Jair Bolsonaro revogou nesta quarta-feira (28) o Decreto 10.530, que abria caminho para a privatizações das unidades básicas de saúde (UBS) do SUS. Em um post nas redes sociais, o presidente disse que o país tem mais de quatro mil unidades básicas e 168 Unidades de Pronto Atendimento (UPA) inacabadas e que faltam recursos financeiros para conclusão das obras, aquisição de equipamentos e contratação de pessoal.
A revogação foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) no início da noite de hoje (veja a íntegra).
“O espírito do Decreto 10.530, já revogado, visava o término dessas obras, bem como permitir aos usuários buscar a rede privada com despesas pagas pela União”, disse Bolsonaro. Em entrevista nesta tarde para a CNN Brasil, o presidente disse que a repercussão inicial do decreto não foi boa, e que a intenção do texto não seria privatizar o sistema público de saúde, mas sim estudar as condições de migração de pacientes para hospitais privados.
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Críticas
Desde a publicação do decreto na terça-feira (27), o governo vem sofrendo pressão. Parlamentares, membros da área da saúde e da sociedade civil se uniram contrários à proposta de Jair Bolsonaro e do ministro da Economia, Paulo Guedes. A edição do ato normativo, que não contou com a assinatura do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, fez com que a tag #defendaosus fosse um dos termos mais comentados no Twitter na quarta-feira (28).
Ao menos três partidos entraram com Projeto de Decreto Legislativo para sustar o ato normativo. Parlamentares e celebridades também reagiram ao ato.
A sanitarista Lucia Souto, que integra a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e preside o Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes), aponta que a medida, caso não fosse revista por Bolsonaro, seria extremamente prejudicial à sociedade brasileira. “É uma afronta de um governo de destruição. E este é o projeto deles”, disse a médica.
Lúcia ressalta que a proposta de desestatizar a saúde pública vem no momento de recuperação da pandemia, onde a campanha nacional de vacinação é um ponto chave. “Há que se ter um sistema robusto”. “Para enfrentar a desigualdade, uma das políticas públicas mais eficazes é a do direito universal à saúde, porque ela vai na veia da desigualdade. Na crise sanitária-econômica-social que vivemos, o SUS é estratégico para o desenvolvimento de bem-estar da população brasileira, que proteja vidas e permita que a população seja atendida com dignidade. O SUS é indispensável”.
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Inconstitucional
O advogado constitucionalista Adib Abdouni aponta que o texto do decreto é extremamente genérico, uma vez que “qualificação da política de fomento ao setor de atenção primária à saúde” poderia se equiparar também a outras propostas dentro de parcerias público-privadas já existente, como as Organizações Sociais de Saúde (OSS).
O texto do Decreto, reflete Adib Abdouni, busca criar um cenário favorável à privatização de unidades básicas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, sob a afirmativa de se imprimir ao sistema de saúde, modernização e melhora da operação.
O direito à saúde está inscrito em diversos pontos da Constituição Federal, e é considerado por ampla parte da sociedade como um dos grandes avanços trazidos pelo texto de 1988. O artigo 6º afirma que a saúde é um direito de todos, assim como são a educação, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados.
E, a partir do artigo 196, uma seção é dedicada exclusivamente ao tema. O trecho inicia com a frase “a saúde é direito de todos e dever do Estado”. Adib Abdouni argumenta que o decreto 10.530 é inconstitucional. “A proposta se expõe à vício de inconstitucionalidade intransponível, pois as unidades básicas de saúde exigem estruturação, manutenção e execução que, por expressa previsão constitucional, competem ao poder público”, diz.
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