A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado se prepara para a sabatina de Flávio Dino e Paulo Gonet, indicados respectivamente ao Supremo Tribunal Federal (STF) e à Procuradoria Geral da República (PGR), nesta quarta-feira (13). É esperado que ambos sejam questionados acerca de temas espinhosos e polêmicos que fomentam confrontos entre Congresso e Supremo, como legalização do aborto, questão LGBTQIA+, desarmamento, descriminalização das drogas e cotas raciais.
As questões ideológicas, muitas vezes, pautam as principais perguntas nas sabatinas. Primeiro indicado de Lula à Defensoria Pública da União (DPU), Igor Roque, foi rejeitado pelo Senado no final de outubro. Os parlamentares associaram a posição do defensor como pró-aborto em razão de evento da DPU intitulado “Direitos sexuais e reprodutivos da mulher – acesso ao aborto legal e telemedicina”.
Aborto
O ministro da Justiça, Flávio Dino, já se manifestou abertamente contra o aborto. Católico, o ex-governador do Maranhão, disse, em entrevista de 2022 ao jornal Valor Econômico, ser “filosoficamente” contrário à legalização do aborto e defendeu a manutenção das leis atuais.
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“Eu sou filosoficamente, doutrinariamente, contra o aborto, e acho que a legislação brasileira não deve ser mexida nesse aspecto. Por que eu registro minha posição? Porque essa é a prova de que é um tema que não tem consenso nem no nosso campo político. Acho que temas que neste momento desunem devem ser evitados, porque o bolsonarismo precisa da polêmica”, explicou Dino.
Assumidamente mais conservador que seu colega de sabatina, o indicado à PGR, Paulo Gonet, também compartilha da mesma visão. Em artigo de 2008, intitulado “Proteção do Direito à Vida: A questão do aborto”, Gonet defende que o aborto e a interrupção do processo de gestação não correspondem à ordem constitucional brasileira e à defesa do direito à vida.
“As considerações desenvolvidas convencem, antes, que as práticas abortivas – entendidas como toda interrupção voluntária do processo biológico, iniciado com a concepção, de desenvolvimento da pessoa humana ainda não dada à luz – afrontam a Constituição, pondo-se em linha colidente com a tutela que a Carta da República exige que seja conferida à vida humana e à dignidade da pessoa”, escreveu Gonet.
LGBTQIA+
O casamento entre pessoas do mesmo sexo suscitou disputas entre Congresso e STF. O projeto de lei relatado pelo deputado Pastor Eurico (PL-PE) que proíbe a união LGBTQIA+ vai de encontro à decisão do Supremo de 2011, que reconheceu o casamento homoafetivo. Apesar de não se posicionar diretamente contra a proibição, Dino já reforçou a defesa e respeito “ao direito de todos”, e, mais recentemente, afirmou que o pastor André Valadão responderia por “propagar ódio” contra a comunidade LGBTQIA+.
“O suposto cristão que propaga ódio contra pessoas, por vil preconceito, tem no mínimo dois problemas. Primeiro, com Jesus Cristo, que pregou amor, respeito, não violência contra pessoas. ‘Amar ao próximo como a si mesmo’, disse Jesus. Segundo, com as leis, e responderá por isso”, disse Dino em publicação no X (antigo Twitter).
Congresso Nacional é o símbolo maior da democracia. E hoje manifestou respeito aos direitos de todos, no dia internacional do orgulho LGBT. Democracia se fortalece com paz e justiça para todos e todas, como a nossa Constituição Federal determina. pic.twitter.com/yxlIu8Gove
— Flávio Dino 🇧🇷 (@FlavioDino) June 29, 2020
Gonet, por sua vez, já se envolveu em polêmicas no que tange a questão LGBTQIA+. Em 2019, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) pediu ao STF a proibição de práticas terapêuticas que tratam a homossexualidade como um desvio, a famosa “cura gay”. O procurador enviou parecer ao STF se manifestando contra o pedido de proibição do Conselho.
Armas
O ministro da Justiça, Flávio Dino, teve atuação ativa no desarmamento. Logo no primeiro dia do ano, foi emitido o Decreto 11.366, de 2023, que suspendeu os registros para a aquisição e transferência de armas e de munições de uso restrito por caçadores, colecionadores, atiradores e particulares. Em julho, novo decreto (nº 11.615) foi publicado, revogando o anterior.
“Acabou o liberou geral [de armas]”, disse Dino em entrevista coletiva de fevereiro. “O Brasil não é faroeste de filme”.
Sobre os resultados da medida, o indicado ao STF comemorou a nova política de armas no país. “Observamos uma queda substantiva. Alguns números já foram divulgados, mas temos novos números sobre requerimentos de registros de armas em um número consolidado sobre janeiro. Em 2022, houve pedidos de registros de 9.719 armas. Este número, em janeiro de 2023, caiu para 3.888″
Descriminalização das drogas
Ainda em 2022, quando o então governador do Maranhão era apenas cotado para o Ministério da Justiça, Dino afirmou em entrevista à BBC Brasil que não existem condições para descriminalizar drogas e que o fato de a maioria da população ser contra, é algo que deve ser considerado na discussão.
“Eu sou contra as drogas como princípio. Acho que, nesse momento, nem o Supremo conseguiu formar maioria para levar o julgamento adiante. A maioria da sociedade brasileira é contra a chamada descriminalização”, explicou Flávio Dino. “Nós temos que levar isso em conta. Você não faz política pública contra a sociedade. Nós não temos hoje condições sociais e institucionais para descriminalizar drogas e, certamente, isso não vai ocorrer nos próximos anos”.
Cotas raciais
Em artigo de 2002, antes mesmo das cotas raciais serem implementadas pela primeira vez no país, Paulo Gonet se posicionou contrário à política. Para o indicado à PGR, a “discriminação reversa” é uma das modalidades das ações afirmativas. “A discriminação reversa implica selecionar, previamente, uma categoria de pessoas para receber certos bens, que, de outro modo, seriam disputados por uma coletividade mais ampla”, apontou no texto.
“Quando se adota uma política de quotas para favorecer um segmento da população, um certo número das vagas na universidade não estará mais em disputa pelos estudantes que não pertençam àquela parcela da população. Daí se falar em jogo de soma zero – o que é dado a alguém o é porque é retirado de outrem”, escreveu Gonet, em 2002.
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