A ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva (Rede) cobrou uma defesa do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) pelo ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes.
“Tinha que ter publicamente colocado a defesa do Inpe, ainda que perdendo a função de ministro. Teve uma atitude inadequada para um homem da ciência, que sabe que o Inpe faz ciência. Ele se omitiu, chegou a beira da conivência e até mesmo fazendo questionamento estranho ao trabalho dele”, disse em entrevista ao Congresso em Foco.
Por conta dos dados sobre o crescimento do desmatamento, Ricardo Galvão foi demitido no dia 2 de agosto pelo presidente Jair Bolsonaro do comando do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
No começo de julho, o Inpe apontou que o desmatamento no Brasil foi de 75 quilômetros quadrados e cresceu 8,5% no ano de 2018.
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PublicidadeNo dia 21 de julho, o presidente Jair Bolsonaro criticou o Inpe e declarou que os dados sobre desmatamento fazem “campanha contra o Brasil”. Em entrevista ao jornal Estado de São Paulo, Ricardo Galvão disse que “Bolsonaro é um covarde”.
Em seguida, Marcos Pontes convocou Galvão para prestar esclarecimentos sobre as declarações dada a imprensa.
Ao falar sobre o caso, Marina Silva relatou episódio similar quando foi ministra do Meio Ambiente. Em 2008, ela foi questionada pelos então governadores Blairo Maggi (MDB-MT) e Ivo Cassol (PP-RO) e pelo então ministro de Assuntos Estratégicos Mangabeira Unger sobre relatórios do Inpe que traziam dados sobre desmatamento da Amazônia.
“Eles estavam tentando convencer o governo que os dados estavam incorretos e as medidas estavam exageradas”, afirmou.
O atrito levou ao seu pedido de demissão do Ministério.
Foi durante a gestão de Marina na pasta do Meio Ambiente que foi criado o plano de combate ao desmatamento da Amazônia e o Fundo Amazônia, aporte financeiro de R$ 3 bilhões financiados pelos governos da Alemanha e da Noruega para o combate ao desmatamento da floresta amazônica.
O Fundo está em processo de extinção pelo descumprimento do governo de Jair Bolsonaro das regras que são requisitos para sua manutenção. Uma alternativa que Marina aponta é a negociação direta entre os governos estaduais e os governos da Alemanha e Noruega para que o financiamento possa ser mantido.
Sobre o diálogo com outros membros de oposição ao governo Bolsonaro, a fundadora da Rede afirmou que nesse primeiro semestre reuniu-se apenas com Ciro Gomes (PDT) e Guilherme Boulos (Psol).
De acordo com ela, o PT tem uma pauta muito personalista que gira em torno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Maria Osmarina da Silva Vaz de Lima tem 61 anos e é formada em história pela Universidade Federal do Acre.
Assumiu o primeiro mandato eletivo em 1989 quando foi eleita vereadora de Rio Branco (AC) pelo PT. De 1991 a 1995 atuou como deputada estadual. Foi eleita e reeleita senadora, com o fim do mandato em 2011.
Quando Lula assume a Presidência da República em 1º de janeiro de 2003, Marina é escolhida para chefiar a pasta do Meio Ambiente, função que ocupou até 2008. No ano seguinte saiu do PT e se filiou ao PV.
Foi candidata à Presidência no ano de 2010 pelo PV, em 2014 pelo PSB e em 2018 pela Rede Sustentabilidade, partido que fundou em 2015.
Leia a entrevista com Marina Silva:
Congresso em Foco: durante a sua gestão como ministra do Meio Ambiente, houve tentativas parecidas com a de Bolsonaro de intervir no Inpe? Não só da presidência, mas de qualquer setor.
Marina Silva: Houve um questionamento pelo [então governador do Mato Grosso] Blairo Maggi, [então governador de Rondônia] Ivo Cassol e Mangabeira Unger [então ministro de Assuntos Estratégicos]. Eles estavam tentando convencer o governo que os dados estavam incorretos e as medidas estavam exageradas. Naquele contexto nós tomamos em 2008 confronto com dados do Inpe e conseguimos provar que quem estava errado eram os dados do governo Blairo Maggi. Percebendo que continuava uma dúvida que poderia levar o governo a um erro imperdoável, nós pedimos para sair. Foi isso que manteve o plano [de desenvolvimento ambiental] até 2012 em pleno vapor. Em 2012 voltou a crescer a tendência de alta, [ os ex-presidentes Dilma Rousseff e Michel Temer] deram uma pá de cal e Bolsonaro está dando agora um tiro de misericórdia no combate ao desmatamento. A diferença é quando você tem um ministro de Meio Ambiente que defende o meio ambiente e um ministro de Ciência e Tecnologia que defende a ciência.
Como avalia o comportamentos dos ministros Marcos Pontes e Ricardo Salles no caso do Inpe?
Acho que o ministro Marcos Pontes teve uma atitude que não é condizente com a sua biografia. Um órgão importante de seu Ministério, possui capacidade técnica e compromisso ético, foi atacado de forma infundada pelo presidente da República e não pediu para que o presidente reconsiderasse isso e se não reconsiderou, tinha que ter publicamente colocado a defesa do Inpe, ainda que perdendo a função de ministro. Teve uma atitude inadequada para um homem da ciência, que sabe que o Inpe faz ciência. Ele se omitiu, chegou a beira da conivência e até mesmo fazendo questionamento estranho ao trabalho dele. O Ricardo Salles ele não é um defensor do meio ambiente, é uma pessoa tão ruim que pela primeira vez no Ministério do Meio Ambiente há um ministro que não defende o meio ambiente. Não é ambientalista e tem orgulho de não sê-lo. Tem desprezo pelo ativismo leal, ético e competente de quem defende. O ministro Salles… não tenho dado de comparação na história do Brasil.
Acha que o fim do Fundo Amazônia pode ser compensado de alguma maneira? Tem conversado com governadores do Norte para buscar alternativas?
Tenho dialogado com muitas pessoas, ainda não governadores, no sentido de que se o governo não reconsiderar manter as ações de desenvolvimento sustentável, fortalecer a fiscalização no combate a práticas irregulares, queimadas, a Amazônia agora pegando fogo, apoiar projeto de sustentabilidade até mesmo do setor produtivo. Se ele não reconsiderar que isso deve ser o eixo do Fundo Amazônia, eu advogo que o recurso deve ser retomado diretamente no mesmo formato. Ou seja, para projetos para aperfeiçoar a governança seja pelo setor produtivo ou comunidade. Que o fundo possa continuar como aconteceu nos Estados Unidos [no governo de Donald Trump], governos locais mantiveram o plano de mudança climática e compromisso construído no governo [do ex-presidente Barack] Obama. Comecei na época que ainda era ministra a conceber o fundo. Se ele não fizer [rever políticas de desmatamento necessárias para receber o fundo], que o fundo mantenha o formato de mesma diversidade, com controle e transparência, como tem hoje.
Os irmãos Weintraub apoiaram a sua campanha presidencial e hoje estão na assessoria da Presidência e no Ministério da Educação. Há uma associação com eles?
É só olhar o meu programa, não tem nenhuma identidade com nenhum programa. Não posso ser responsabilizada agora porque alguém que me apoiou está fazendo coisas equivocadas no âmbito de qualquer que seja a instituição pública.
O que acha do Future-se?
Defendo universidade pública, gratuita e de qualidade. Gestão pública, acho que o estado tem que ter uma educação de qualidade tanto para a educação infantil quanto para o ensino superior. Existe a possibilidade de alguns estudos de parceria hoje. Na verdade o que estão buscando é um caminho para chegar a uma universidade que não seja completamente publica.
A Rede sempre apoiou a Lava Jato, mas tem mudado de postura após as denúncias feitas pelo site Intercept. Defende que o ministro Sergio Moro continue ou saia do governo?
Deve haver uma investigação que exista dentro da própria Justiça. Que não se crie nenhum tipo de confusão no governo. No processo investigatório, não dá para anular todo o trabalho que foi feito por todas as instâncias da Justiça, não só a primeira instância, o próprio Supremo. Não se pode usar um erro para justificar outro erro, anular o trabalho de combate a corrupção que está acontecendo no país. O CNJ [Conselho Nacional de Justiça] existe para poder investigar punir e reparar o que quer que seja de errado, não podemos utilizar isso como mecanismo de impunidade.
Eduardo Bolsonaro pode ser indicado para embaixador e Flávio Bolsonaro participa da escolha do novo comando da Procuradoria Geral da República. Essa influência familiar é negativa?
Em qualquer que seja o governo não se pode fazer do interesse público o espaço do interesse familiar. O princípio da legalidade, impessoalidade, constitucionalidade, tudo aquilo que está na Constituição Federal e está sendo ferido pela intervenção familiar do presidente.
A sra. participou junto com Ciro Gomes de alguns eventos que avaliam o governo Bolsonaro, também há diálogos com outros representantes da oposição como PT, PSB, Psol e PC do B?
Eu tive uma conversa com Ciro Gomes, depois participei de um encontro nos 100 dias do governo Bolsonaro. Tive uma conversa com Guilherme Boulos, agenda de defesa do meio ambiente, direitos humanos e educação. Em relação aos demais partidos, mantive diálogo com o Partido Verde e o PSB é o partido do espectro do diálogo que temos. O PT tem uma dificuldade muito grande, porque não reconhece erros, não faz autocrítica. Temos no Brasil dois extremos, de um lado pessoas que seguem religiosamente seus líderes pelo lado da direita e pelo da esquerda a mesma coisa. Lideranças devem ser algo de suporte de sustentação junto com a sociedade, é ela que pode desautorizar o que o governo está fazendo em relação ao meio ambiente, direitos humanos, ciência, educação, tantas políticas públicas que criarão prejuízos ao longo de décadas para os interesses do Brasil.
Mesmo sendo alvo da campanha presidencial do PT em 2014, no ano passado a sra. declarou apoio ao candidato Fernando Haddad. Foi superado o afastamento do PT? Ciro Gomes acertou ou errou ao se afastar no 2º turno?
Cada um faz as coisas de acordo com sua consciência. Não vou me colocar na consciência política de ninguém. Ele não se colocou na campanha, mas ele votou. Por entender que Bolsonaro traz riscos imediatos, em seis meses estou vendo a governança ambiental virar pó, eu tinha consciência disso, disse isso quando fiz minha manifestação de voto. O Haddad, por todas divergências que tenho com o PT de reconhecer os erros que cometeu à frente do governo, o Haddad pessoalmente não faria o que está acontecendo hoje. Mesmo tendo passado por tudo que passei em 2014 e continuei passando ao longo desses anos, tenho que pensar primeiro no que é mais importante.
Haddad foi condenado por Caixa 2 e Lula está preso há mais de um ano. Avalia que o PT é o alvo mais recorrente da Justiça?
O julgamento deve acontecer com base naquilo que já aconteceu. Prisão em segunda instância para quem quer que seja, seja Aécio, Haddad, Marina, Ciro, quem quer seja a lei é para todos e deve ser cumprida rigorosamente para todos.
Em 2014, a senhora apoiou o candidato Aécio Neves para presidente. Nesta semana o PSDB pode começar a analisar seu processo de expulsão, defende que Aécio saia do partido?
A Justiça já ofereceu todos os elementos para qualquer que seja o partido que esteja envolvido com lideranças como Aécio Neves, Delúbio [Soares, ex-tesoureiro do PT], [ex-ministro da Casa Civil de Dilma Rousseff e da Fazenda de Lula, Antônio] Palocci, como tantos outros, sejam expulsos. É uma decisão que cabe ao partido, eu não posso tomar a decisão pelo partido a qual eu não pertenço, a única que posso dizer é que os elementos probatórios no PT, PSDB, vários partidos são mais que suficientes para que eles tomem decisão de expulsá-los.
Isso pode fortalecer a candidatura presidencial de João Doria?
Eu não tenho a visão de que os fins justificam os meios. Não é porque existe a possibilidade de um pretenso candidato cresça ou apareça que eu vou ser conivente com qualquer tipo de erro. Se a saída de Aécio fortalece outras lideranças, paciência. Quem quer que esteja envolvido em alguma questão grave, foi investigado e comprovado no entendimento do partido, no seu estatuto, seu programa, conselho de ética, essa pessoa deve ser expulsa do partido. Não é porque isso vai fortalecer outra liderança que vou ser contrária, os fins não justificam os meios. Essa lógica que considera que os fins justificam os meios como estratégia não pode considerar a ética como princípio.