Quando o então deputado federal José Carlos Coutinho, do PFL fluminense, propôs uma lei para criminalizar o exercício ilegal das profissões de engenheiro, arquiteto ou agrônomo, Fernando Henrique Cardoso era presidente e a seleção brasileira se preparava para a copa da Coreia do Sul e do Japão, ainda como tetracampeã. Em maio de 2021, o projeto completa 19 anos tramitando na Câmara dos Deputados sem conseguir concluir sua votação em Plenário.
Géologo de formação, José Carlos Coutinho – que teve quatro mandatos seguidos no parlamento – procurou fazer uma legislação sucinta no PL 6699/2002, alterando o artigo 282 do Código Penal, que trata hoje do “exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica”. O texto passaria apenas a proibir o exercício das carreiras de engenharia, arquitetura e agronomia, sem a autorização legal ou excedendo os seus limites.
O então deputado já havia saído do cargo quando o PL chegou às comissões, em 2004. Apenas em 2006, o PL foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Diversos pedidos de inclusão na ordem do dia de votações acabaram não sendo aceitos e o projeto aguardou na fila.
O projeto foi finalmente ao Plenário, em 27 de março de 2018, um mês após a morte do seu autor, aos 75 anos. O texto relatado pelo deputado Ronaldo Lessa (PDT-AL) deu um artigo próprio para o que seriam os crimes do exercício ilegal da profissão, e definiu apenas a existência de multa, sem especificação de valores mínimos e máximos. A oposição na Casa obstruiu a votação e, após um pedido de votação nominal por parte dos líderes do Psol, o texto foi retirado de pauta.
Nestes três anos, em nenhuma vez o texto voltou à votação. Em outubro de 2020, o deputado Sanderson (PSL-RS) até chegou a pedir urgência ao texto – mas este segue novamente sem data para ser votado.
O exercício regulamentado das profissões sob tutela do Sistema Confea/CREA é essencial para a segurança não apenas de quem exerce a profissão, mas para quem usufrui dos serviços e obras destas categorias.”Se o profissional não passou pelo crivo dos conselhos regionais, ele certamente não tem a habilitação técnica para atuar”, diz Sanderson. “E quando um engenheiro, um agrônomo ou um técnico atuam sem habilitação, ele coloca a vida de pessoas em risco.”
O deputado – que era policial federal formado em Direito antes de assumir o cargo – explica que seu pedido para retorno às discussões vem após engenheiros, agrônomos e outros profissionais do seu estado natal apontarem a necessidade da legislação penal.”Me parece que alguns profissionais, que não estejam legalizados perante a legislação brasileira, não deixam de trabalhar em razão de multas, deveríamos entrar com o direito penal, a última instância na hierarquia das leis.”
Para o presidente do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), engenheiro civil Joel Krüger, o Projeto de Lei atende aos interesses da sociedade, porque a atual legislação não consegue coibir da maneira correta. “Já existe uma penalidade para quem exerce a profissão ilegalmente, mas é de caráter financeiro”, pondera. Mas esse ajuste na legislação irá fortalecer o exercício legal da profissão e por consequência proteger a sociedade”, ressalta.O engenheiro de minas, Renan Guimarães de Azevedo, conselheiro federal do Confea e coordenador da Comissão de Ética e Exercício Profissional (CEEP) do Conselho, analisa processos que chegam diariamente ao Confea a respeito do tema vindo das regionais e considera que a sociedade tende a se beneficiar de uma mudança legal sobre o tema. “É muito importante que aquela pessoa leiga, que queira exercer uma atividade sem a devida instrução, possa ser penalizada – inclusive legalmente – para que qualquer erro, que venha a prejudicar um terceiro, a sociedade ou mesmo o ambiente em que vivemos, seja penalizada da maneira correta”, aponta.
> Ministro da Saúde nega maquiagem em divulgação de dados de covid-19