É preciso colocar alguns pingos nos is. Sob pena de não atendermos um dos maiores clamores das ruas: menos mentira, mais verdade, menos cinismo e hipocrisia, mais autenticidade e coerência.
Há tempos a reforma política é apontada como uma necessidade para o aprimoramento da democracia brasileira. Nosso sistema não aproxima as pessoas da representação política, impõe campanhas caríssimas que abrem as portas para relações incestuosas entre financiadores e financiados, fragiliza os partidos, dificulta a governabilidade.
Vamos falar a verdade. O novo Congresso, eleito em 2010, tentou abordar o desafio. O Senado fez uma comissão especial, que trabalhou célere com discussões e votações sumárias e em 60 dias apresentou um projeto. A própria Comissão de Constituição e Justiça do Senado desfigurou a proposta, tornando-a inconsistente e contraditória, e ela sequer chegou ao Plenário. A Câmara dos Deputados adotou postura diversa, instalando outra comissão especial, onde trabalhamos por quase dois anos, realizando discussões profundas e patrocinando dezenas de audiências públicas. A votação do relatório também foi obstruída na fase final dos trabalhos e não chegou ao Plenário. Em fins de 2012, o então presidente Marco Maia (PT/RS) chegou a agendá-la, mas a persistência de graves divergências e a votação da partilha dos royalties do petróleo arquivaram o texto de forma que parecia definitiva.
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O tema é complexo e polêmico. Mexe com interesses estabelecidos. E uma profunda reforma só seria possível se a Presidência da República desempenhasse seu papel de articuladora e construtora de consensos. Mas a gerente Dilma não compreendeu que a Presidência é lugar para estadistas e líderes políticos da nação. A única contribuição de sua parte foi um parágrafo no discurso de posse. Depois, um eloquente silêncio e uma completa inércia.
Diante da explosão de cidadania e indignação nas ruas, a presidente tentou ressuscitar a reforma política como panaceia para os problemas brasileiros. Hipocrisia? Diversionismo? Alienação? Oportunismo? Façam suas apostas.
A ideia do plebiscito para a convocação de uma Constituinte exclusiva era alicerçada em convicções tão sólidas, que não resistiu 24 horas. Foi substituída por um plebiscito amplo e difuso sobre o conjunto de temas envolvidos na reforma política. Tal qual a mitológica Fênix, a reforma ressurgiria das cinzas como resposta mágica e ilusória às demandas da sociedade.
O TSE apontou que precisa de 70 dias para organizar o plebiscito. A Constituição impõe que mudanças só valem se introduzidas um ano antes das eleições. A OAB adverte que matérias constitucionais não podem ser objeto de plebiscito.
Para Dilma, a reforma política foi recolocada como válvula de escape. Para a sociedade é uma necessidade, embora não haja percepção clara disso. Ao Congresso resta o desafio: produzir em 90 dias o que em anos e anos não foi possível concretizar.
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