Vivemos tempos nebulosos. No mundo inteiro, foi gestada uma cultura autoritária e preconceituosa, que ganhou expressão radical no UFC das redes sociais. A extrema direita americana e europeia destilam, à luz do dia e abertamente, suas concepções antidemocráticas e excludentes. São vítimas de preconceitos imigrantes, negros, mulheres, índios.
Aqui também em terras brasileiras, assistimos, nas últimas semanas, inacreditáveis manifestações de preconceito e intolerância, que devem receber nosso total repúdio.
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É natural que a sociedade civil, os movimentos pelos direitos humanos e civis, as forças democráticas reagissem. Surgiu o que se acostumou chamar de “politicamente correto”. E aí, é preciso tomar muito cuidado para que a criança não seja jogada fora junto com a água suja do banho. Muitas vezes, o contraponto gera uma rigidez autoritária, que ao invés de atacar o problema de fundo, reforça preconceitos.
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A saída para o enfrentamento de preconceitos e exclusões sociais não deve ser nenhum tipo de dirigismo estatal, legal ou cultural. A liberdade é sempre o melhor caminho. Apostar na elevação dos padrões educacional e cultural da sociedade, na vivência democrática, no diálogo e no pluralismo é o que deve nos inspirar. Bom senso, respeito, bom humor, tolerância devem ser os valores orientadores de uma cultura democrática.
O Carnaval é talvez a maior expressão cultural brasileira. Reverencia a alegria atávica e a irreverência de nosso povo. Materializa essa coisa um tanto macunaímica e antropofágica da civilização brasileira.
Essa geleia geral, que no caldeirão da experiência histórica do país, metabolizou e sintetizou elementos culturais dos europeus, dos índios e dos negros. Isto é o que dá o caráter original e singular de nossa construção como povo e Nação. É verdade que ainda temos impregnados em nossa sociedade preconceitos que precisam ser combatidos. Mas a calibragem disso deve ser precisa, para que um autoritarismo não seja substituído por outro. Nada de dirigismo, democracia sempre, a liberdade no comando.
O Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Belo Horizonte publicou uma cartilha de orientação sobre o carnaval na linha do “politicamente correto”. Sugere que não sejam usadas fantasias de índios, de mulheres por homens, de ciganos, de enfermeiras sexys, que poderiam expressar preconceitos. E que as marchinhas de carnaval tomem cuidado para não exceder as fronteiras do “politicamente correto”. É evidente que o Conselho não emitiu, e nem teria poderes para isso, uma norma legal. Propôs uma reflexão.
Mas creio que o combate aos preconceitos não passa por sufocar a imaginação, a criatividade, a irreverência de nossos foliões. Há muito tempo, nas ruas e avenidas, o carnaval exerce uma bem humorada crítica social a fatos e contradições que vivemos em nosso cotidiano.
Vamos “criminalizar” Haroldo Lobo, João Roberto Kelly, Braguinha ou Lamartine Babo? Vamos condenar manifestações como a Banda Mole de BH ou as Domésticas de Luxo da minha Juiz de Fora, que há décadas são sinônimos de alegria e confraternização?
A luta cultural e democrática é muito mais complexa. E uma sociedade nova, longe de preconceitos e intolerâncias, não nascerá certamente do mau humor ou de qualquer matriz única e dogmática de valores.
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