A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) realiza em fevereiro projeto piloto de educação financeira com cerca de 600 indígenas do Pará. A informação é do superintendente de Proteção e Orientação aos Investidores (SOI) da CVM, José Alexandre Vasco, em entrevista à Agência Brasil. Ele disse, ainda, que a aproximação feita no ano passado com índios do noroeste paraense foi importante para a CVM ter uma percepção da realidade e das especificidades desse público e da região, pensando no mercado de capitais.
> Que em 2020 não se exclua ninguém
O projeto tem duas dimensões. A primeira se refere à educação financeira e resulta de parceria com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reconheceu a CVM como centro de educação financeira para a América Latina e o Caribe. “A gente tem uma autorização da OCDE para, na região, disseminar melhores práticas, fazer discussão com outros reguladores e buscar inovações”, salientou Vasco.
A OCDE recomenda também que se desenhem programas de educação financeira específicos para grupos em situação de vulnerabilidade. Nesse sentido, a CVM realizou programas pontuais em favelas do Rio de Janeiro e São Paulo. Na Pavuna, no Rio, por exemplo, em área bastante conflagrada, foi efetuado projeto em parceria com o Banco Mundial (BIRD), que levou educação financeira e, também, formação profissional, visando ajudar a transição do jovem da escola para o emprego. “A gente achou que levar educação financeira só seria inútil diante de uma realidade tão impactante e com tantas dificuldades”.
Outros públicos
Uma vez dado esse primeiro passo mais estruturado nas comunidades, a CVM começou a buscar outros públicos. “E o público indígena surgiu porque nós temos parceria, já há alguns anos, com universidades no Pará que fazem programas educacionais, inclusive de licenciatura intercultural indígena. Isso significa formar o indígena, dar a ele uma licenciatura, para que ele possa ser professor do ensino fundamental devidamente regularizado”. Várias aldeias têm escolas e, em grande parte, os professores são da própria aldeia, combinando aí o saber tradicional com o formal, explicou o superintendente. Essa estrutura já se encontra estabelecida na região, com longa trajetória.
José Alexandre Vasco lembrou que a CVM já tinha parceria na área da educação financeira com a Universidade Federal do Pará (UFPA). Durante evento da Semana Mundial da Educação da Organização Internacional de Valores Mobiliários (Iosco), as duas entidades discutiram a ampliação da iniciativa.
Lado social
A segunda dimensão abrange o lado social do impacto da educação financeira. A CVM montou um Laboratório de Inovação Financeira (LAB) do qual participam 160 entidades e 460 pessoas, divididas em quatro grupos de trabalho, que buscam soluções para o país e como o mercado de capitais pode financiar o alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). “Saneamento, água tratada, energia, tudo isso demanda investimento. Então, é importante que o mercado de capitais esteja bem preparado e antenado para que possa desempenhar esse papel de canalizador desses investimentos. A gente está falando de uma agenda verde e sustentável que se traduz, na verdade, para a gente, em investimento para o país”.
Um grupo do LAB voltado a finanças sociais tem como foco estudar soluções para financiar negócios que têm impacto social positivo, em geral, de menor valor. No momento, há uma discussão sobre como facilitar o uso do mercado de capitais para esse financiamento, por meio de uma combinação de diferentes fontes de recursos, ou seja, como se pode desenhar um modelo que facilite o investimento privado em um negócio de impacto social.
Amazônia
Nesse grupo de trabalho, a CVM vinha buscando um olhar para a Amazônia e as duas agendas se uniram. José Alexandre Vasco acredita que a missão no Pará foi importante para aprofundar o projeto que será iniciado em fevereiro deste ano nas quatro aldeias participantes, abordando empreendedorismo e educação financeira. Como participam do grupo várias entidades, elas optaram por abordar algumas vocações naturais do público indígena, com destaque para o artesanato, trabalhando tanto o lado educacional, como o empreendedorismo.
Segundo o superintendente da CVM, a ideia é que, pelo lado do empreendedorismo, isso seja trabalhado até agosto, incluindo estudar a possibilidade de ‘funding’ (captação de recursos financeiros) via mercado de capitais para uma aldeia, por exemplo. Em outubro, deverá ser organizado um seminário em Belém para apresentação e divulgação dos resultados do piloto, com a proposta dos próximos passos. “O que poderia ser corrigido e o que pode ser ampliado”.
Vasco informou que a dimensão educacional demandará um pouco mais de tempo, porque envolverá o desenvolvimento de materiais para utilização nas escolas indígenas. O material já disponível exigirá adaptação. A ideia é que ele seja desenvolvido até o fim do ano, para que, a partir de 2021, as escolas indígenas já possam começar as aulas com material de educação financeira adaptada à realidade indígena.
> 2019 terminou com inflação de 4,31% e famílias mais endividadas