No próximo dia 5 de dezembro, vamos comemorar o centenário de nascimento de Carlos Marighella. Nessa data, a Comissão de Anistia estará na Bahia, para a realização de uma sessão simbólica no Teatro Vila Velha, em que, em nome do Estado, será feito o pedido de desculpa formal aos familiares do homenageado.
O evento reforçará a campanha pela construção do Memorial Marighellavive, na Bahia, lançada no início deste mês numa homenagem, promovida por familiares, ex-companheiros, com apoio da Comissão de Anistia e do Grupo Tortura Nunca Mais/BA, e que reuniu personalidades políticas, intelectuais, artistas e representantes de entidades e movimentos sociais.
Esses acontecimentos se revestem de grande relevância porque esclarecem fatos e circunstâncias que contribuem para que a história seja recontada como realmente aconteceu, e é isso o que todos nós queremos.
Nascido em Salvador, em 05 de dezembro de 1911, filho de imigrante italiano com uma negra descendente dos haussás, Marighella, ainda adolescente, já questionava criticamente o capitalismo, sistema que ele identificava como responsável pelas desigualdades, injustiças e demais mazelas sociais. Daí o seu despertar para o engajamento nas lutas sociais, dando início a uma trajetória revolucionária que não teria retorno. Muitos anos depois escreveria: “Como homem do povo, escolhi cedo o caminho, que só podia ser o da luta pela liberdade”.
Em 1929, aos 18 anos, inicia o curso de engenharia civil na antiga Escola Politécnica da Bahia e, em 1932, ingressa na Juventude Comunista. Neste ano, participa de manifestações contra o regime autoritário implantado pela Revolução de 1930, escreve e divulga um poema ridicularizando o interventor da Bahia, Juracy Magalhães. Em consequência, pela primeira vez, é preso e espancado, por determinação expressa do interventor.
Em 1936, abanda o curso de engenharia e muda-se para São Paulo por exigência da direção do PCB, com a tarefa de reorganizar o partido, que havia sido duramente reprimido após o fracasso da chamada Intentona Comunista de 1935. No dia 1º de maio de 1936, é preso pela segunda vez e durante 23 dias brutalmente torturado, permanecendo encarcerado por um ano sem que houvesse qualquer condenação formal contra ele.
Libertado em 1937, pela anistia assinada pelo ministro Macedo Soares, quatro meses depois volta a atuar na clandestinidade devido ao golpe de Getúlio Vargas que instaura o Estado Novo. Até 1939, quando mais uma vez é preso e torturado, dedica-se à reestruturação do partido e ao combate à ditadura Vargas. Nos seis anos seguintes, Marighella é encarcerado nos presídios de Fernando de Noronha e Ilha Grande.
PublicidadeAnistiado em abril de 1945, participa ativamente do processo de redemocratização do país. Com a deposição de Getúlio, são convocadas eleições gerais, o PCB é legalizado e ele é eleito deputado federal constituinte, com expressiva votação, pelo estado da Bahia. Na Câmara dos Deputados, tem uma atuação marcante, despontando como um dos mais combativos parlamentares daquela legislatura.
Em menos de dois anos proferiu cerca de duzentos discursos, quase sempre em defesa da soberania nacional, das causas operárias e de denúncias das péssimas condições de trabalho e aviltantes salários a que eram submetidos os trabalhadores brasileiros, enfatizando o regime de exploração e a desumana carga horária que havia em alguns setores, a exemplo das mulheres da indústria fumageira do Recôncavo Baiano, que eram obrigadas a uma jornada de trabalho de até quinze horas, inclusive aos domingos e feriados.
Em decorrência da anulação do registro do PCB, em 1947, e da cassação dos mandatos dos deputados comunistas no início de 1948, só resta a Marighella o retorno à clandestinidade. Na década de 1950, participa das campanhas populares em defesa do monopólio estatal do petróleo, contra o envio de soldados brasileiros à Coréia, organiza a greve geral “dos cem mil”, em 1953, e visita a China Popular e a União Soviética. É, também, nesse período, que dá início, com a publicação de “Alguns aspectos da renda da terra no Brasil”, a uma série de ensaios sobre a questão agrária brasileira.
Com a eleição e posse de Juscelino Kubitschek, em 1956, o país experimenta um período de estabilidade política somente interrompido pelas revoltas militares de Jacareacanga e Aragarças, o que possibilitou ao PCB atuar sem ser reprimido. Sucedendo Juscelino, assume Jânio Quadros a Presidência da República. Sete meses depois, Jânio renuncia e provoca a maior crise político-militar do período republicano. Contra a vontade dos militares, o vice-presidente João Goulart toma posse. Em 31 de março de 1964, é deflagrado o golpe militar que instala um regime autoritário que se prolongaria por mais de vinte anos, (1964-1985).
Imediatamente após o golpe, foi desencadeada uma brutal repressão contra grupos e organizações controladas pelas esquerdas, a exemplo do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), da União Nacional dos Estudantes (UNE), das Ligas Camponesas e grupos católicos como a Juventude Universitária Católica (JUC), e a Ação Popular (AP). Milhares de pessoas são presas ilegalmente e a tortura começa a ser aplicada aos prisioneiros políticos.
Entre 1965 e 1966, Marighella escreve e publica os livros Por que resisti à prisão e A Crise Brasileira. Neste último, analisa criticamente a posição do PCB frente à ditadura e defende a opção pela luta armada, baseada na aliança operário-camponesa.
Ignorando a orientação do PCB, em 1967 Marighella viaja a Cuba para participar da Conferência da Organização Latino-Americana de Solidariedade (OLAS). Via telegrama, o partido desautoriza sua participação e o ameaça de expulsão. Marighella envia carta ao Comitê Central rompendo com o PCB e declarando que ninguém precisa pedir licença para praticar atos revolucionários. Retorna ao Brasil e funda a Aliança Libertadora Nacional (ALN). Outros militantes do PCB abandonam o partido e aderem à proposta de Marighella. Inicia-se, então, a luta armada contra a ditadura.
Capturar Marighella, vivo ou morto, torna-se, então, uma questão de máxima prioridade para o regime militar. Mais ainda, torna-se uma questão de “honra”. Cartazes de “Procurados” foram espalhados por todo o Brasil e sua perseguição envolveu toda a estrutura dos órgãos de repressão, até seu assassinato em 04 de novembro de 1969, na Alameda Casa Branca, na capital paulista.
Com o advento da Lei de Anistia em 1979, 10 anos depois, os restos mortais de Marighella são levados para Salvador e sepultados em um túmulo projetado por Oscar Niemeyer. Neste ato, uma comovente mensagem de Jorge Amado, também integrante da bancada comunista de 1946, é lida para uma multidão de baianos presentes ao cemitério:
“Saravá, Carlos! Chegas de longa caminhada a este teu chão natal, território de tua infância e adolescência. Vens de um silêncio de dez anos, de um tempo vazio, quando houve espaço e eco apenas para a mentira e a negação. Quando te vestiram de lama e sangue, quando pretenderam te marcar com o estigma da infâmia, quando pretenderam enterrar na maldição tua memória e teu nome. Para que jamais se soubesse da verdade de tua gesta, da grandeza de tua saga, do humanismo que comandou tua vida e tua morte. Trancaram as portas e as janelas para que ninguém percebesse tua sombra erguida, nem ouvisse tua voz, teu grito de protesto.
Para que não frutificasses, não pudesses ser alento e esperança. Escreveram a história pelo avesso para que ninguém soubesse que eras pão e não erva daninha, que eras vozerio de reivindicações e não pragas, que eras poeta do povo e não algoz. Cobriram-te de infâmia para que tua presença se apagasse para sempre, nunca mais fosse lembrada, desfeita em lama.
Esquartejaram tua memória, salgaram teu nome em praça pública, foste proibido em teu país e entre os teus. Dez anos inteiros, ferozes, de calúnia e ódio, na tentativa de extinguir tua verdade, para que ninguém pudesse te enxergar. De nada adiantou tanta vileza, não passou de tentativa vã e malograda, pois aqui estás inteiro e límpido.
Atravessaste a interminável noite da mentira e do medo, da desrazão e da infâmia, e desembarcas na aurora da Bahia, trazido por mãos de amor e de amizade. Aqui estás e todos te reconhecem como foste e serás para sempre: incorruptível brasileiro, um moço baiano de riso jovial e coração ardente. Aqui estás entre teus amigos e entre os que são tua carne e teu sangue.
Vieram te receber e conversar contigo, ouvir tua voz e sentir teu coração. Tua luta foi contra a fome e a miséria, sonhavas com a fartura e a alegria, amavas a vida, o ser humano, a liberdade. Aqui, estás plantado em teu chão e frutificarás. Não tiveste tempo para ter medo, venceste o tempo do medo e do desespero. Antonio de Castro Alves, teu irmão de sonho, te adivinhou num verso: “Era o porvir em frente do passado”. Estás em tua casa, Carlos; tua memória restaurada, límpida e pura, feita de verdade e amor. Aqui chegaste pela mão do povo. Mais vivo que nunca, Carlos.” – Jorge Amado, 10 de dezembro de 1979.
Atualmente, cresce no Brasil um amplo movimento de reconhecimento histórico, que atribui a Marighella papel importante para a redemocratização do país. Nessa conjuntura foi recentemente lançada a campanha PRO-MEMORIAL MARIGHELLAVIVE que pretende levantar recursos para construir em Salvador um memorial dedicado à difusão do seu pensamento político.
Por tudo isso, celebrar a memória de Carlos Marighella, nestes quarenta anos que nos separam da sua covarde execução, é reafirmar o compromisso com a marcha do Brasil e da nuestra America rumo à realização da nossa vocação histórica para a liberdade, para a igualdade social e para a solidariedade entre os povos. Celebrando a memória de Carlos Marighella, abrimos o diálogo com as novas gerações garantindo-lhes o resgate da verdade histórica. Reverenciando seu nome e sua luta, afirmamos nosso desejo de que nunca mais a violência dos opressores possa se realimentar da impunidade. Carlos Marighella está vivo na nossa memória e nas nossas lutas.
Esse Biriguella foi um terrorista desgraçado, é autor do manual de guerrilha urbana, métodos utilizados por gangues como o PCC. e não é o partido comunista chinês.