As histórias abaixo foram contadas por alguém que acompanhou muito de perto a montagem da campanha de Dilma Rousseff à Presidência da República. Elas mostram uma clara disposição da presidenta de preservar um núcleo de comando que ficasse à margem das influências das cúpulas formais dos partidos que formavam a aliança, notadamente o PT. Uma disposição de poder atuar sem ficar amarrada ao que chama de “política tradicional”. E que ajuda a explicar por que Dilma, agora, resolveu enfrentar os caciques tradicionais da política brasileira, mesmo correndo o risco de perder apoio no Congresso.
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Resquício da sua formação política inicial nos movimentos clandestinos que combateram a ditadura militar, Dilma resolveu montar um “aparelho” – um grupo de pessoas próximas, de sua máxima confiança – para atuar com ela na campanha. Para ajudá-la na tarefa, recorreu a um companheiro de clandestinidade, o hoje ministro do Desenvolvimento Social, Fernando Pimentel. Os dois conheceram-se em 1967. Pimentel com o codinome de Oscar. Dilma com o codinome de Estela. Integravam o Comando de Libertação Nacional (Colina).
A pedido de Dilma, Pimentel começou a montar discretamente o comando da campanha, sem que a cúpula do PT soubesse. Uma casa no Lago Sul, que antes era usada pelo marqueteiro João Santana, foi escolhida como sede. A equipe começou a ser montada por Pimentel. Mesmo a contratação da empresa americana Blue State Digital, de Ben Self, marqueteiro que trabalhou na campanha de Barak Obama, para cuidar da internet, foi acertada por Pimentel sem a participação da cúpula petista.
Quando a direção nacional do PT enviou, então, seus interlocutores para se integrarem à campanha – o então vice-presidente e diretor de comunicação do partido, Rui Falcão, e Antonio Palocci, para cuidar da arrecadação –, encontraram o “aparelho” de Dilma já inteiramente montado. Surgiu, então, o temor de que as principais decisões sobre a campanha fossem tomadas, assim, à margem da direção petista. E que isso, naturalmente, continuaria sendo assim no governo.
Reação está na Privataria
A reação a essa constatação é contada em parte no livro A Privataria Tucana, do jornalista Amaury Ribeiro Jr. Segundo Amaury, vazamentos de informações que visavam comprometer esse núcleo criado por Dilma começaram a aparecer na imprensa. E ele teria sido chamado para ajudar a identificar de onde partiam tais vazamentos. Amaury tenta incorporar nesse trabalho os arapongas Idalberto Matias de Araújo, o Dadá (que é um dos presos na Operação Monte Carlo, que prendeu também o bicheiro Carlinhos Cachoeira), e Onésimo Souza.
Amaury afirma, em seu livro, que o grupo petista que se incomodava com o núcleo formado por Pimentel fez com que chegasse à imprensa a versão de que a tentativa de incorporação de Dadá e Onésimo destinava-se a formar um grupo de inteligência na campanha, montado para fazer dossiês contra adversários. A informação valia-se do fato de que Amaury antes investigara o candidato adversário de Dilma, José Serra, do PSDB, como repórter do jornal O Estado de Minas e para o que viria a ser o livro que escreveu.
De fato, porém, na reunião com Onésimo e Dadá falou-se em dossiês. Mas em dossiês que o ex-deputado e ex-delegado da Polícia Federal Marcelo Itagiba (PSDB-RJ) teria feito, para José Serra, contra os principais caciques do PMDB, partido que oficialmente se aliava a Dilma na campanha. A informação sobre os supostos dossiês foi levada por Dadá e Onésimo para a conversa. Não se sabe se algo dos conteúdos dos tais dossiês em algum momento chegou ao conhecimento da campanha petista.
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O fato é que as denúncias sobre a criação do tal “núcleo de inteligência” desestabilizaram a força do comando montado por Dilma com Fernando Pimentel. Rui Falcão foi eleito presidente do PT, e Palocci tornou-se o ministro da Casa Civil, responsável pela articulação política do governo. Até cair, envolvido em denúncias de enriquecimento ilícito.
Após a queda de Palocci, ao escolher Gleisi Hoffmann para a Casa Civil e Ideli Salvatti para as Relações Institucionais, Dilma reformulou, com outros nomes, seu núcleo pessoal, que governaria com ela. Um núcleo que neutraliza a força das estruturas partidárias tradicionais. Como o próprio vice-presidente Michel Temer, e os presidentes dos partidos, como Falcão. Ao trocar os líderes do governo na Câmara e no Senado, Dilma completa essa disposição. Na campanha, o movimento de Dilma gerou reações, e ela levou um golpe. Se agora conseguirá passar incólume, só o tempo dirá.
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