O ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Pedro Rodrigues Curi Hallal, que teve de assinar um termo de ajustamento de conduta (TAC) esta semana por criticar a gestão de Jair Bolsonaro durante uma live transmitida pelas redes sociais da Universidade em janeiro, já havia sido alvo de ataques do presidente e de seus aliados anteriormente.
O epidemiologista responsável por uma das pesquisas mais relevantes sobre covid-19 no país, a Epicovid, foi impedido de falar durante uma entrevista à rádio Guaíba no início do ano.
Na ocasião, o apresentador do programa questiona o professor sobre como pegou covid-19 e na sequência corta a fala do docente. O deputado bolsonarista Bibo Nunes (PSL-RS), responsável pelo processo junto à Controladoria-Geral da União (CGU) que culminou no TAC, diz que “se ele não conseguiu salvar ele, vai conseguir salvar quem?”
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Jair Bolsonaro utilizou suas redes sociais no dia 14 de janeiro para expor um vídeo editado da entrevista. “Reitor da Universidade de Pelotas. Simplesmente assista”, disse o presidente.
– Reitor da Universidade de Pelotas.
– Simplesmente ASSISTA:
– Bom dia a todos. pic.twitter.com/0KdJyGTozu— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) January 14, 2021
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“[Foi] um ataque orquestrado à minha pessoa por um deputado e pelos jornalistas. O deputado falou antes, durante e depois da minha participação. Fui interrompido em minha fala inúmeras vezes. Um exemplo de como não fazer jornalismo isento”, disse o professor ao Congresso em Foco.
O site tentou contato com o deputado Bibo Nunes, mas não teve retorno.
Naquela altura, Manaus sofria com a maior crise desde o início da pandemia, onde mesmo com falta de oxigênio, o Ministério da Saúde se limitou a investir na distribuição do chamado “kit-covid”, com medicamentos sem comprovação científica contra a doença. A pasta também aproveitou o momento para o lançamento do Tratecov, aplicativo que sugeria a profissionais da saúde a indicação de medicamentos como cloroquina e azitromicina, ambos sem indicação para o novo coronavírus. Após críticas da imprensa e de especialistas, o governo tirou o aplicativo do ar alegando que o sistema havia sido “invadido e ativado indevidamente”.
Pedro Hallal diz ainda que a Epicovid, pesquisa que tinha como objetivo estimar quantos brasileiros já foram infectados pelo novo coronavírus, auxiliando no planejamento do combate à doença, sofreu com o corte do governo federal no financiamento da pesquisa, além da censura de dados sobre os indígenas. A pesquisa mostrava que povos originários brasileiros apresentam risco maior de infecção por covid-19.
Matéria da Folha de S. Paulo de maio do ano passado mostra que as equipes que coletavam testes para o estudo foram detidas e agredidas.”Em vários municípios, o material de testes foi destruído e as equipes do estudo tiveram de abandonar a cidade e desistir da pesquisa”, diz a reportagem de Vinicius Torres Freire.
O contrato entre o Ministério da Saúde e a Universidade previa três fases, entregues para a pasta em julho do ano passado. Alguns dos dados levantados pelos cientistas indicavam, por exemplo, que havia subnotificação de casos. Pessoas mais pobres tinham mais infecções que os mais ricos e que a pandemia variava de acordo com a região do país.
A pesquisa entrevistou quase 90 mil pessoas em 133 municípios, mas o Ministério não demonstrou interesse em avançar com o estudo. Na época, a pasta afirmou que daria continuidade “a estudos de inquérito epidemiológico de prevalência de soropositividade na população”.
Sem recursos do governo federal, a UFPel buscou auxílio junto à iniciativa privada e com outras instituições de fomento. “Conseguimos financiamento com o Todos Pela Saúde e com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). O Epicovid nunca parou, só mudou a fonte de financiamento”, diz o professor. Ao todo já foram realizadas cinco fases da pesquisa.
Essas não foram as únicas dificuldades enfrentadas pela equipe de Pedro Hallal. Segundo o professor, ele chegou a receber ameaças que estão sendo investigadas pela Polícia Federal. Ele não pode comentar sobre o caso, pois tramita em sigilo.