Edson Sardinha
O interesse crescente dos parlamentares por mandar dinheiro do orçamento para a realização de eventos resultou no ano passado numa série de investigações e na imposição de algumas restrições por parte do Ministério do Turismo.
Uma dessas limitações, no entanto, tem sido ignorada em alguns casos pelo ministério. A norma diz que nenhum evento gerador de fluxo turístico, como são as festas juninas, pode receber mais de R$ 600 mil originários de emendas parlamentares individuais. Diz mais: o valor que cada congressista pode destinar, por meio de emendas, para um mesmo evento dessa natureza não pode ultrapassar os R$ 300 mil. Mas o governo federal abriu exceção para dois municípios: Campina Grande (PB), como já mostrou o Congresso em Foco, e Maracanaú (CE).
A festa junina de Campina Grande é a maior do país. A de Maracanaú é considerada a terceira. Para o segundo maior São João do país, o de Caruaru, em Pernambuco, não houve a exceção. ?O São João de Maracanaú é considerado o terceiro do país e tem 20 dias de festa. Faz parte da tradição. O Ministério do Turismo faz uma verificação para saber se justificava essa excepcionalidade?, explica Gorete Pereira (PR-CE), que destinou R$ 1,2 milhão do orçamento federal para o arraial da cidade. ?Lá, 30% do dinheiro é público, os outros 70% são da iniciativa privada?, acrescenta.
Autodeclarado ?o maior São João do mundo?, o de Campina Grande se encerrou no último domingo (3), após um mês de festas. A pedido do atual presidente da Comissão de Orçamento, senador Vital do Rêgo Filho (PMDB-PB), irmão do prefeito Veneziano Vital do Rego (PMDB) e correligionário do ministro, os festejos da segunda cidade da Paraíba receberão R$ 1,8 milhão.
Desse total, R$ 1 milhão foi direcionado por Vital ? mais de três vezes o limite previsto. Outros R$ 600 mil partiram de ofícios enviados por Wellington Roberto, Manoel Júnior e pelo senador Cícero Lucena (PSDB-PB). A Portaria 88, publicada no final do ano passado, restringe a dois o número de parlamentares que podem se associar com emendas para um mesmo evento. Os R$ 200 mil saíram da própria dotação orçamentária do ministério.
Na caneta
O Ministério do Turismo argumenta que sua decisão está baseada no artigo 41 da portaria, que delega ao secretário-executivo e ao secretário nacional de Políticas da pasta competência para ?decidir acerca das excepcionalidades que venham a surgir?. O mesmo discurso é adotado por Vital do Rêgo.
O problema é que a norma condiciona o recurso dessas ?excepcionalidades? à apresentação de ?prévia análise? e ?parecer técnico da área responsável?, o que não ocorreu. Pelo menos no caso da cidade paraibana. Pelo contrário, há seis pareceres técnicos preliminares do ministério advertindo que o valor da proposta apresentada pela prefeitura de Campina Grande, que firma o convênio com o governo federal, está acima dos limites imposto pela nova norma. ?ATENÇÃO!!! Valor autorizado está diferente do valor da proposta, por favor, adequar?, alertou, em várias oportunidades, a funcionária do ministério responsável pelo contato com a prefeitura.
Apesar dos alertas, o parecer jurídico final do Ministério do Turismo chegou a analisar o processo como um todo, mas não fez qualquer referência à ultrapassagem dos limites, e aprovou o convênio.
Advertência
Em entrevista ao Congresso em Foco no final do ano passado, o ministro Jorge Hage, da Controladoria Geral da União (CGU), afirmou que as emendas parlamentares individuais estavam no centro do problema da malversação do dinheiro público no país. À frente da apuração de denúncias sobre mau uso de recursos do orçamento com festas e eventos, Jorge Hage defendeu a extinção das emendas.
?Primeiro, tais emendas pulverizam o dinheiro público em pequenas obras de interesse público menor. Em segundo, fazem com que o parlamentar federal exerça um papel de vereador, quando ele deveria estar preocupado com os grandes debates nacionais. E, finalmente, porque tem sido esse o principal caminho para os desvios de dinheiro público que verificamos?, disse o ministro.
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