A população de baixa renda continua excluída das medidas anunciadas esta semana pelo governo para a redução dos efeitos da crise econômica no setor habitacional. As cinco ações apresentadas pelo presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, novamente não abrangem a Faixa 1 do Minha Casa Minha Vida (MCVM), composta por famílias com renda mensal até R$ 1,8 mil. Nem mesmo o benefício da suspensão do pagamento das prestações da casa própria durante a pandemia foi concedido a esta faixa do programa, a mais carente e a única que não teve a pausa nos financiamentos concedida pelo governo federal.
Segundo a Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam), desde o início da pandemia do coronavírus, mais de 6,3 mil famílias foram despejadas por não terem condições de pagar as prestações da moradia. “Nesse momento de crise, políticas públicas para facilitar a vida das pessoas são importantes e a Caixa está cumprindo o papel social do banco, com medidas voltadas para a habitação. Mas, os benefícios têm de chegar para todos”, defende o presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae), Sérgio Takemoto. “O governo precisa dar mais atenção às famílias que têm renda menor e constituem a camada mais vulnerável da população”, reforça.
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De acordo com o presidente do Conam, Getúlio Vargas Júnior, as medidas adotadas pelo governo alcançam apenas quem tem condições de buscar financiamentos para a compra da casa. “Mas, não resolvem a situação de quem não tem condições de fazer isso”, afirma. “Depois da Medida Provisória 995 [editada pelo governo para abrir caminho à privatização da Caixa Econômica] e da MP 996 [criando o programa Casa Verde e Amarela em substituição ao Minha Casa Minha Vida], que procura tirar dos bancos públicos boa parte da produção habitacional, fragilizando a Caixa, a gente percebe mais uma iniciativa articulada com o projeto de Bolsonaro e do ministro Paulo Guedes [Economia] no sentido de transformar moradia cada vez mais em mercadoria e menos em direito social”.
O coordenador da Central de Movimentos Populares (CMP), Raimundo Bonfim, também critica o que ele classifica como “descaso” com os mutuários da Faixa 1 do MCMV. “É inaceitável que, em um momento de crise como esse, o governo não apresente uma proposta concreta no sentido de aliviar a situação dessas famílias”, diz. “Faltam propostas para a moradia popular, seja para aqueles que já são mutuários do Minha Casa Minha Vida ou de outros programas seja para facilitar o acesso da população de baixa renda aos financiamentos”, ressalta Bonfim.
Em março, a Caixa autorizou a suspensão das parcelas dos financiamentos habitacionais. Mais de 2,5 milhões de mutuários foram beneficiados pela pausa nas prestações, com exceção da faixa mais carente do MCMV. O banco também possibilitou um prazo de carência de seis encargos para contratos de financiamento de imóveis novos e a renegociação de contratos com clientes em atraso, entre 61 e 180 dias, permitindo a pausa das prestações, dentre outras medidas.
PublicidadeJuros
De acordo com a MP 996, a parcela mais carente do novo Casa Verde e Amarela — correspondente à Faixa 1 do Minha Casa Minha Vida — passará a ter que pagar juros anuais a partir de 4,25% no financiamento da casa própria.
Criado em março de 2009, o MCMV concede aos mutuários desta faixa um subsídio do governo correspondente a 90% do valor da moradia. Os outros 10% podem ser pagos em até 120 prestações mensais (por um período de dez anos), que variam de R$ 80 a R$ 270, sem qualquer incidência de juros.
A exclusão dos brasileiros mais necessitados das políticas habitacionais do governo Bolsonaro vem sendo denunciada há meses pela Fenae. Conforme alertas feitos pela entidade junto a diferentes órgãos do Executivo federal, esta parcela da população continua sendo a única não beneficiada, por exemplo, pelas pausas no pagamento das prestações da casa própria.
No final de julho, a Fenae enviou ofícios à direção da Caixa e também ao Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) solicitando informações sobre a não inclusão da Faixa 1 do Minha Casa Minha Vida em nova prorrogação da suspensão do pagamento dos financiamentos habitacionais. Em maio e julho, o governo concedeu e prorrogou pausas na quitação das prestações — em um total de 180 dias — para todos os mutuários do país, incluindo três faixas do MCMV: 1,5, 2 e 3.
Déficit habitacional
Segundo a União Nacional por Moradia Popular (UNMP), famílias com renda até três salários mínimos correspondem a mais de 80% do déficit habitacional, o que reflete a falta de políticas habitacionais estruturadas no país.
“Nem essas novas medidas nem o programa Casa Verde e Amarela atendem as famílias de baixa renda, onde se concentra o maior déficit”, observa a representante da UNMP, Evaniza Rodrigues. “É muito triste ver um país que vinha construindo uma política nacional de habitação, com uma série de ações aprovadas pelos conselhos e conferências das cidades, jogar tudo no lixo e voltar para antes dos anos 2000, quando somente existia política habitacional para quem tinha mais renda. Quem mais precisa, fica de fora”, lamenta Evaniza Rodrigues.
Conforme estimativas da direção da Caixa, as medidas anunciadas esta semana poderão impactar 830 mil famílias, correspondendo a R$ 83 bilhões, entre novos negócios e negociação de contratos ativos. Além de reduzir os juros na linha de crédito indexada pela Taxa Referencial (os índices ficarão entre 6,25% + TR e 8,00% + TR), o banco vai prorrogar a possibilidade de carência para início do pagamento das parcelas de novos contratos imobiliários.
Os mutuários que tiverem dificuldades de retomar o pagamento integral da prestação habitacional poderão optar pelo pagamento parcial. Conforme o perfil, o cliente terá a possibilidade de pagar 75% da prestação, por até seis meses, ou entre 50% a 75% da prestação, por até três meses.
As outras duas medidas anunciadas foram a possibilidade de contratar o financiamento imobiliário de forma 100% digital pelo aplicativo Caixa Habitação e a realização de feiras online da casa própria.
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