Pela primeira vez desde o início da atual onda de escândalos, o deputado José Dirceu (PT-SP) atribuiu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva responsabilidade pela crise política. O ex-ministro da Casa Civil disse que a estratégia eleitoral do PT foi definida em conjunto, mas negou que presidente tivesse conhecimento do caixa dois petista. "Ele não tinha conhecimento disso, ele não sabia. Ele não pode ser responsabilizado", ressaltou.
Em entrevista exclusiva à Folha de S. Paulo publicada ontem, Dirceu reconheceu sua parcela de culpa pela atual crise e disse que não aceita pagar sozinho pelos erros do partido. "Parece que fui presidente do PT sete anos sozinho, secretário-geral cinco anos sozinho, né? O PT não foi construído assim. Tem dezenas de dirigentes importantes que hoje são prefeitos, governadores, ministros, deputados e senadores que participaram da construção de toda essa estratégia comigo. E o próprio presidente da República."
Dirceu se encontrou pela primeira vez em público com Lula desde o início da crise. Os dois trocaram apenas um aperto de mão formal durante o velório de Apolônio de Carvalho, ativista político histórico e fundador do PT, no Rio. Na entrevista à Folha, Dirceu criticou o governo pela falta de investimentos em infra-estrutura e na área social. Deu nota 7,5 para o governo Lula e nota 5 para o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, com o qual mantém divergências sobre a condução da política econômica.
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O ex-ministro também criticou a linha política adotada por Lula, que preferiu alianças com partidos menores a um acordo estratégico com o PMDB. "Um acordo com o PMDB daria estabilidade ao governo. Eu sempre disse ao presidente que o governo não podia perder a maioria na Câmara e no Senado. Que perder a maioria seria caminho para CPI e que CPI é caminho para tentar desestabilizar e inviabilizar o governo".
Acusado pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) de ser o coordenador do mensalão, Dirceu deixou claro que teve sua parcela de responsabilidade, mas que não foi o único culpado nas escolhas do PT. "O que não aceito é a imagem de que eu fiz tudo sozinho e depois apareceu Silvio Pereira, Delúbio Soares e Marcelo Sereno, que são o mal", afirmou à jornalista Mônica Bergamo.
Segundo ele, o partido deve desculpas aos eleitores pela quebra de confiança e pelo método adotado na formação da base de apoio ao governo. "Esse é um erro e o PT vai pagar por ele. Nós vamos ter que pedir desculpas ao país". Mas afirmou que a atitude não torna nem o PT nem o governo Lula corruptos.
PublicidadeA seguir, alguns dos principais trechos da entrevista de José Dirceu:
Responsabilidade distribuída
"Eu tenho responsabilidade política. É lógico que eu tenho. Eu fui presidente do PT. Agora, eu não tive responsabilidade sobre as decisões da direção do PT a partir do dia em que saí da presidência."
"O Lula tem responsabilidade política porque ele era líder do PT. Mas os graus são diferentes. Não posso atribuir a ele responsabilidade sobre o caixa dois. Aí eu não vou atribuir."
Mensalão
"É engraçado: falam que existe ‘mensalão’, mas não terminou a CPI do Mensalão nem a dos Correios. E cassaram o Roberto Jefferson porque ele disse que tinha ‘mensalão’ e não provou. Não se provou corrupção do governo, dos ministros, do presidente. Não se provou a existência de um sistema para levantar recursos para repassar para A ou B. Nem que tem ‘mensalão’."
"Os partidos (PL, PP e PTB) assumiram que receberam dinheiro. Mas isso não quer dizer que o governo é corrupto e que o PT é corrupto."
Divergências com Lula
"Eu quis sair do governo em dois momentos (não saí e acho que errei): primeiro no caso Waldomiro (Diniz). Entreguei o cargo para o presidente e ele não aceitou. Tudo bem. Acabou. Depois em março de 2005. Primeiro porque a oposição transformou a minha presença num problema para o governo. Tudo o que eu falava ou fazia se transformava numa crise. Em segundo lugar porque algumas opiniões que eu tinha sobre política econômica e desenvolvimento do país, e sobre a política, não predominavam no governo."
"A minha divergência é de foco e de prioridade. Eu sou favorável à estabilidade fiscal, monetária e ao combate à inflação. Mas estou convencido de que poderíamos ter destinado mais recursos para infra-estrutura, para o social. O ritmo, e o peso, foi cada vez maior no ajuste fiscal e monetário e cada vez menor na política de desenvolvimento."
Caixa dois, o grande erro
"O erro não foi ter feito política de alianças e ter contratado o Duda. Foi ter feito caixa dois. Não havia polêmica por causa dos custos do Duda, mas sim por causa da orientação, até porque em 2002 tínhamos como pagá-lo oficialmente. Quem era contra o Duda era contra a política de aliança, contra o programa de governo. Lula não ia ser presidente, não ia governar o Brasil nunca."
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