Mauro Zanatta *
A segunda denúncia contra Michel Temer chega com menos apelo à Câmara. Em todos os sentidos. O presidente tem mais força agora do que naquele 2 de agosto, quando os deputados rejeitaram, por 263 votos a 247, a acusação de corrupção passiva alinhavada pelo ex-PGR Rodrigo Janot.
Desta vez, a própria discussão aberta no STF sobre a validade das provas oferecidas pelos executivos do grupo JBS em suas delações parece indicar mais força de Temer e sua turma do PMDB nas preliminares do jogo principal, no plenário da Câmara. Na primeira denúncia, não houve questionamento. O presidente estava mais frágil no Congresso. O estrago político da delação foi grande o bastante para desatar um “feirão” de cargos, emendas e influência no governo no Congresso. Agora, nem isso deve ocorrer naquele dimensão, já que muita “mercadoria” ainda não foi entregue.
O placar dessa quinta-feira no STF foi contundente, é claro: 10 a 1 – a única divergência foi do “líder” no STF, ministro Gilmar Mendes. Mas a chicana da defesa do presidente serviu bem ao objetivo de levantar muitas dúvidas sobre as novas acusações de organização criminosa e obstrução de justiça.
Nos bastidores, STF namorou com a devolução do abacaxi à PGR, agora comandada por Raquel Dodge – figura que, diz-se no meio jurídico, deve ser tão implacável quanto Janot, já que precisa afirmar-se diante da corporação, mas certamente menos afobada e mais calculista. O STF também cogitou retardar o sinal verde à Câmara até que ficasse mais claro se as delações, mesmo rescindidas pelo ex-PGR, teriam força legal suficiente para formar convicções.
O tal “fato novo” da vez, e que pode realmente mudar o jogo contra Temer no Congresso, é uma eventual delação do ex-ministro Geddel Vieira Lima. Esse, sim, um comensal de extrema confiança e intimidade do presidente. Um político reputado como sanguíneo, irascível, explosivo e mercurial nas suas relações.
Na primeira denúncia contra Temer, pesava a imagem da mala de R$ 500 mil empurrada na surdina pelo ex-assessor e deputado Rodrigo Rocha Loures pelas ruas de São Paulo. Agora, pesam as várias malas com R$ 51 milhões (!) “descobertas” em um apartamento de Salvador usado por Geddel.
Além da escala incomparável, a situação é bem diferente. Rocha Loures era um “consiglieri” no círculo de Temer. Geddel era vice-Rei, assim como são os ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco e o agora detento Henrique Alves – Eduardo Cunha, preso em Curitiba, tinha outra função no grupo.
Tudo somado, as caneladas na base política de Temer, em especial a disputa PMDB x DEM de Rodrigo Maia para ganhar novos deputados na janela de troca partidária, tendem a se acomodar na ‘dolce vita’ brasiliense. Mas o ânimo de Geddel nem as palmeiras imperiais da Praça dos Três Poderes sabem como ficará com mais alguns dias de cárcere na Papuda.
Por isso, Temer quer resolver a parada logo na Câmara. Mas os ritos e o ritual do Parlamento podem ser implacáveis.
* Mauro Zanatta é jornalista, sócio-diretor na CasaAgro Comunicação Digital, comentarista de política no Canal Rural e coautor dos livros Vida Brasileira, da Gazeta Mercantil, e da coletânea À Mesa com o Valor. O texto foi originalmente publicado no blog do autor.
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