Primeira deputada federal indígena da história de Minas Gerais, a professora Célia Xakriabá (Psol-MG) denunciou ter sofrido racismo quando jantava, com duas assessoras também indígenas, em um restaurante em Ouro Preto (MG) na noite desse sábado (4). Em publicação nas redes sociais e em boletim de ocorrência policial, Célia contou que as três foram alvos de deboche por parte de um grupo de seis clientes do estabelecimento. “Olha como as índias estão agora”, disseram, em tom pejorativo, segundo a deputada. “Me levantei da mesa e disse que os índios de hoje são deputados também. A pessoa, assustada, porque não sabia, falou parabéns”, relatou a parlamentar.
Célia estava acompanhada de Ingrid Sateré Mawé e Werymehe Pataxó. Após reagir à provocação, as três decidiram deixar o restaurante, mas foram convencidas pela proprietária a permanecer no local. De acordo com a deputada, a dona do negócio prestou solidariedade e disse que apoiava a causa indígena e que estava muito feliz em recebê-las. Elas chamaram, então, a polícia para fazer a denúncia. A parlamentar estava na cidade histórica mineira para participar de um movimento contra o racismo.
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É possível acompanhar, em vídeo publicado no Instagram da deputada, o momento em que ela faz a denúncia aos policiais. Veja:
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Em outro vídeo também publicado no Instagram, a deputada e as assessoras destacam a importância de não se calar e denunciar casos de racismo. “É isso que a gente passa. Várias vezes passei por essa situação. Não é uma denúncia individual, mas coletiva. Não podemos mais naturalizar o racismo. Não queremos que isso aconteça com nós nem com ninguém”, ressaltou Célia. Entre os suspeitos, estão uma delegada civil e um perito criminal.
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A parlamentar indígena disse que gostaria de ter sido mais incisiva ao responder aos clientes que as hostilizaram. “Devia ter falado de maneira mais incisiva também, mas isso acaba nos colocando num processo de violência maior”, afirmou. Segundo ela, o grupo que as provocou queria também chamar a polícia, com medo da reação dos demais clientes. “É incrível como os racistas se acham muito corajosos, mas são covardes. Não conseguiram enfrentar três mulheres com sua verdade.”
A deputada conseguiu quase 200 assinaturas para criar a Frente Parlamentar Mista dos Povos Indígenas, da qual será presidente a partir da próxima terça-feira (9), quando será oficialmente criada. Ela venceu queda de braço com parlamentares ligados aos garimpeiros, que também corriam atrás de apoio para criar a bancada. Célia foi eleita com mais de 101 mil votos. Originária da Terra Indígena Xakriabá, no Norte de Minas, a antropóloga representou os povos indígenas na COP-26, participou ativamente da denúncia contra o presidente Jair Bolsonaro por crime contra a humanidade em Haia. Também foi assessora parlamentar da ex-deputada Áurea Carolina (Psol-MG).
Ingrid disse que os acusados relataram à polícia ter se referido a elas em uma conversa com franceses. “Tentaram justificar mais uma vez com mentiras, com falácias, dizendo que aquilo não teria sido racismo, apenas uma apresentação do que eram os indígenas do Brasil, com palavras pejorativas”, contou a assessora. De acordo com ela, funcionários do restaurante relataram que o grupo de clientes se referia a elas com desdém e de maneira preconceituosa. “Abriu feridas que infelizmente nós vamos acumulando em todo esse tempo de luta”, disse.
De acordo com o G1, os suspeitos da agressão verbal são a delegada Andrea Mendes de Souza Abood e o perito criminal Cleber Abood Fernandes, da Polícia Civil (PCMG), Mércia Regina Salomão Meni Abood, Afonso Abood Fernandes, Nerci Gonçalves Pereira e Armando Pereira. O Congresso em Foco não conseguiu contato dos suspeitos. O espaço está aberto para eventuais manifestações.
Segundo Ingrid, houve um fato positivo no episódio: a manifestação por parte do público contra o racismo. “Combateremos racismo não somente por meio das leis, mas também pela sensibilização da sociedade. Nunca mais um Brasil sem nós”, afirmou. A Polícia Civil de Minas Gerais informou que “apura os fatos narrados pela vítima”. Ninguém foi preso.
A Lei 14.532/23, sancionada pelo presidente Lula em 11 de janeiro, durante a cerimônia de posse das ministras Anielle Franco (Igualdade Racial) e Sônia Guajajara (Povos Indígenas), equipara os crimes de injúria racial (cometido contra uma pessoa) com racismo (aquele cometido contra uma coletividade). Aumenta a pena para a injúria relacionada a raça, cor, etnia ou procedência nacional.
Esse tipo de injúria poderá ser punido com reclusão de dois a cinco anos. A pena poderá ser dobrada se o crime for cometido por duas ou mais pessoas. Antes, a punição era de um a três anos. A nova legislação reproduz o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em outubro do ano passado, equiparou a injúria racial ao racismo, tornando-a um crime inafiançável e imprescritível.
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