Rafael Neves
Especial para o Congresso em Foco
Criticado pelo futuro ministro da Justiça Sérgio Moro, que não quer vê-lo votado na Câmara este ano, o Projeto de Lei 9054/17 pode abrir uma janela para perdoar crimes contra a administração pública. O texto propõe uma ampla reforma na Lei de Execução Penal e em outras que tratam da aplicação de penas no Brasil.
O alerta é do jurista Luiz Flávio Gomes (PSB-SP), eleito deputado federal em outubro. Segundo Luiz Flávio, a reforma permite que condenados por crimes como a corrupção tenham benefícios como a suspensão condicional do processo, em que o acusado aceita exigências menores para evitar a abertura de uma ação.
Pensado para reduzir a superlotação nos presídios, o projeto foi elaborado em 2013, durante 8 meses, por uma comissão de 16 juristas a pedido do Senado. Aprovado pela Casa em outubro de 2017, sob a relatoria de Renan Calheiros (MDB-AL), o texto espera a análise da Câmara.
“A ideia de desencarceramento para crimes não violentos é, em princípio, boa, mas na prática pode criar um problema”, afirma Luiz Flávio.
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O projeto é defendido pelos autores. “Nunca houve por parte da comissão interesse em beneficiar pessoas condenadas por corrupção, que representam de 1% a 2% da população carcerária brasileira”, afirma a jurista Maria Tereza Uille Gomes, relatora do projeto na equipe e hoje conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
PublicidadeA “janela”
Segundo o deputado eleito, a brecha na reforma está em mudanças na Lei 9099/95 (Lei dos Juizados Especiais Cíveis). As alterações fortalecem duas ferramentas (suspensão condicional do processo e transação penal) feitas para que crimes sem uso de violência não cheguem aos tribunais e, com isso, se desafogue o Judiciário.
A suspensão condicional (na qual o acusado assume condições como não frequentar certos lugares ou se apresentar periodicamente ao juiz) é reservada, hoje, a crimes com pena mínima de um ano. Com a reforma, o “piso” sobe para três anos, o que passa a abranger corrupção ativa e passiva, peculato e concussão, por exemplo.
Já a transação penal (quando o acusado paga multa ou cumpre penas alternativas, como serviços comunitários, para não responder ao processo), pode ser usada, atualmente, para crimes com pena máxima de até dois anos de prisão (a suspensão se baliza na pena mínima, e a transação, na máxima). Com a reforma, o limite sobe para cinco anos, o que torna infrações como fraude a licitação, caixa 2 eleitoral e tráfico de influência aptas ao benefício.
Moro defendeu que, “considerando os escândalos criminais dos últimos anos, seria importante pelo menos fazer ressalvas com relação à aplicação disso para a corrupção”.
A jurista Maria Tereza, que ajudou a formular a reforma, rebate o argumento da “brecha” afirmando que nenhum juiz será obrigado a conceder as penas alternativas, que serão apenas uma possibilidade. “A comissão [de juristas] sempre teve a cautela de garantir a competência exclusiva do Poder Judiciário para decidir quem teria ou não direito [aos benefícios]”, afirma.
A disputa
Segundo o jornal Folha de S. Paulo noticiou no mês passado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi pressionado por parlamentares a colocar o tema em pauta ainda nesta legislatura. Moro disse ter pedido a Maia que deixe o assunto para que o Congresso de 2019 e o governo Jair Bolsonaro (PSL) revisem o texto.
“Eu não penso que resolve-se o problema da criminalidade simplesmente soltando os criminosos. Aí a sociedade acaba ficando refém dessa atividade criminal e me parece que a mensagem dada pela população brasileira nas eleições não foi exatamente essa”, disse o ex-juiz da Lava Jato.
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