Fiquei a recordar-me de um outro acusado, preso em flagrante, que confessou seu crime na delegacia. Todas as testemunhas presentes no local foram ouvidas, e disseram a mesma coisa. O inquérito, uma vez concluído, foi para o sistema judiciário – que, por força de lei, ouviu todos novamente nos dois anos seguintes. Para que, afinal?
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Uma pessoa alugou dado imóvel. Terminado o prazo da locação o inquilino decidiu nele permanecer. Se isto tivesse acontecido nos EUA ou no Reino Unido uma simples ida a alguma delegacia de polícia teria sido suficiente. Mas não aqui: o caso foi parar nas mãos da pesada e sobrecarregada estrutura judiciária – que levou alguns bons anos para resolver o problema.
Alguém tem algo a receber do Estado. Temeroso, o administrador de plantão acaba judicializando a questão – afinal, não quer ser responsabilizado posteriormente. Foi assim que certa vez assinei um alvará de R$ 0,54. É assim que constatou-se ser o Estado o maior litigante do sistema judicial.
Os casos acima são comuns. Acontecem aos milhares, todos os dias. Nos termos da lei devem ser processados e julgados. Integram estatísticas. Acarretam cobranças dos órgãos de controle, pois que, afinal, “todos os processos são iguais”. Acuadas, as instituições partem para o aumento de quadros e de despesas – que pouco ou mesmo nenhum efeito terá.
Enquanto isso acaba prejudicada a análise de processos os mais sérios, com imensos prejuízos para a cidadania e economia de todo um país.
Há muitos anos um advogado italiano, de nome Piero Calamandrei, nos alertava para o fato de que a ciência processual estava a cometer o sério pecado de estudar o processo como algo isolado, ao largo da realidade, distante, em uma expressão, da justiça. Contemplo nossos juizados e tribunais, em tempos de tantas e tão importantes reformas, e fico a pensar neste grande profissional. E no sentido de nossas caminhadas pelo mundo das leis. O que temos sido, afinal? De que temos servido?