Antonio Vital
|
Brasília vai completar 45 anos no dia 21 de abril e ainda não foi compreendida por grande parte dos brasileiros, para quem a capital do país virou símbolo de tudo de ruim que nossos homens públicos representam. No imaginário de muita gente, ainda vigora a mesma propaganda negativa udenista de meio século atrás. Até as imagens são iguais: “Brasília é um desperdício de dinheiro”, “Brasília é um antro de corrupção”, “Brasília é uma ilha da fantasia”. Brasília, na verdade, é o ápice do que produziu até agora a civilização brasileira, se é que existe algo assim. Para o bem e para o mal. Brasília é resultado da união de talentos brasileiros extraordinários – ainda que Lucio Costa e o mentor espiritual dele e de Oscar Niemeyer, Le Corbusier, tenham nascido na França. A cidade também é resultado de um fabuloso trabalho de equipe, liderado por Juscelino Kubitschek e Israel Pinheiro. É ainda produto de um gigantesco esforço coletivo de brasileiros vindos de todas as partes para erguer a sede da nação onde não havia mais que cerrado, gado magro e gente desnutrida e doente. Publicidade
Rasgar a cruz de Lucio Costa no meio do mato e levantar ali arranha-céus em apenas três anos foi uma empreitada digna de figurar nos anais da humanidade. Embasar tudo isso em conceitos humanistas até hoje modernos, em que a qualidade de vida se sobrepõe aos interesses mercantilistas ou meramente administrativos, é de causar inveja a qualquer país do mundo. Publicidade
Pessoas fantásticas juntaram poesia e cimento e fizeram uma cidade. Conseguiram assim integrar o país, diminuir as distâncias entre as capitais, levar desenvolvimento para o interior e provaram a si mesmas que até os sonhos aparentemente mais malucos podem virar realidade. Na mesma época, Nelson Rodrigues, do Rio de Janeiro, escreveu que a conquista da Copa de 58, na Suécia, acabou com nosso complexo de vira-latas. Mas era a 1.200 km dali, no Planalto Central, que ocorria a verdadeira mutação do vira-latas em desbravador entusiasta do próprio futuro. Só que isso foi há 45 anos. O tempo fez baixar sobre a cidade a poeira de outras características brasileiras. A cidade inchou mais do que devia por causa de uma política eleitoreira de doação de lotes. Áreas públicas e de proteção ambiental foram destruídas por invasores de classe média, sob as barbas do poder público, em decorrência da mesma lógica eleitoreira. O interesse mercantilista golpeou o conceito do Plano Piloto de Lucio Costa, com seus jardins e áreas verdes. A especulação imobiliária arrombou o que devia ser preservado. A solidariedade e o entusiasmo dos primeiros tempos deu lugar a um individualismo carreirista de corporações as mais diversas. E nossos políticos não melhoraram em nada. Continuam com os mesmos vícios do tempo do Palácio do Catete – o que não contribui em nada para a imagem da cidade. PublicidadeEnfim, Brasília já exibe as marcas do tempo e, também por causa disso, é a síntese do Brasil. |
Deixe um comentário