“A psiquiatra Ana Beatriz Barbosa, conhecida por sua série de livros de divulgação sobre doenças mentais, lançou-se em uma campanha pela não-reeleição de políticos. Para a médica, não reeleger ninguém é a forma de ‘ajudar a limpar as instituições políticas'”. (https://goo.gl/qUgt5p). A proposição em questão ganha adeptos de forma crescente e forte disseminação nas redes sociais.
A proposta, em que pese ser bem-intencionada, padece de três graves defeitos. O primeiro deles consiste em formular uma solução simples (ou simplista) para um problema de alta complexidade. O segundo defeito envolve um profundo equívoco de análise e sugestão de atuação política. A última dificuldade reside na promoção de uma profunda injustiça para com trajetórias políticas éticas e fortemente comprometidas com os mais relevantes interesses populares e democráticos.
A solução é simplista porque não resolve o problema de fundo da representação política. A simples escolha de “caras novas”, de candidatos que jamais exerceram mandatos eletivos, não garante ou indica uma melhora no triste quadro dos políticos eleitos. Considere, a título de ilustração, a seguinte situação. Um velho cacique político, eleito e reeleito com base na pura e simples compra de votos, ícone do fisiologismo mais rasteiro, resolve deixar as campanhas eleitorais e lançar o filho, jejuno nas pendengas nessa seara, como candidato. Júnior é uma “cara nova” como candidato, mas também um novo representante do que existe de pior em termos de atuação política. O novo, por si só, não resolve nada.
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O equívoco de análise da cena política é enorme. Afinal, para avaliar um candidato ou mesmo alguém no exercício de um mandato eletivo é preciso confrontar o personagem com uma série de parâmetros, exigentes parâmetros, relacionados com a delicada missão de representar interesses de terceiros. Costumo utilizar a seguinte situação hipotética para realçar a importância dos critérios de escolha dos representantes. Imagine a necessidade de alguém receber a quantia de R$ 5 milhões e a impossibilidade, em função de uma viagem inadiável, de comparecer pessoalmente ao ato de recebimento da “bolada”.
A solução para a dificuldade reside na constituição de um procurador (representante) para receber o numerário em nome do beneficiário e, ato contínuo, repassá-lo ao seu legítimo destinatário. Pergunta-se: alguém, no seu juízo perfeito, escolherá o representante (procurador) sem atenção para critérios rigorosíssimos, notadamente de ordem ética? Afinal, o risco de perder de vista o procurador mal escolhido e o dinheiro é enorme. Emendo com outra pergunta: por que a escolha de representantes políticos (para lidar com interesses trilionários) não exige rigores iguais ou maiores do que aqueles do beneficiário da “bolada” de 5 milhões de reais? A pura e simples proposta de não reeleger ninguém desconsidera a necessária atenção para os rigorosos critérios a serem manejados para a escolha de um bom (ótimo ou excelente) candidato.
A injustiça envolvida na proposta também é grande. Embora minoritários, temos parlamentares que honram a representação política com uma atuação pautada pelos mais rigorosos valores éticos e uma intransigente defesa dos mais relevantes interesses democráticos e populares. Com esse perfil, listo, entre outros, três deputados federais: Chico Alencar (Psol), Alessandro Molon (Rede) e Tadeu Alencar (PSB). Não votar nessas combativas figuras do parlamento em nome da “limpeza” das instituições é um monumental equívoco. Afinal, esses mandatos parlamentares estão visceralmente comprometidos justamente com a máxima lisura do funcionamento das instituições.
Assim, é fundamental indicar os aspectos ou critérios a serem considerados na escolha de candidatos nos pleitos eleitorais. Os principais e mais importantes são os seguintes, a serem identificados em alguém que nunca exerceu um mandato ou em alguém que já exerce um mandato eletivo:
a) defesa dos mais relevantes interesses democráticos e populares. Com efeito, as mais significativas mazelas socioeconômicas não são obras do acaso, defeitos de funcionamento da sociedade ou meros resultados da corrupção. Leis, decisões de governo e a formatação de políticas públicas realizam, nas situações mais importantes, os interesses de determinados segmentos sociais em detrimento de outros. Na minha visão, o vínculo com segmentos populares (trabalhadores, estudantes, aposentados, artistas, intelectuais progressistas, etc.) e a consequente representação de seus interesses socioeconômicos é o aspecto mais importante para a definição de voto nos pleitos eleitorais institucionais;
b) as propostas defendidas pelo candidato para os mais relevantes temas em debate na sociedade indicam, com razoável precisão, como se dá a inserção do mesmo no complexo jogo de interesses socioeconômicos (como destacado no item anterior). Vejamos alguns exemplos emblemáticos. Como se posiciona em relação: a) a um teto de gastos públicos seletivo (aplicável às despesas relacionadas com direitos e políticas sociais e não aplicável às despesas financeiras com a dívida pública); b) a uma política tributária recheada de benefícios fiscais para setores privilegiados e com forte e majoritária pressão fiscal sobre o consumo e os rendimentos decorrentes do trabalho e c) aos vários e relevantíssimos aspectos das políticas monetárias, creditícias e cambiais que viabilizam a transferência de bilhões de reais para segmentos minoritários da população e são convenientemente esquecidos pela grande imprensa e pelas autoridades governamentais;
c) uma trajetória ética definida pela distância de escândalos de corrupção e condenações penais ou por improbidade administrativa. Nessa seara, a experiência profissional e de vida devem ser consideradas com especial cuidado, inclusive quanto aos vínculos de defesa de interesses no complexo tecido socioeconômico;
d) um mínimo de conhecimento técnico do funcionamento das instituições, das políticas públicas e da gestão econômico-financeira, incluída a tributação. Com efeito, um mandato parlamentar ou executivo envolve uma quantidade significativa de decisões na área dos negócios públicos. As várias assessorias institucionais são extremamente relevantes, mas não substituem (ou não devem substituir) a compreensão mínima das matérias pelo mandatário;
e) como pretende exercer o mandato, notadamente quanto aos mecanismos de consulta e audiência dos eleitores, dos segmentos sociais e movimentos organizados em entidades ou não. Nesse campo, as experiências de constituição de conselhos políticos de acompanhamento do mandato são extremamente interessantes.
Ademais, o centro de gravidade da política não está (ou não deve estar) no eleito ou mesmo no voto (pura e simplesmente). As grandes e profundas transformações requeridas pela realidade brasileira, sobretudo para enfrentar as gigantescas desigualdades socioeconômicas, passam necessariamente por um processo consistente e duradouro de mobilização e conscientização populares.
>> Fim do político profissional ou políticos mais profissionais?
Não reelejer e nem elejer. Pois mesmo que Cristo resolvesse governar o Brasil, teríamos que perguntar por qual partido? O maior problema são as estruturas na Gestão Pública, indicação política no setor público; foro privilegiado; salários e cargos vitalícios (mesmo que cometam crimes); supersalários e auxílios mil aos membros dos Executivos, Legislativos e Judiciário; impunidade parlamentar; falta de representatividade e mecanismos que alijem o política do cargo. Agora hipoteticamente Cristo ganha as eleições, a estrutura mudará?
Não basta eleger um “novo” político. Tem que ver se ele tem ou não relação com algum político que esteja atuando. Se for parente, não vote.
É preciso pesquisar quem é este “novo” pretendente a um cargo político.