Filiada ao PSL para, segundo ela, apoiar o presidente Jair Bolsonaro, a deputada Alê Silva (MG) anunciou nesta quarta-feira (9) sua desfiliação do partido. Primeira baixa da bancada na Câmara desde que a crise interna fugiu de controle, Alê saiu atirando. A deputada acusa o presidente do partido, Luciano Bivar (PE), de determinar sua exclusão da Comissão de Finanças e Tributação (CFT) após ela pedir o adiamento da votação de um projeto de lei que beneficia as seguradoras do ramo imobiliário, setor em que o deputado pernambucano atua.
“A partir de hoje não me considero do partido. Sou a primeira baixa efetiva”, disse a deputada, que deve migrar para o Podemos, ao Congresso em Foco.
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Alê conta que participava da reunião da CFT desta quarta quando foi abordada pelo deputado Felipe Francischini (PSL-PR) que a questionou por ter feito o pedido que adiou a votação de um projeto que alivia o caixa das seguradoras. A deputada mostrou ao colega uma minuta do Ministério da Economia que recomendava a rejeição da proposta por onerar os cofres públicos em mais de R$ 25 bilhões em favor das empresas do setor. “O Francischini demonstrou irritação e me disse que o projeto era de interesse do Bivar”, afirma.
Após a conversa com Francischini, ainda durante a reunião, Alê foi informada por um assessor da Comissão de Finanças e Tributação que acabara de ser excluída do colegiado por decisão do próprio partido. Em discurso emocionado, ela disparou contra o PSL e anunciou seu desligamento da legenda.
“Até o início da sessão meu nome estava ali no painel. Acabei de receber a comunicação de que fui excluída da CFT pelo meu partido. Aliás, meu partido até esse dado momento. Esse partido não é do governo, esse partido não é do Bolsonaro, esse partido só quer dinheiro e que se dane o povo brasileiro. Só quer dinheiro”, protestou.
Veja o vídeo com o discurso da deputada, publicado na página dela no Facebook:
Nanico
“Partido pequeno, nanico, que só chegou aonde chegou por causa de Bolsonaro. Não fosse Bolsonaro, esse partido não teria passado nem na cláusula de barreira”, emendou, citando a lei que restringe o acesso a recursos públicos de partidos que não atingem determinada votação. Ao fazer novamente uso da palavra, a deputada ressalvou que não pretendia fazer uma crítica generalizada, porque há “muita gente boa” no PSL. “Espero que sobrevivam. Estou lutando para sobreviver.”
Procurados pelo Congresso em Foco, Bivar e Francischini não se manifestaram sobre as acusações feitas pela deputada. O espaço está aberto para registrar a manifestação dos dois deputados tão logo ele respondam positivamente às nossas tentativas de contato.
A situação constrangeu parlamentares de outros partidos, inclusive da oposição como o PT, o PDT e o PSB, que destacaram qualidades da parlamentar e condenaram a decisão do PSL. Integrantes da CFT ressaltaram que ela era a titular que mais defendia o governo na comissão.
“Receba nossa solidariedade, mas o nosso lamento porque é uma brutal insensibilidade. [Fazer isso] No meio de uma sessão, dá a ideia do quanto varzeana é uma decisão como essa”, criticou Giovani Feltes (MDB-RS). “Pensamos diferente, mas nosso respeito é muito grande”, acrescentou Ênio Verri (PT-PR). Sem clima para a votação, o relator, Sérgio Souza (MDB-PR), pediu a retirada do texto da pauta.
Seguradoras
A acusação de Alê está relacionada ao vínculo entre a atividade empresarial de Bivar e o projeto em votação (veja a íntegra). O deputado é dono do grupo Excelsior, especializado em seguros para o ramo da construção civil e o único do setor com matriz ativa no Nordeste.
A proposta contestada por Alê Silva prevê a utilização do chamado Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS) para ressarcir agentes privados pela realização de despesas próprias do fundo público. Técnicos do Ministério da Economia argumentam que a mudança na lei aumenta a despesa pública, sem prever estimativa de impacto fiscal, e transfere prejuízos das seguradoras para a União.
“Não aceito corrupção. Depositei todas as minhas esperanças no partido e ele desmoronou”, disse a deputada ao Congresso em Foco.
Laranjas
Esse não é o único problema de Alê Silva com o partido. Ela é uma das autoras das acusações que resultaram na denúncia e no indiciamento do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL), pelo uso de candidatas laranjas em Minas Gerais. A deputada ainda acusa o ministro, que é de seu estado, de ameaçá-la de morte.
No início do ano, Alê reuniu indícios de que quatro candidatas do PSL de Minas Gerais na eleição passada foram usadas como laranjas. Com candidaturas fictícias, sem fazer campanha, elas receberam dinheiro público e pagaram despesas de outros candidatos, inclusive de Marcelo Álvaro Antônio, conforme apontam as investigações. De acordo com a denúncia do Ministério Público Eleitoral, mais de R$ 260 mil foram desviados pelo esquema. Além do ministro, outras dez pessoas foram denunciadas.
Além da deputada mineira, outros parlamentares negociam sua saída para outros partidos. Diferentemente dela, que pode alegar que é perseguida pela cúpula partidária, os outros terão de encontrar uma justificativa para deixar a sigla. Pela legislação, o mandato pertence à legenda, e não ao deputado.
Para sair sem perder a vaga, é preciso comprovar que houve perseguição e mudança no programa partidário ou que se pretende ir para um partido recém-criado ou que tenha passado por processo de fusão ou incorporação. Desde o início da legislatura, o PSL perdeu uma cadeira na Câmara: o deputado Alexandre Frota (SP) foi expulso após fazer críticas a Bolsonaro e se filiou ao PSDB.
A crise evoluiu nessa terça depois que o presidente disse a um apoiador que Bivar estava “queimado pra caramba” e que ele devia “esquecer” o PSL. Hoje o presidente recebeu uma comitiva de 20 dos 53 deputados da sigla que declararam apoio a ele. Bolsonaro disse que não sairá por vontade própria do PSL. Bivar reagiu, dizendo que o presidente “já está afastado” do partido e que pode levar tudo da legenda, menos a honra.
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