Márcio de Matos Barcelos*
O DPVAT é um seguro que, diante da realidade do trânsito brasileiro, vem sendo cada vez mais utilizado, ou seja, já que os acidentes são infelizmente cada vez mais comuns em nosso país, temos um crescente no pedido e pagamento das indenizações. Ocorre que, igualmente de forma infeliz, os oportunistas crescem na mesma proporção que os acidente de trânsito e isto acaba se tornando um empecilho ao correto pagamento e liquidação dos sinistros.
Trata-se, portanto, flagrantemente da socialização do risco, ou seja, todos pagam pelos danos de um, tanto é verdade que temos uma legislação que assegura absolutamente em todo território nacional um mínimo necessário à população que vem a sofrer um acidente de trânsito, isso desde o ano de 1974, instituído pela Lei n.º 6.194.
O popularmente conhecido “DPVAT” é seguro obrigatório, sendo forçoso o seu pagamento, já quando do licenciamento anual de todo e qualquer veículo automotor, sob pena de não se conseguir o documento liberatório para circulação. Este seguro tem largo alcance social, pois, para se fazer jus à cobertura, não importa se a vítima é proprietária ou não de automóvel, bastando simplesmente o seu envolvimento no acidente automobilístico, seja como condutor, passageiro ou pedestre.
É desnecessário se investigar a ocorrência sobre o pagamento do prêmio do seguro, não havendo sequer a necessidade da identificação do veículo envolvido no infortúnio, tampouco se avança na análise da culpa sobre quem gerou o evento.
Entretanto, cumpre destacar que o cenário atual tornou-se preocupante ao longo dos anos, já que, concomitantemente ao aumento de ações judiciais buscando a indenização do Seguro DPVAT, bem como à relativização das provas, há uma proliferação de fraudes realizadas com o objetivo de burlar o sistema em especial de um seguro flagrantemente social.
Demanda-se, assim, a adoção de uma postura mais severa, no sentido de exigir-se que os documentos apresentados pela vítima sejam cada vez mais verossímeis, gerando, assim, maior segurança jurídica, em absoluto respeito aos 200 milhões de potenciais beneficiários desse seguro, ou seja, toda população nacional.
PublicidadeComo forma de prevenir tais situações, o Tribunal de Justiça/RS passou a entender, após incontáveis demonstrações de fraudes ao Seguro DPVAT, que laudos particulares e unilaterais não podem servir como meio de prova da lesão que deve ser permanente para que ocorra o pagamento deste seguro.
Como exemplo, trazemos à baila a decisão proferida na Apelação n.º 70033986480 sendo o processo de relatoria do Excelentíssimo Desembargador da 5ª Câmara Cível TJ/RS, desembargador Gelson Rolim Stocker, que ao julgar, fundamentou exatamente no sentido de que laudo particular é prova deveras insuficiente. Denota-se que na fundamentação do julgado, o laudo foi produzido de forma unilateral e, assim, sem o necessário, devido e amplo contraditório e, sequer, com a real judicialização dessa prova.
Outro julgado importante é o da Apelação Cível n.º 70036314508, de lavra do desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, onde ficou decidido que o inciso I do art. 333 do Código de Processo Civil afirma ser do autor o ônus de provar sua invalidez. Sendo inaplicável o Código de Defesa do Consumidor, pois a relação havida entre seguradora e beneficiário de seguro obrigatório não é de consumo, tendo regulamentação própria na Lei n° 6.194/74, com o que não são aplicáveis as disposições da lei consumeirista, como a que determina a inversão do ônus da prova.
É necessário, entretanto, se analisar os documentos trazidos pelos autores, bem como fazer a necessária impugnação a estes, bem como demonstrar que existem pré-requisitos legais exigidos para os casos de invalidez permanente.
Entre esses pré-requisitos, está a juntada do Exame de Corpo de Delito fornecido por órgão oficial, a fim de que se estabeleça o grau da invalidez sofrida pela parte autora em razão do acidente de trânsito sofrido, para que se estabeleça o valor correto do quantum indenizatório a ser pago aos vitimados – que devem encontrar-se inválidos permanentemente, ou seja, não é necessário só a comprovação do sinistro, mas também o dano dele decorrente. E tal previsão está expressa no § 5º do artigo 5º da Lei n.º 6.194/74.
Há que se ressaltar que tal previsão é feita igualmente por resolução do órgão regulador e fiscalizador do Seguro DPVAT, que é o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP).
Portanto, sem o laudo fornecido por órgão especializado informando, com precisão, o percentual de redução funcional acometida ao autor – entenda-se como órgão oficial: DML, INSS e DMJ, não se pode dimensionar a suposta invalidez a fim de que seja oferecida a justa e efetiva indenização pelo grau de lesão sofrido.
Ademais, a grande maioria dos laudos apresentados pelos autores vem desacompanhada de qualquer contexto probatório a demonstrar efetivamente a alegada invalidez, já que sua emissão é sempre após o sinistro gerador do dano. trata-se de entendimento consolidado do TJ/RS que, além do laudo médico, deve haver provas de tratamento médico.
Os autores de ações relativas ao Seguro DPVAT devem anexar o boletim de ocorrência e boletins de atendimento para comprovarem a ocorrência de acidente de trânsito, bem como a prova da lesão permanente apenas será demonstrada por meio da juntada de laudo médico, já que invalidez permanente significa a perda ou redução, em caráter definitivo, das funções de um membro ou órgão, em decorrência de acidente de trânsito provocado por veículo automotor.
Contudo, para prevenir-se a continuidade de pagamentos indevidos, basta a aplicação da lei, bem como da utilização do bom senso, exigindo-se que a vítima traga aos autos provas contundente acerca dos fatos narrados, em especial seja confeccionado um laudo oficial, já que se trata de exigência legal a amparar tal pretensão.
Os laudos médicos particulares não são provas suficientes para atestar a existência de lesões permanentes, razão pela qual devem as ações sem a devida e completa comprovação são julgadas improcedentes.
É seguro que deve ter um cuidado todo especial, na medida em que os valores que não são utilizados revertem para o SUS e ao Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) o primeiro para utilização em melhorias no atendimento e o segundo para campanhas educativas no trânsito.
*Márcio de Matos Barcelos é advogado (OAB/RS 76.275).
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