“Necessitamos com urgência de um maior aprimoramento do processo jurisdicional”, disse o ministro, para quem a duração dos processos da mais alta corte de Justiça do país não é “razoável”. “Justiça que falha e não tem compromisso com sua eficácia é Justiça que impacta direta e negativamente na vida do cidadão. Justiça por si, e só para si, não existe. Só existe na forma e na medida em que os homens a querem e a concebem.”
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Joaquim começou a falar já como presidente empossado às 16h45, e com pronúncia pausada prosseguiu até as 17h, pontualmente. Iniciou o discurso dizendo que o Brasil passou recentemente a integrar o “seleto grupo das nações respeitáveis”.
Em seguida, passou a discorrer sobre o ofício da magistratura. “Essa figura tão esquecida, às vezes… É preciso reforçar a independência do juiz. Afastá-lo, desde o ingresso na carreira, das múltiplas e nocivas influências que podem, paulatinamente, minar-lhe a independência”, emendou o ministro, com críticas à “hierarquia interna”, uma das ameaças à autonomia dos magistrados, e aos “laços políticos” que, por vezes, funcionam como mecanismo da “natural e humana busca por ascensão funcional e profissional”.
“Nada justifica, a meu sentir, a pouco edificante busca de apoio para uma singela promoção do juiz. Do primeiro ao segundo graus de jurisdição”, fustigou Joaquim, aplaudido também nesse ponto do discurso.
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Relator da Ação Penal 470, o mais complexo julgamento da história do STF (leia tudo sobre o mensalão), Joaquim dedicou mais da metade de seu discurso a falar sobre o papel do juiz. Ele enfatizou a necessidade de competência por parte dos magistrados.
“Não basta ter uma boa formação técnica, humanística, com forte apego a valores éticos que, em realidade, devem ser linhas comportamentais de qualquer agente estatal, e mesmo de agentes privados. O juiz deve ter presente caráter necessariamente laico na missão constitucional que lhe foi confiada. E zelar para que as suas convicções e crenças mais íntimas não contaminem a sua atividade, que é uma das mais relevantes para o convívio – além de fator de fundamental importância para o bom funcionamento – porque não voltar a dizer? – de uma economia moderna, de uma sociedade dinâmica, inclusiva e aberta a toda e qualquer mudança”, discursou o terceiro juiz negro da história do Supremo. O primeiro, no entanto, a assumir a presidência da corte.
Para Joaquim, o exercício de um magistrado deve priorizar a defesa “dos valores mais caros à sociedade na qual ele opera”, e em sintonia com a sociedade, uma vez que o juiz atual é “um produto do seu meio e do seu tempo”. Para o primeiro presidente negro do STF, ficou no passado a atuação do juiz isolado do povo. “Nada mais ultrapassado e indesejado do que aquele modelo de juiz isolado, fechado, como se estivesse encerrado em uma torre de marfim”, declarou.
Prestígio
Joaquim encerrou a fala dirigindo-se à mãe, Benedita Barbosa Gomes, ao filho e aos irmãos, todos presentes à posse. Em seguida, citou personalidades do mundo jurídico-acadêmico, do Brasil e do exterior, como o ex-ministro Carlos Ayres Britto, compulsoriamente aposentado como presidente do STF na última semana.
Encerrado o discurso, Joaquim Barbosa se posicionou no salão contíguo ao plenário para receber, ao lado do vice-presidente empossado, Ricardo Lewandowski, abraços e cumprimentos de personalidades do mundo jurídico, acadêmicos, artistas e servidores do Judiciário. Entre os convidados do ministro estavam, entre outros, os artistas Lázaro Ramos, Milton Gonçalves, Lucélia Santos e Regina Casé, além do músico Djavan; os ex-presidentes do STF Nelson Jobim, Ellen Gracie e Sepúlveda Pertence; e políticos como o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e os presidentes do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e da Câmara, Marco Maia (PT-RS).
Também compareceu à solenidade de posse o ex-procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza. Antecessor de Roberto Gurgel no posto, Antonio foi responsável por dar início à formulação da denúncia contra a “sofisticada organização criminosa” que, em suas palavras, comprava apoio político no Congresso durante a gestão do ex-presidente Lula – o famigerado mensalão.
Loas
Joaquim Barbosa foi a quarta autoridade a falar – a praxe na posse de presidentes do STF. Na abertura da sessão, o primeiro a falar foi o ministro Luiz Fux, que iniciou seu discurso com menção à presidenta Dilma Rousseff – a quem dedicou, “de público, pela vez primeira”, a gratidão pela “honrosa” indicação para a Suprema Corte do país, da qual faz parte desde março de 2011.
“A Suprema Corte concedeu-me honra maior do que eu merecia: a incumbência de anunciar a posse do ministro”, disse Fux, em discurso pontuado com frases de valorização da magistratura e, principalmente, do próprio ministro recém-empossado. “É daqueles homens a que [o filósofo romano] Cícero se referiu como capaz de enfrentar os perigos e suportar os labores”, acrescentou o ministro, ao ressaltar a “prodigiosa vida intelectual” do novo presidente e suas qualidades como “combativo” membro do Ministério Público Federal. Fux lembrou ainda que Joaquim foi servidor do Centro Gráfico do Senado Federal, mencionando a presença do presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP).
Fux falou por cerca de 20 minutos e foi aplaudido de pé por alguns segundos. “Nós, os juízes, não tememos nada, nem a ninguém”, acrescentou, interrompido por aplausos da plateia. No encerramento de sua intervenção, o ministro fez menção ao líder negro norte-americano Martin Luther King e à cidadã Benedita, mãe do ministro Joaquim, que assistia à solenidade entre os convidados especiais.
Também discursou em plenário o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalvante, que fez menção direta ao julgamento do mensalão. Para Ophir, ação penal serve para “estimular a consciência crítica do cidadão no que se refere à consciência ética na política”.
Segunda autoridade a discursar, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, foi breve em sua fala ao ressaltar a importância da renovação de quadros de comando na administração pública. “A renovação na presidência do Supremo Tribunal Federal é acontecimento que deve ser celebrado como essencial à construção de nosso sistema de Justiça”, disse Gurgel, antes de se referir aos “grandes julgamentos” – menção indireta ao mensalão.
Dirigindo-se a Joaquim, o procurador-geral da República disse que, quando o retrato do ministro estiver, ao fim do mandato de dois anos, na galeria dos ex-presidentes do STF, três características do retratado estarão subentendidas. “Integridade, independência e firmeza”, disse Gurgel.