Em 26 de setembro de 2009, dois anos após ter sido proposto, foi assinado por Argentina, Bolívia, Equador, Paraguai, Uruguai e Venezuela o convênio constitutivo do Banco do Sul, instituição fundamental para o desenvolvimento e a integração da América do Sul e, em particular, do Mercosul.
O convênio define-o como uma entidade financeira autossustentável, autônoma e de desenvolvimento da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), com o objetivo, dentre outros, de promoção do desenvolvimento econômico, social e ambiental de seus países membros.
Estabelece ainda que será, essencialmente, um banco de desenvolvimento, destinado a financiar projetos econômicos, sociais e ambientais, no âmbito territorial da Unasul.
Mesmo tendo passado mais de dois anos da assinatura e de já ter sido ratificado por Venezuela, Bolívia, Equador, Uruguai e Argentina – faltam Brasil e Paraguai –, é mais que necessário salientar que se trata de um banco de desenvolvimento. Mesmo sem ler o texto do convênio, alguns continuam críticos como eram em 2007, quando os presidentes Hugo Chávez, da Venezuela, e Néstor Kirchner, da Argentina, propuseram a criação do Banco do Sul. Outros leram, por isso devem ser respeitados ideologicamente, porém continuam contra e o são porque são contrários à integração.
Na ocasião do lançamento da proposta, basicamente, a crítica tinha duas vertentes: uma dos conservadores e contrários ao processo integracionista, que permanece até hoje. Alegavam que o Brasil tem instrumentos, sendo um deles o BNDES, de financiamento do desenvolvimento e que isso dá conta de nossas necessidades. Alegavam também que o Banco do Sul poderia ter um viés político.
A segunda vertente, que às vezes se mesclava com a primeira, era daqueles que acreditavam que tal banco se converteria numa espécie de sucedâneo do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (Bird) para a região, e que também seria administrado sem critérios técnicos consistentes e, principalmente, ao sabor de conveniências políticas de ocasião. Erraram feio.
A leitura atenta do texto, que fiz por ser o relator da matéria no Congresso Nacional, dá a clara percepção de que a proposta do Banco do Sul tem consistência técnica, e que a entidade financeira a ser criada reunirá condições para funcionar efetivamente a serviço do desenvolvimento e da integração da América do Sul.
Além do mais, foram tomados todos os cuidados para que o Banco do Sul seja autossustentável e administrado de forma profissional. O convênio constitutivo também deixa clara a natureza essencial do Banco do Sul é a de uma entidade financeira destinada a desempenhar funções típicas de um banco de desenvolvimento.
A cláusula contida no artigo 2º do convênio define que o objetivo do Banco do Sul é financiar o desenvolvimento econômico, social e ambiental dos “países membros”, de forma equilibrada e estável, fazendo uso da poupança intra e extrarregional; fortalecer a integração; reduzir as assimetrias, e promover a distribuição equitativa dos investimentos entre os países membros.
Sem entrar em estatísticas ou em qualquer estudo sobre a região, todos os que conhecem a América do Sul sabem do déficit de infraestrutura da região. Portanto, sabem que um banco com estas características é bem-vindo.
A integração depende de moedas regionais, se não em circulação, pelo menos nas relações comerciais, e é isto que garante o artigo 3º do convênio. Este artigo abre a possibilidade de o Banco do Sul contribuir para o desenvolvimento de um sistema monetário regional, instrumento necessário para o processo de integração da América do Sul.
E é justamente à integração que setores conservadores, ainda enamorados da velha política externa brasileira, baseada na dependência dos grandes centros (EUA e União Europeia), se opõem.
Sabem eles e nós que processos de integração tendem a conformar mecanismos financeiros para facilitar o comércio regional. Lembro, por ser oportuno, que no âmbito das relações bilaterais entre Brasil e Argentina já foi implementado mecanismo para o comércio regional.
Trata-se do Sistema de Pagamentos em Moeda Local (SML), que começou a funcionar em outubro de 2008. Entre aquela data e março de 2011, foi comercializado o equivalente a US$ 882 milhões com esse sistema. Com isso, ganham a integração, os países e o comércio local. Perdem os EUA (o dólar é a moeda de troca em mais de 80% do comércio mundial) e, em menor medida, a União Europeia (o euro é o responsável pelo 20% restante).
EUA e UE podem inundar o mercado mundial com suas moedas, retirando competitividade das exportações para o mercado norte-americano e europeu, aumentando artificialmente a competitividade dos produtos Made in USA e Made in Europe. Situação essa agravada com a crise econômica.
A adoção de uma moeda comum pelo Mercosul e pela Unasul ajudaria a combater a hegemonia do dólar e do euro, e seu uso como instrumento protecionista no comércio internacional. Ademais, a sua adoção tenderia a dinamizar e aumentar o comércio entre os países propositores.
Antes que os detratores da integração caiam de pau, esclareço: as moedas seriam apenas usadas nas transações comerciais entre os países. Uma verdadeira moeda comum demandaria a complexa e difícil harmonização das políticas macroeconômicas, o que ainda não está, obviamente, no cenário da Unasul.
Sobre um possível uso do Banco do Sul como “emprestador de última instância” para socorrer países em dificuldades econômicas, como faz o FMI, não há no texto do convênio constitutivo nenhuma menção explícita a essa função tão especulada anos atrás.
O Banco do Sul cumprirá a tarefa primordial de ser uma fonte adicional de crédito, em complemento às instituições existentes, além de ser um instrumento fundamental para a consolidação da Unasul e para consecução dos objetivos comuns aos países da região. Enfim, um banco para desenvolver e integrar a América do Sul.
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