A sessão do Conselho de Ética da Câmara para discutir e votar parecer preliminar sobre continuidade do processo de cassação contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi encerrada sem qualquer decisão. Pouco após o início da Ordem do Dia do Congresso, que impede qualquer deliberação em comissões, a reunião foi adiada para amanhã (quarta, 2), às 14h. O objetivo é que a votação ocorra após deputados inscritos na sessão desta terça (1º) exponham seus argumentos pela admissibilidade ou arquivamento da representação que acusa quebra de decoro parlamentar do peemedebista.
A votação decidirá sobre a admissibilidade do processo, tarefa que coube ao deputado Fausto Pinato (PRB-SP), que produziu parecer favorável à representação protocolada por Psol e Rede. O deputado paulista alegou ter encontrado elementos suficientes que podem levar à cassação de Cunha, o que o fez defender a “justa causa” da representação e recomendou pelo avanço do processo. Sendo assim, os membros do conselho ainda não discutem o mérito da questão, isto é, se Cunha de fato quebrou com os códigos de conduta da Casa, mas sim a continuidade da ação.
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Se a recomendação de Pinato for acatada pelos pares, a representação passa para uma segunda etapa, em que Cunha tem o direito de apresentar sua defesa formal e, aí sim, os membros do colegiado discutem o mérito do documento. O presidente da Casa foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por suposto envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras. A representação está baseada nessa denúncia e na confirmação do Ministério Público da Suíça de que Cunha e seus familiares são beneficiários finais de contas bancárias em instituição financeira daquele país.
Em defesa prévia, o advogado de Cunha, Marcelo Nobre, abriu as discussões entre os membros do colegiado. Ele alegou que a representação é indevida, pois “denúncia não prova nada”. O advogado ainda defendeu que Cunha não mentiu à CPI da Petrobras em março, quando, voluntariamente, compareceu à comissão e afirmou que não possuía contas no exterior. “Não tem qualquer prova nesta representação contra o meu cliente. Ele não mentiu à CPI, essa é a única verdade”, disse.
Ele ainda reiterou que a representação é inválida por defender a quebra de decoro do parlamentar em decorrência de suposta omissão das contas à Receita Federal. Segundo Nobre, não há leis brasileiras que obrigam a declaração de bens no exterior. “Meu cliente não omitiu na sua declaração de renda, porque não há lei que o obrigue declarar. Nenhuma omissão existiu”, completou.
Aliados
PublicidadePela defesa de Cunha, também se manifestaram exaustivamente os deputados Manoel Junior (PMDB-PR) e Wellington Roberto (PR-PB). Primeiramente, Manoel Junior questionou, por meio de questão de ordem, o parecer de Pinato, ao dizer que ele não poderia ter redigido o relatório. O peemedebista disse que o relator pertencia ao mesmo bloco do partido de Cunha no conselho, o que o tornava impedido de desempenhar tal função. Mas o presidente do colegiado, José Carlos Araújo (PSD-BA), não considerou a ponderação. Na interpretação do regimento pelo peessedista, Pinato não era mais do bloco de Cunha ao ser escolhido como relator.
Posteriormente, Wellington apresentou voto em separado. No documento lido durante sessão, ele também opta pela continuidade da representação. No entanto, estabelece pena mais branda. Para o deputado paraibano, Cunha não deve ser punido com a perda de mandato, mas sim com censura, também prevista no Código de Ética da Casa.“O representado mostrou ter agido de boa fé ao depor espontaneamente na CPI da Petrobras”, defende em seu voto.
Contudo, como explicou o vice-presidente do conselho, Sandro Alex (PPS-PR), não cabe, nesta fase do processo, estabelecer a punibilidade a Cunha. Caso a pena fosse definida, já estariam julgando o mérito do processo e, com isso, romperiam o preceito constitucional de ampla defesa, que deve ser concedido a Cunha apenas quando for, de fato, julgada a sua eventual cassação.
Vantajoso para os aliados de Cunha, que ganharam tempo na arguição e conseguiram estender a sessão até o início da Ordem do Dia do Congresso, o voto em separado causou discórdia e bate-bota entre os membros. Pinato acusou Wellington de tentar tumultuar a sessão. “Ao meu ver seu voto é fruto de reprovável estratégia com finalidade de criar embaraço a esse conselho, tentar plantar nulidade processual e retardar o andamento do processo”, disse.
Moeda de troca
Antes de iniciar a sessão desta terça, o deputado petista que compõe o Conselho de Ética, Zé Geraldo (PA), afirmou que estava com “a faca no pescoço”. Segundo ele, votar contra Cunha poderia ser a brecha para abertura de impeachment contra Dilma no Plenário da Câmara.
Ao todo, são três deputados do PT no colegiado. O arquivamento ou a continuidade do processo pela perda de mandato do presidente da Câmara pode estar nas mãos dos petistas. Nos bastidores, apurou-se que o Planalto recomendou pelo arquivamento da peça “em nome da governabilidade”. O objetivo do governo seria evitar o confronto e conseguir aprovar a pauta econômica que tramita nas Casas legislativas, como as alterações da meta fiscal deste ano, o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentária de 2016 e as medidas do ajuste fiscal, como a Desvinculação das Receitas da União (DRU).
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (CE), evitou falar sobre o assunto. “O governo não vai opinar sobre uma questão que não lhe diz respeito. É um problema do Conselho de Ética da Câmara. A nossa missão é votar a pauta econômica”, disse.
Após repercussão negativa que se estendeu por toda manhã e início da sessão, deputados petistas colheram assinaturas de correligionários e apresentaram um abaixo assinado com mais de 30 assinaturas, as quais atestavam aqueles que eram a favor da admissibilidade do processo. Horas depois, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, manifestou-se contra Cunha por meio de sua conta no twitter. “Confio em que nossos deputados, no Conselho de Ética, votem pela admissibilidade”, disse, ao apontar um possível direcionamento dos petistas no colegiado.
O líder do Psol, Chico Alencar (RJ), foi um dos únicos a lembrar da polêmica em sua fala no conselho. Segundo ele, a relação entre Cunha, o Planalto e os deputados petistas é de “chantagem”. “Nada será mais esclarecedor do que o voto”, filosofou o parlamentar.