais. O principal deles é o Projeto de Lei 294/2022, do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que cria uma reserva orçamentária permanente para situações de calamidade.
O projeto foi proposto em fevereiro de 2022, quando o norte de Minas Gerais e o sul da Bahia foram atingidos por chuvas intensas, provocando alagamentos em diversos municípios. Um ano depois, em meio às enchentes no litoral norte de São Paulo, o texto ganhou evidência novamente. Ainda assim, seu trâmite segue parado, mesmo havendo esforço de seu autor para que seja votado.
No momento, o projeto está sem relator, tramitando na Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional. Seu presidente, Fabio Garcia (União-MT), afirma que não há previsão sobre quando será votado o projeto, mas que não pretende postergar sua apreciação. “Meu compromisso é colocar os projetos para serem votados. Comissão não serve para ficar engavetando projeto”, garantiu.
Sua expectativa é para que, até o final da semana, seja retomada a tramitação do projeto. “Teremos uma reunião essa semana para discutir os diversos projetos que estão sem seus relatores. Nós vamos começar a fazer as indicações para que os projetos possam andar”, contou.