Em tempo turbulento na relação entre os Poderes da República brasileira, a assinatura de um Pacto pela Transformação Ecológica foi destaque no noticiário da última quarta-feira, dia 21 de agosto de 2024. A união do Executivo, Legislativo e Judiciário em torno de uma agenda de enfrentamento das mudanças climáticas foi apresentada pelo presidente Lula como uma mensagem a ser passada para o mundo de que “o Brasil está preparado para assumir o protagonismo global no enfrentamento da crise climática”.
Diante das ministras Marina Silva e Sônia Guajajara, das pastas do meio ambiente (MMAMC) e dos povos indígenas (MPI), entre outras autoridades, os líderes dos Três Poderes firmaram compromisso onde constam 26 medidas a serem implementadas com o intuito de promover mudanças na economia e na cultura brasileira. Os três eixos do Pacto visam o ordenamento territorial e fundiário (Eixo I), a transição energética (Eixo II) e a promoção de desenvolvimento sustentável com justiça social, ambiental e climática (Eixo III).
No acordo firmado o Executivo se compromete a incentivar financeiramente projetos e práticas sustentáveis, o Judiciário promete respostas mais rápidas às demandas judiciais que tratem de temas ambientais, fundiários e climáticos e ao Legislativo cabe dar prioridade aos projetos de lei, tais como o marco legal do mercado de carbono e projetos para a produção de energia eólica e para os biocombustíveis.
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Esse auspicioso propósito, contudo, deve ser encarado levando em conta não apenas as diferentes finalidades institucionais dos três poderes e a honrosa disposição de cooperar por um objetivo coletivo. É indispensável destacar, também, a natureza política desses entes institucionais e seus posicionamentos recentes a respeito da temática ambiental.
O STF vem tomando decisões alinhadas com a preservação de direitos sócio ambientais consagrados na Constituição de 1988, durante o governo Bolsonaro invalidou diversas iniciativas que visavam “passar a boiada” sobre o regramento ambiental, assim como rejeitou a tese de um marco temporal como parâmetro para a demarcação de terras indígenas, em setembro de 2023.
Direitos das populações tradicionais e preservação ambiental são indissociáveis em uma agenda ambiental séria, ampla e consistente. Entretanto, a decisão do Supremo desagradou as forças políticas dominantes no Congresso e desencadeou reação imediata, originada no Senado, com a retomada da PEC 48/2023, objetivando inserir a tese do marco temporal na Constituição.
PublicidadeDe parte do Executivo atual, o presidente Lula é oposição à política de desmantelamento liderada pelo governo anterior, mas enfrenta a resistência de parte de sua coalizão de governo aos propósitos de uma agenda ambiental ambiciosa. Os Ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas são vistos como indesejáveis para os interesses ruralistas representados no Congresso, especialmente por serem liderados por ativistas sócio ambientais.
Na base de judicializações e resistências a agenda ambiental do governo encontra-se o fortalecimento de uma agenda de desregulamentação e re-regulamentação no Legislativo, com iniciativas para fragilizar a regulação ambiental. O que Arthur Lira (PP-AL) define como “pauta verde do Legislativo”, não inclui direitos à justiça climática para populações tradicionais, nem tampouco a utilização de seu poder de agenda em benefício da manutenção de biomas.
A pauta viável no Congresso atual foi claramente nomeada pelo presidente da Câmara durante a assinatura do Pacto, trata-se de um ambientalismo voltado fundamentalmente para o mercado, centrado na geração de ganhos econômicos para setores da bioeconomia e energias limpas, por exemplo, via incentivos do Estado.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), atua afinado com a defesa dos interesses da mais forte coalizão de defesa de interesses empresariais que atua no Legislativo, a Frente Parlamentar da Agropecuária, poderoso grupo de pressão, formado majoritariamente por parlamentares de partidos de direita e centro direita, que rejeitam os rigores da legislação ambiental.
Ao mesmo tempo que comunidades indígenas recebem propostas para submeter suas terras ao mercado de carbono, a tese do marco temporal e os PLs nº 364/2019 e 3334/2023, que propõem a redução da vegetação nativa protegida legalmente, vicejam na Câmara e no Senado. Tais ameaças aconselham-nos a observar o Pacto pela Transformação Ecológica considerando, que no Legislativo, a FPA e o “centrão” são forças políticas de peso decisivo que desprezam a justiça climática focada no Eixo III do acordo entre os três Poderes.
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