Fiquei tocado com uma entrevista publicada com o presidente da montadora JAC Motors, Sérgio Habib. Segundo ele, o governo precisa fazer alguma coisa para garantir que o mercado de automóveis cresça mais do que 3% neste ano. (Crescer só o mesmo que o IBGE prevê para o PIB brasileiro é muito pouco, tadinha da indústria.) Para Habib, é urgente que o governo baixe os impostos dos carros para eles ficarem mais baratos e os brasileiros possam realizar seu sonho motorizado.
Que os impostos pesam no bolso de quem produz é verdade mesmo. Mas também pesam no bolso de quem produz pão, revistas, computadores e até colunas como esta. A diferença é que a indústria automobilística é mais eficiente quando chora as pitangas, ou os parafusos. Ah, geram emprego? Todos os outros setores que amargam pesados impostos também, não é? Mas eles choram melhor.
Com isso, no auge da crise de 2008, o governo brasileiro abriu a mão e emprestou a eles o triplo do orçamento do Bolsa-Família para que pudessem financiar carros em prestações esticadas até além do prazo em que eles curtem que o consumidor médio continue com o mesmo veículo. Em casa, na mesma crise, a GM abriu falência.
De acordo com declaração feita pela Anfavea no final do ano, teriam sido vendidos 3,63 milhões de veículos no ano, no Brasil. Isso resulta num um crescimento de 26% desde o início da crise, em 2008. Até capitais menos habitadas, como Porto Alegre, estão criando engarrafamentos comparáveis aos de São Paulo, tamanha a pujança. Nada mau para um período de aperto mundial. Uma indústria que cresce tanto não precisaria chorar os parafusos desse jeito. Mas quem não chora não mama, enfim – problema de quem chora menos, ou nos ouvidos errados.
Parte desse crescimento, é verdade, tem a ver com a credulidade do brasileiro. No ano passado, vi algumas reportagens que mostravam dados importantes sobre a indústria de carros no Brasil:
* Automóveis produzidos aqui são exportados para outros países e vendidos mais barato por lá;
* Mesmo acrescentada a pesada carga tributária brasileira, que é pesada mesmo, a esse preço externo, continuaria mais barato.
Ou seja: você paga caro por ser trouxa; eles, que são espertos, querem é vantagens que o resto da economia não tem.
Tenho, lógico, um conflito de interesses nessa questão: sou pedestre convicto, nunca quis dirigir por amor à leitura. Leio mais nas horas que ganho fora dos engarrafamentos ou no tempo que passo como passageiro. Dá para viver sem carro em São Paulo: é um pouco mais caro o aluguel perto de transporte público e de uma estrutura mínima (supermercado a duas quadras, por exemplo) do que em bairros mais distantes do trabalho, mas na ponta do lápis sai mais barato do que bancar prestação do carro, impostos, combustível, estacionamento, flanelinha e manutenção.
Algum gênio vai contra-argumentar que carro é uma necessidade porque o transporte público é ruim. Para mim, é uma questão de ovo e galinha: o transporte público é ruim porque os governos preferem investir na estrutura para o carro – que traz oportunidades fabulosas de arrecadação direta e, digamos, indireta.
Será que, chorando os parafusos mais uma vez, a indústria vai levar vantagem de novo? Fico de olho por aqui.
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