Em agosto de 2024, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino suspendeu todos os pagamentos de emendas orçamentárias, justificando a medida pela falta de regras que assegurassem maior transparência e rastreabilidade no uso dos recursos. Para a retomada da liberação, o ministro determinou que o Congresso Nacional e o Poder Executivo estabelecessem, em conjunto, normas capazes de corrigir tais deficiências.
O imbróglio para se chegar em um acordo levou meses. Na última semana de novembro, após longo debate, o projeto de lei complementar aprovado pelo Congresso para sanar o impasse com o Poder Judiciário sobre o pagamento de emendas parlamentares virou lei (Lei Complementar 210/24). Pelas novas normas, as chamadas “Emendas Pix” ganharam mais transparência. Nessa modalidade, deputados e senadores deverão informar o objeto e o valor da transferência quando da indicação do ente beneficiado (estado, DF ou município), com destinação preferencial para obras inacabadas propostas por ele anteriormente.
Leia também
Além disso, também ficou definido que os recursos da União repassados aos demais entes por meio de transferências especiais estarão sujeitos à apreciação do Tribunal de Contas da União (TCU). Estados ou municípios em situação de calamidade ou de emergência reconhecida pelo Poder Executivo federal terão prioridade na execução das transferências especiais.
As emendas de comissão também passaram a ter novas regras. Tais emendas ao serem apresentadas pelas comissões permanentes do Senado e da Câmara, terão de ser observadas suas competências regimentais para ações orçamentárias de interesse nacional ou regional. Além disso, pela nova diretriz, tais emendas deverão identificar de forma precisa o seu objeto, sendo vedada a designação genérica de programação que possa contemplar ações orçamentárias distintas. Assim como as emendas individuais orçamentárias, pelo menos 50% das emendas de comissões serão destinadas a ações e serviços públicos de saúde, a partir de orientações e critérios técnicos indicados pelo gestor federal do Sistema Único de Saúde (SUS).
O ponto de maior divergência e conflito, no entanto, foi quanto aos limites de crescimento das despesas destinadas para as emendas orçamentárias. A partir de 2026, o limite para as emendas individuais e de bancadas estaduais deve seguir as regras do Novo Arcabouço Fiscal. Assim, será feita a correção das despesas públicas pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do ano anterior, mais um aumento equivalente a 70% ou 50% do crescimento real da receita primária de dois anos antes. Já para as emendas de comissão, que não estão entre as de execução obrigatória, o limite-base é o valor global do ano anterior, acrescido da variação do IPCA nos últimos 12 meses, encerrados em junho do ano anterior àquele a que se refere o Orçamento votado.
Quando todos nós achávamos que a novela das emendas tinha terminado, o STF, novamente com o ministro Flávio Dino, só autorizou o repasse de verbas com o cumprimento de novas regras: (i) Emendas Pix só podem ser liberadas com a apresentação de plano de trabalho prévio. Emendas anteriores a 2025 terão o prazo de 60 dias para sanar a ausência de plano de trabalho. (ii) As Emendas de Relator (RP 9) e as Emendas de Comissão só poderão ser liberadas com a devida identificação dos parlamentares. Cabe ao Poder Executivo fiscalizar o cumprimento da regra. (iii) As Emendas de bancada não poderão ser individualizadas e haverá auditoria em 2025 para acompanhar o processo. (iv) As Emendas para ONGs só poderão ser liberadas com a publicação em site. Caso não haja, não pode haver liberação nem das antigas, nem das futuras. E (v) as emendas Emenda para saúde precisam de indicações técnicas do gestor federal, além de aprovação nas comissões bipartite e tripartite do SUS.
Parlamentares reagiram negativamente a essas decisões, sobretudo pela condição e obrigatoriedade de o governo só realizar o pagamentos das emendas de 2024 e de anos anteriores mediante a adequação às novas regras. Em reação a ofensiva do STF, o Congresso Nacional sinalizou para o Poder Executivo que colocaria obstáculos para a votação e aprovação do pacote de cortes de gastos enviado pelo governo na primeira semana de dezembro.
Em mais um episódio, onde esperamos ser esse o fim da novela, o governo federal editou nesta semana mais uma portaria com o detalhamento das regras para destravar o pagamento das emendas parlamentares deste ano. A portaria estabelece que as transferências especiais, conhecidas como emendas PIX, empenhadas em 2024 poderão ser pagas agora, mesmo que o plano de trabalho ainda não tenha sido aprovado.
A questão que fica, no entanto, é se o desfecho final dessa novela terá ou não um final feliz. Será que a partir de 2025 o Congresso Nacional seguirá as novas normas para garantir a maior transparência do uso desses recursos? E a Controladoria Geral da União, junto ao Tribunal de Contas terá forças para fiscalizar o cumprimento dessas regras? Novas regras para atender às demandas da negociação da pauta legislativa entre Executivo e Legislativo serão colocadas em jogo? E, por fim, a quem e como essas novas regras trazem benefícios?
Essas são cenas dos próximos episódios de 2025 que já conta com outros capítulos, outros atores e ainda mais demandas à vista.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br